Correio braziliense, n. 19.224, 13/01/2016. Política, p. 2

A metalhadora de Cerveró

CRISE NA REPÚBLICA » Em depoimentos de delação premiada, o ex-diretor da Petrobras tem disparado contra políticos de PT, PSDB, PTB e PMDB. As últimas citações envolvem Dilma, Collor e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
 
Por: EDUARDO MILITÃO

O ex-diretor da Petrobras e da BR Distribuidora Nestor Cerveró, que fechou acordo de delação premiada na Operação Lava-Jato, atinge políticos de todas as cores partidárias. Até agora, foram pelo menos oito, do PT, PSDB, PTB e PMDB. A última acusação, prestada em 7 de dezembro, mas só conhecida ontem, caiu sobre a presidente Dilma Rousseff. De acordo com o delator, a presidente Dilma Rousseff garantiu ao senador Fernando Collor (PTB-AL) que a presidência e as diretorias da BR Distribuidora “estavam à disposição” dele. Cerveró afirmou, naquele dia, aos investigadores que foi o próprio Collor quem lhe fez esse relato.

“Fernando Collor de Mello disse que havia falado com a presidente da República, Dilma Rousseff, a qual teria dito que estavam à disposição de Fernando Collor de Mello a presidência e todas as diretorias da BR Distribuidora”, narrou o depoente à Polícia Federal no Paraná. A petista silenciou sobre o caso e Collor negou as declarações. “O Planalto não vai comentar o assunto”, disse a assessoria da Presidência da República.

A Operação Lava-Jato apura um esquema de desvios de dinheiro em estatais do setor de energia, como a Petrobras, montado por grandes empreiteiras e políticos, envolvendo os crimes de cartel, superfaturamento, corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa.

Em nota, o advogado de Collor, Rogério Marcolini, manifestou “pronta refutação do até aqui alardeado” por Cerveró. Para ele, são “falsas as alegações de que o senador Fernando Collor tenha usado de influência política para obter favores ou exercer qualquer outro tipo de pressão sobre diretores ou funcionários da BR Distribuidora a fim de satisfazer interesses próprios ou de terceiros”. De acordo com a defesa, as relações do parlamentar com a instituição “sempre se deram exclusivamente em caráter institucional, no desempenho da função de senador”.

O objetivo sempre foi a “defesa dos interesses de Alagoas, tudo no legítimo exercício da representação parlamentar”. Cerveró afirmou que o amigo e ex-ministro de Collor Pedro Paulo Leoni Ramos, o “PP”, participou das conversas. Ele não quis comentar o tema ontem.

 

Indicação de Lula

Ainda de acordo com Cerveró, saída dele da Diretoria de Internacional da Petrobras para a Financeira da BR Distribuidora, em 2008, foi um reconhecimento do então presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, por sua ajuda no repasse de R$ 12 milhões para o PT. O dinheiro tinha sido obtido por meio de um empréstimo simulado entre o Banco Schahin e o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente. “Que, como reconhecimento da ajuda do declarante nessa situação, o presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva decidiu indicar o declarante para uma diretoria na BR Distribuidora”, afirmou Cerveró em sua delação, em 7 de dezembro. O ex-diretor afirmou que Lula chegou a retirar o senador José Eduardo Dutra da empresa para que ele voltasse ao Senado com a missão de fazer o “esvaziamento” a CPI da Petrobras de 2009.

Em nota ontem à noite, o Instituto Lula negou qualquer relacionamento com o ex-dirigente da petroleira e da BR Distribuidora. A entidade disse que as declarações do ex-dirigente da petroleira “ilações produzidas” por ele. A assessoria relatou que Lula fez apenas duas indicações “pessoais” na estatal e reforçou depoimento do petista em que ele avaliou que a nomeação de Cerveró não foi “direta”.

“Lula não tem e não teve relação pessoal com o delator, muito menos o sentimento de 'gratidão' subjetivamente atribuído a ele”, disse a assessoria do petista. O instituto garantiu que o ex-presidente só indicou duas pessoas na Petrobras, os fez apenas duas indicações pessoais na Petrobras, os ex-presidentes da estatal José Eduardo Dutra e José Sérgio Gabrielli. “Os demais diretores da estatal e de empresas controladas foram indicados por partidos, como aliás ocorreu e ocorre em outros governos no Brasil e em outras democracias ao redor do mundo”, disse a nota.

