Correio braziliense, n. 19.217, 06/01/2016. Política, p. 5

As conexões do lobista

LAVA-JATO » João Augusto de Rezende Henriques responde a ação na Justiça Federal com Ângelo Lauria, que comprou refinaria de Manguinhos, defendida no passado por Eduardo Cunha
Por: EDUARDO MILITÃO

EDUARDO MILITÃO

 

O lobista que repassou 1,3 milhão de francos suíços ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), após um negócio com a Petrobras é réu em ações com um empresário ligado a um advogado com interesses já defendidos pelo deputado no setor de combustíveis. Apesar disso, o parlamentar e o lobista João Augusto de Rezende Henriques, preso na Operação Lava-Jato, afirmam que não têm relações comerciais ou políticas.

O lobista é réu em execução fiscal e em uma ação penal na Justiça Federal de São Paulo por uma empresa de pescados falida, a Blue Deep Indústria e Comércio de Alimentos Ltda. A firma pertence de fato ao empresário Ângelo Tadeu Lauria, que, por sua vez, comprou a refinaria de Manguinhos do advogado Ricardo Magro, que o defende hoje em ações fiscais e trabalhistas. Magro teve os seus interesses defendidos pelo deputado Eduardo Cunha em 2009, quando Manguinhos queria continuar a comprar gasolina “A” da petroquímica Braskem.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) concluiu que o parlamentar “intercedeu junto a pessoas ligadas à Braskem para solucionar eventuais problemas surgidos na entrega de gasolina” à unidade de refino. No entanto, o Ministério Público entendeu que, pelo fato de a Braskem ser uma empresa majoritariamente privada à época, o fato apurado, embora “condenável do ponto de vista ético”, não significaria crime. A PGR pediu o arquivamento do inquérito em relação a Cunha e o retorno do caso de sonegação fiscal de volta para o Rio de Janeiro em relação aos outros envolvidos. Hoje, 36% da Braskem pertencem à Petrobras.

A Blue Deep funcionava em Guaratinguetá (SP) e estava registrada em nome dos filhos de Lauria, mas a Justiça paulista afirmou que o dono verdadeiro era ele. As dívidas totais eram de “milhões de reais”, segundo o juiz da 1ª Vara da cidade, Paulo César Meireles. Um único fornecedor de pescados da Argentina era credor de US$ 1,5 milhão. A empresa foi à falência.

Na Justiça Federal de Guaratinguetá, a Blue Deep responde a uma ação criminal e a uma de execução fiscal e por falta de pagamentos à Previdência Social. Lauria e Henriques também estão entre os réus nesses dois processos. O advogado do lobista, José Cláudio Marques Barboza Júnior, afirmou ao Correio que Henriques conhece Lauria, mas não sabe quais são os negócios deles nem o motivo de estarem juntos nas ações. O jornal deixou recados para Lauria em suas empresas e com familiares nos últimos dias, mas não obteve retorno algum.

 

Máfia

Magro foi investigado pela Polícia Civil do Rio suspeito de participar da máfia dos combustíveis. Depois de vender a refinaria de Manguinhos para Lauria, que usou a empresa Rodopetro, passou a advogar para a unidade de refino em ações fiscais. Ele ainda defendeu outra firma de Lauria alvo de ações fiscais, a EBTL – Empresa Brasileira de Transporte de Líquidos, cujo ramo de atuação inclui logística de produtos perigosos e “holding de serviços financeiros”, segundo a Receita Federal. Integrantes da Polícia Federal detectaram parte das ligações de Lauria com Henriques e suspeitam que ele seja um doleiro do lobista — acusado de desviar dinheiro da Petrobras para políticos e empresários.

O advogado Barboza Júnior disse que o lobista não tem relações com Ricardo Magro e com Cunha. Magro não retornou recados deixados com suas secretárias. A assessoria do deputado repassou o caso para seu advogado, Antônio Fernando Souza, que não prestou esclarecimentos ao jornal.

Henriques faturou US$ 20 milhões após um negócio frustrado em que a Petrobras injetou US$ 66 milhões nas empresas CBH e Lusitânia Petroleum, do português Idárecio de Oliveira, para comprar metade de um poço de petróleo em Benin. Ele repassou parte de sua comissão — para a PF, propina — a vários “amigos” que lhe deram “dicas” e “ajuda” para concretizar o negócio. No caso de Eduardo Cunha, ele disse que a conta foi indicada por Felipe Diniz, que nega a informação. O deputado afirma que recebeu o dinheiro sem seu consentimento, supostamente para que o pai de Diniz quitasse com ele uma dívida de cerca de US$ 1 milhão.

 

1,3 milhão

Total de francos suíços repassados pelo lobista João Augusto de Rezende Henriques para o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, após um negócio com a Petrobras, segundo a Procuradoria-Geral da República

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