Correio braziliense, n. 19.194, 14/12/2015. Política, p. 4

As estratégias de cada lado do impeachment

CRISE NA BASE » O PMDB do vice-presidente, Michel Temer, é uma das grandes incógnitas sobre o futuro do processo contra Dilma
Por: PAULO DE TARSO LYRA E MARCELLA FERNANDES

PAULO DE TARSO LYRA

MARCELLA FERNANDES

 

Com a abertura oficial do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, chegou a hora de os exércitos montarem as estratégias para a guerra política dos próximos meses. Duas grandes incógnitas pairam nesse processo. Qual é o tamanho do PMDB que está de cada lado e como será o humor do empresariado? Há cerca de três meses, representantes do setor deram entrevistas defendendo a permanência da presidente em nome da normalidade institucional. “A presidente Dilma perdeu a oportunidade dada a ela e o apoio dos principais setores econômicos começou a diminuir”, lembra o professor e cientista político do Insper, Carlos Melo.

Mas isso não significa um apoio incondicional ao impeachment a partir de agora. “Se há quem ache que a presidente não tem mais condições de conduzir um diálogo para tirar o país da atual paralisia, também existem aqueles que temem o depois, por não saber o que acontecerá ao Brasil”, ponderou Melo. Todos os cenários, inclusive, são nebulosos. Se Dilma conseguir sobreviver, dificilmente conseguirá um placar próximo dos 300 votos favoráveis. “Escapa do impeachment, é verdade, mas a votação próxima dos 171 votos mínimos necessários a impede de aprovar matérias com quorum qualificado”.

Caso a presidente caia e o vice-presidente Michel Temer assuma o Planalto, poderá até ter um período de trégua com a mídia. Mas a crise econômica vai continuar. “Temer também enfrentará uma oposição feroz, formada pelo PT e pelos movimentos sociais. A vida dele não será fácil”, completou Melo. “Por tudo isso, o setor produtivo ainda não se posicionou com convicção quanto a esse debate”, acrescentou o cientista político do Insper.

O PMDB é outro fator que poderá desequilibrar a disputa. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), já se posicionou claramente a favor do afastamento da presidente. Na semana que passou, ganhou o auxílio luxuoso do vice-presidente Michel Temer, que, se por um lado afirmou a Dilma que não fará gestos para desestabilizá-la, nem ao governo, por outro não interferirá nos rumos que o partido tomará daqui para frente. O PMDB do Senado, por exemplo, é mais próximo do Planalto. “Não somos a favor do governo, somos a favor do país. Por isso, queremos aprovar matérias que sejam importantes para nos tirar desta crise econômica”, afirmou o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE).

Na avaliação do mestre em ciência política Lucas de Aragão, PMDB, PP, PR e PSD são as legendas mais suscetíveis a abandonar o PT. “São partidos que formam a base aliada meio cinzenta porque não têm ideologia definida. Se virem que um governo do PMDB pode dar certo, com certeza vão mudar de lado”, afirmou o também sócio-diretor da consultoria Arko Advice.

 

Manifestações

Existe também a imponderabilidade quanto ao peso das manifestações de rua no processo de impeachment. O cenário é muito distinto em relação aos caras-pintadas de 1992. “Aquelas manifestações de rua uniram o país. As de agora, não, vão dividir”, declarou Melo.

O Movimento Brasil Livre (MBL) aguarda essa avaliação para definir a data da próxima mobilização ou se retoma o acampamento em frente ao Congresso Nacional. Já os movimentos ligados ao Planalto se reuniram com o ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, na última quinta-feira, para cobrar reivindicações da área social. A presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Carina Vitral, nega que atender a essas demandas seja uma condicionante de apoio. “São pautas cotidianas, não condições de apoio à presidente Dilma na luta contra o golpe”, disse.

 

Exércitos

Quem são os aliados e os adversários da presidente Dilma Rousseff no esforço para se livrar da ameaça do afastamento

 

Aliados de Dilma

Jaques Wagner – chefe da Casa Civil

» É o responsável pela estratégia de contato com os governadores e empresários em busca de apoio à presidente.

 

Ciro Gomes

» Ex-ministro da Integração Nacional durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, assumiu o papel de articular uma “frente contra o golpe”. Participou, inclusive, da reunião com os governadores do Nordeste no início da semana passada.

 

Wagner Freitas – presidente da CUT

» Durante solenidade no Palácio do Planalto, o presidente da CUT afirmou que, se necessário, os aliados “poderiam pegar em armas” para defender a democracia.

 

Renan Calheiros – Presidente do Senado

» Passou a ser um dos fiadores do apoio do PMDB à presidente Dilma Rousseff. Também passou a ter um papel preponderante em relação às dúvidas quanto à tramitação do impeachment no Senado.

 

Adversários de Dilma

Aécio Neves – presidente nacional do PSDB

» Embora tenha, ao longo do processo, se aproximado e se afastado da tese do impeachment, Aécio acaba por encarnar o discurso de oposição, já que foi o candidato do PSDB nas eleições de 2014, derrotado por pouco mais de 3 milhões de votos.

 

Eduardo Cunha – presidente da Câmara

» Depois de 10 meses infernizando o Planalto, acolheu o pedido de abertura do impeachment contra Dilma e tem trabalhado para que seus aliados aprovem o afastamento da petista.

 

Michel Temer – vice-presidente

» Encaminhou a Dilma uma carta queixando-se de ser desprezado politicamente pela titular do Planalto. Se o impeachment for aprovado pelo Congresso, assumirá o comando do país.

 

Kim Kataguiri – Movimento Brasil Livre

» Um dos fundadores do Movimento Brasil Livre, é responsável, ao lado de outros movimentos sociais, por organizar as manifestações de rua favoráveis ao impeachment da presidente Dilma Rousseff.

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STF decide esta semana sobre o rito do processo

Na semana que começa, a última de trabalhos do Congresso Nacional antes do recesso parlamentar, as atenções de deputados e senadores estarão voltadas para a sessão do Supremo Tribunal Federal, marcada para quarta-feira. Nesse dia, o ministro Edson Fachin deverá apresentar ao plenário do STF o rito para definir o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Há uma incógnita sobre se a decisão sairá no mesmo dia, ou se algum pedido de vista adiará o desfecho para depois do carnaval, quando o Judiciário iniciará os trabalhos de 2016. “Essa definição influenciará também no tamanho do nosso recesso”, admitiu o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB).

O ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, propôs aos líderes da base aliada que os trabalhos parlamentares sejam interrompidos durante a comemoração das festas, mas que sejam reiniciados em 11 de janeiro. A oposição, mais precisamente o PSDB, avisou ao Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), que concorda com a antecipação do término do recesso, com o retorno dos trabalhos no Congresso na segunda quinzena de janeiro.

A própria agenda parlamentar depende da posição do STF. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) — que também pode ter seu destino definido pelo Conselho de Ética da Câmara amanhã — avisou que ele e o grupo político que lidera vão obstruir todas as votações na Casa, enquanto não houver uma definição sobre a validade ou não da comissão especial aprovada pelos deputados para analisar o pedido de impeachment de Dilma. O governo tem pressa e quer votar matérias importantes para o país e para o mercado financeiro antes do Natal.

Algumas dessas matérias estão na pauta da sessão do Congresso Nacional agendada para amanhã; a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o Orçamento-Geral da União para 2016 e o Plano Plurianual 2016-2020. Mergulhado em uma crise política e econômica, o governo quer dar sinais de força para evitar o rebaixamento da nota do Brasil pela Moody´s. (PTL)

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