A assessoria destacou que, em 16 de dezembro, o ex-presidente depôs à PF, quando negou ter conhecimento de qualquer empréstimo simulado do Banco Schahin, fato que poderia vinculá-lo às declarações de Cerveró. Na oitiva à polícia, Lula afirmou: “Não tratou diretamente da substituição de Nestor Cerveró por Jorge Zelada na Diretoria de Internacional da Petrobras”. Disse ainda “que não tratou com Bumlai sobre a indicação de Nestor Cerveró para assumir o cargo de diretor financeiro da BR Distribuidora”. O ex-presidente Lula afirmou que a nomeação de Zelada, preso na Lava-Jato, “era uma reivindicação do PMDB”. E contou à Polícia Federal que “acha” que a nomeação de Cerveró para BR “também foi uma solicitação do PMDB”.

 

»  A lista do delator

Ex-diretor da Petrobras acusou e mencionou vários políticos em seus depoimentos

 

Lula

»  O delator afirmou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva “reconheceu” a ajuda que Cerveró prestou ao ajudar a arrecadar R$ 12 milhões para o PT por meio de um empréstimo simulado entre o Banco Schahin e o pecuarista José Carlos Bumlai. O reconhecimento se deu pela indicação de Cerveró para a diretoria da BR Distribuidora

 

FHC

»  Cerveró disse em seu depoimento que, quando a Petrobras comprou a petroquímica argentina Perez Companq, o negócio “envolveu uma propina no governo (do ex-presidente) Fernando Henrique Cardoso de US$ 100 milhões”.

 

Dilma

»  Afirmou que, segundo o senador Fernando Collor, a presidente Dilma Rousseff garantiu que a presidência e as diretorias BR Distribuidora “estavam à disposição” do parlamentar

 

Fernando Collor

»  Disse ter recebido ordens para “atender solicitações” para Collor. Afirmou que o senador e seu amigo e empresário Pedro Paulo Leoni Ramos, o “PP”, mantiveram-no no cargo para não atrapalhar “os negócios conduzidos por ambos” na BR Distribuidora, como a distribuição de combustíveis

 

Delcídio do Amaral e Jader Barbalho

»  Revelou que o senador Delcídio recebeu “muito mais” do que os US$ 600 mil dólares de propinas obtidos pelo próprio Cerveró na compra de turbinas da Alstom. Afirmou que Jader Barbalho (PMDB) foi o padrinho de Delcídio na Petrobras nos anos 1990. Conta ter recebido ordens para arrecadar propina para Delcídio. Sobre Jader, afirmou que ele estava na reunião com Renan Calheiros e Paulo Roberto Costa em que ficou acertado repassar R$ 6 milhões ao PMDB. Cerveró disse que o operador de Jader era o lobista Jorge Luz.

 

Renan Calheiros

»  Disse ter recebido ordens para arrecadar propina para o Presidente do Senado.

 

Cândido Vaccarezza

»  Sobre o ex-deputado federal, afirmou ter recebido ordens para “atender solicitações” do ex-líder do governo na Câmara.

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Reunião com Renan sobre subornos

De acordo com Nestor Cerveró, o Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), chamou-o para uma reunião em seu gabinete parlamentar em 2012 para cobrar pagamentos de suborno. “Na ocasião, Renan Calheiros reclamou da falta de repasse de propina por parte do declarante”, disse o delator. Ele afirmou ter respondido que, na BR Distribuidora, não estava arrecadando dinheiro para o esquema de corrupção. O senador teria informado, então, que o abandonaria. “Renan Calheiros disse que, a partir de então, deixava de prestar apoio político ao declarante”, contou. Em nota, Renan negou as acusações e a reunião mencionada.

Cerveró já havia informado ter participado de um encontro com Renan, o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) e o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. Na reunião, ficou acertado fazer o repasse de R$ 6 milhões para o partido. Disse ter recebido ordens para arrecadar propina para o Presidente do Senado. Ainda segundo Cerveró, ele deveria atender aos pedidos de Collor, do ex-líder do governo na Câmara Cândido Vaccarezza (PT-SP).

O ex-deputado tem negado as acusações. Em outubro passado, Jader fez o mesmo em outubro passado. “Não tenho outro instrumento que chegar aqui e dizer de público da minha indignação”, disse ele, à época. “Temos que aguardar que o Judiciário e o Ministério Público possam esclarecer os fatos. Estou com tranquilidade e posso dizer que não há nenhum envolvimento de minha parte.” (EM)

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