Correio braziliense, n. 19.194, 14/12/2015. Economia, p. 6

Disparada da dívida do governo assusta

CONJUNTURA » Com a gastança da gestão de Dilma Rousseff, o passivo do setor público não para de aumentar, mesmo com cortes de 40% nos investimentos. Total de obrigações financeiras deve atingir 80% do PIB em 2016

Por: Rosana Hessel

 

 

» ROSANA HESSEL

 

Desde o início do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, a dívida pública não para de crescer. A soma do que o governo deve internamente e no exterior chegou a R$ 3,8 trilhões, em outubro, e vem avançando a uma velocidade que preocupa os especialistas, colocando o país em risco de perder de vez o grau de investimento pelas agências de classificação de risco.

A dívida pública aumenta, principalmente, porque o governo não faz o básico de qualquer economia doméstica: não gastar mais do que arrecada. E, ao deixar de controlar as despesas, o Tesouro Nacional emite títulos para cobrir os rombos a juros exorbitantes, o que amplia ainda mais o saldo devedor. É como entrar no cheque especial. Esse círculo vicioso vem fazendo com que analistas elevem as projeções para a relação da dívida pública sobre o Produto Interno Bruto (PIB), um dos principais indicadores das agências de classificação de risco, na avaliação das notas dos governos.

A dívida bruta brasileira, por exemplo, era 51,8% do PIB em 2010, chegará a 67,5%, neste ano, e a 88% do PIB, em 2019, pelas contas do Santander, que estão entre as mais conservadoras. A economista Monica De Bolle, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics, em Washington, em um estudo recente, estima que, se esse descontrole fiscal continuar deteriorando as contas públicas, a taxa chegará facilmente a 80% no ano que vem, podendo ultrapassar 110% do PIB, em 2020.
Monica lembra que, apesar de toda a retórica do governo em afirmar que vem tentado segurar os gastos — com contingenciamentos de despesas discricionárias (não obrigatórias), mas que limaram  pouco mais de 40% nos investimentos —, os números dizem o contrário. “Quando a gente olha as contas públicas, os gastos do governo continuam crescendo. Isso contribui para uma dinâmica ruim da dívida, que está em fase de deterioração. O ano passado não foi bom, e, em 2015, incluindo as pedaladas, a conta de juros vai explodir”, avisa.

Obrigado a contabilizar as pedaladas fiscais de R$ 57 bilhões, neste ano, o governo conseguiu alterar a meta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o setor público, que passou de um superavit primário de R$ 66,3 bilhões para um rombo de até R$ 119,9 bilhões. Em 2014, o deficitfoi de R$ 32,5 bilhões.

O economista-chefe do Santander, Maurício Molan, identifica a ausência de superavit primário como principal fator para o aumento da dívida. A sobra de recursos para pagar juros, estancando a elevação da dívida, é uma das pernas do tripé macroeconômico, abandonado pela “nova matriz” de Dilma. Os outros dois pilares, câmbio flutuante e meta de inflação, também foram neglicenciados nos últimos anos, segundo os analistas.

Pelos cálculos de Molan, o governo precisa fazer um primário 4% do PIB para, assim, provocar uma reversão do crescimento da dívida pública. “O país ainda não está com risco de solvência porque tem reservas elevadas (de US$ 369 bilhões na sexta-feira). Mas os investidores acabam mantendo o prêmio de risco alto porque estão preocupados com o quadro atual. A instabilidade política vem impedindo que o ajuste seja feito”, avisa o economista, que considera o país, do ponto de vista fiscal, um “morto-vivo”. Ele destaca que a dívida bruta do governo geral poderá ultrapassar 90% do PIB em 2020.

Molan critica a política desenfreada de capitalização dos bancos públicos e que não evitaram a desaceleração do PIB. Somente os créditos para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) passaram de R$ 236 bilhões, em 2010, para R$ 522 bilhões, neste ano, salto de 121,2%. “Esses repasses claramente prejudicaram a execução do superavit primário do governo e resultaram no aumento da dívida nesse período”, destaca.

Recessão
A recessão na qual o país mergulhou também tem ajudado a ampliar a dívida pública, ao reduzir o PIB. E a maioria dos especialistas prevê deficit primário em 2016. Newton Rosa, economista-chefe da Sul América Investimentos, estima rombo fiscal de 0,9% do PIB, enquanto a LDO de 2016 determina superavit de 0,7%. A base do governo, à revelia do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, quer zerar a meta.

Para o economista José Luis Oreiro, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a indexação das despesas do governo acaba piorando o resultado das contas públicas. “Com o reajuste do salário-mínimo, que será superior a 10%, os gastos da Previdência vão disparar e empresas vão demitir, gerando mais recessão”, avisa.

Carlos Kawall, economista-chefe do banco Safra, avalia que o governo só conseguirá conter o ritmo de expansão da dívida pública se conseguir realizar as reformas estruturais para conter os gastos obrigatórios, que consomem 90% do orçamento federal. “As reformas da Previdência e a tributária também são necessárias, assim como a desvinculação dos gastos de saúde e de educação”, afirma.