Título: Burocracia volta aos anos 1960
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Fonte: Correio Braziliense, 29/09/2011, Opinião, p. 22

A penosa transferência dos servidores públicos para a nova capital da República, em local ermo no Planalto Central do país, obrigou o então presidente Juscelino Kubitschek a oferecer incentivos para quebrar resistências. Além da "dobradinha", salário em dobro, o servidor ganhava moradia e tinha a mudança custeada pelo Estado. Lá se vão 51 anos, Brasília se firmou como polo irradiador de desenvolvimento, mas a maior parte do funcionalismo continua residindo no Rio de Janeiro. Petrobras, Eletrobras e Furnas têm lá suas principais estruturas. Os ministérios da Fazenda e da Educação, a Previdência Social, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para citar exemplos notórios, mantêm raízes em terras fluminenses. É o Estado voltando as costas para a própria sede.

O absurdo é tamanho que o Rio tem quase o dobro de funcionários federais que a capital federal: cerca de 113 mil contra 61 mil. Agora se sabe que, na surdina, o Banco do Brasil começa a deixar Brasília rumo a São Paulo. Já despachou para lá a Diretoria Comercial, responsável pelo relacionamento com os grandes clientes pessoas jurídicas, a diretoria de Marketing e a gerência de Agronegócio, além de áreas de interesse social e negocial.

O argumento oficial é a proximidade com o mercado financeiro, uma falácia em tempos de comunicação global on-line. Outro, a redução, com a maior distância física do centro do poder, das interferências políticas. Ora, partes da instituição, quaisquer que sejam, onde quer que estejam, sempre estarão sujeitas à orientação da presidência, mantida no Setor Bancário Sul, a poucos quilômetros da Praça dos Três Poderes. No mais, decretar independência com mudança de endereço soa a galhofa.

Estima-se que 200 funcionários já tenham sido transferidos para São Paulo, dentro de um plano de reestruturação que visa mandar para lá, até 2014, cerca de 2 mil empregados da área meio, não só oriundos do Distrito Federal, mas também de outras regiões do país. A ideia é que um terço de cada diretoria funcione na capital paulista, deslocando-se para o Rio de Janeiro a de Assuntos Internacionais. Sem contar o gasto, que inclui a ocupação de dois prédios na Avenida Paulista, falta lógica à iniciativa. O Banco do Brasil, o nome diz, é nacional ¿ não pode ter melhor localização que no centro geográfico do país, naturalmente que com agências e postos em cada recanto, da Amazônia aos pampas gaúchos, do Pantanal mato-grossense às cidades litorâneas.

Centro das decisões políticas e da burocracia federal, Brasília é uma realidade inescapável. É inacreditável que, passadas mais de cinco décadas desde a inauguração, ainda enfrente resistência de órgãos públicos. Consolidado de direito, o Distrito Federal precisa ser firmado de fato como sede da administração nacional, de modo a facilitar a vida do cidadão. A Esplanada dos Ministérios, sobretudo, mas todo o plano urbanístico setorizado contribui para reduzir os deslocamentos e o tempo gasto na solução de pendências com o Estado nas diversas esferas de poder. Basta de revival dos anos 60.