Após mudanças, pré-sal pode ter leilão em 2017

André Ramalho,  Rodrigo Polito 

26/02/2016

Aprovado pelo Senado, o fim da operação única da Petrobras no pré-sal abre espaço para a realização de uma nova rodada de partilha a partir de 2017. A Agência Nacional de Petróleo (ANP) tem ao menos quatro áreas no pré-sal já mapeadas para ofertar ao mercado, mas analistas consultados pelo Valor acreditam que seja pouco provável organizar um leilão ainda este ano, por falta de tempo hábil para os trâmites necessários.

O projeto de lei que tira a obrigação da Petrobras de entrar como operadora e com participação mínima de 30% nos ativos leiloados sob o regime de partilha ainda depende da aprovação na Câmara e da sanção da presidente Dilma Rousseff. Depois disso, caberá ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) convocar a licitação e à ANP selecionar as áreas a serem ofertadas, elaborar o edital e as minutas do contrato de partilha e realizar as audiências públicas para discutir os documentos.

Por isso, segundo o consultor Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), talvez seja difícil ter o arcabouço legal preparado para um leilão ainda este ano. "Mas no ano que vem, com certeza dá [para fazer leilão]", comenta o especialista.

Pires acredita que a mudança nas regras do pré-sal cria um ambiente regulatório favorável para um novo leilão de partilha, mesmo diante de um momento de baixa nos preços do barril do petróleo.

O fim da operação única da Petrobras foi bem recebido pelo Instituto Brasileiro do Petróleo, Gás e Biocombustíveis. A nova regra, segundo o IBP, "deverá atrair novos investimentos, imprimir um novo ritmo ao desenvolvimento da província do pré-sal, estimular toda a cadeia de fornecedores da indústria do petróleo, gerando empregos, tributos e renda", se aprovada na Câmara e por Dilma Rousseff.

Especialistas comentam que ainda é cedo para dizer se, diante da baixa dos preços do barril, haveria hoje concorrência pelo pré-sal. Alberto Machado, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), aposta no interesse das estrangeiras, principalmente das estatais chinesas e das grandes multinacionais do setor. Ele lembra ainda que, num momento de enfraquecimento do real, o bônus de assinatura cobrado em leilão ficaria mais barato para as estrangeiras.

"Uma empresa de petróleo trabalha sempre no longo prazo. As empresas precisam de descobertas, porque a taxa de declínio das reservas é de 10% ao ano. Isso é muito importante para as empresas que têm o petróleo como negócio e as estatais de países sem grandes reservas", diz Machado.

Em visita ao Brasil, este mês, o presidente da Shell, Ben van Beurden, sinalizou que a Shell teria interesse em atuar como operadora no pré-sal e disse que o fim da operação única da Petrobras no pré-sal seria vantajosa para o país. "[o assunto] Cabe ao governo brasileiro. Se me perguntar se faz sentido [o fim da operação única], eu diria que faz sentido convidar mais empresas. Não vejo como isso não traria mais vantagens para o Brasil. Traria mais capacidade de investimentos", disse durante o anúncio da conclusão da compra da BG.

O consultor e ex-diretor da ANP David Zylbersztajn lembra que os campos do pré-sal hoje em produção foram leiloados num momento em que os preços também estavam baixos, no início dos anos 2000. Mas ressalva que o interesse no Brasil já não é o mesmo de anos atrás. "O Brasil perdeu a janela de oportunidade quando interrompeu os leilões em 2008. O mundo está cheio de oportunidades. O Brasil hoje compete com México, com o Irã...", avaliou o consultor.

O interesse também depende do perfil das áreas oferecidas. Em road-shows a investidores, representantes da ANP destacam com frequência oportunidades de negócios nas áreas de Pau-Brasil, Peroba, Saturno e Alto de Cabo Frio.

Pau-Brasil, próximo da descoberta de Júpiter, é uma das grandes apostas e, segundo estimativa da Gaffney, Cline & Associates, de 2010, possui entre 700 milhões e 2,3 bilhões de barris 'in-situ' (total de óleo, ainda não comprovado, contido num reservatório). Em Peroba, a estimativa foi de 810 milhões e 3,37 bilhões de barris. Procurada, a ANP informou que "estuda permanentemente as áreas e está sempre pronta a passar para o governo as informações necessárias à realização de rodadas".

 

Valor econômico, v. 16, n. 3951, 26/02/2016. Brasil, p.