Correio braziliense, n. 19230, 19/01/2016. Economia, p. 7

GASOLINA ATÉ 44% MAIS CARA QUE NO EXTERIOR
 
CONJUNTURA »Com o tombo do preço do petróleo no mercado internacional, brasileiro vem arcando com valores elevadíssimos na hora de encher o tanque. Mas, segundo o governo, a prioridade neste momento é engordar o cofre da Petrobras, que está em situação difícil
Por: Simone Kafruni
 

 

» SIMONE KAFRUNI

 

Os brasileiros estão pagando até 44% mais caro pelos combustíveis do que no exterior, segundo cálculos do banco Bradesco. A diferença se acelerou nas últimas semanas, diante do forte tombo do preço do barril de petróleo no mercado internacional. Por enquanto, a determinação dentro do governo é para que a Petrobras aproveite o momento favorável e reforce o caixa. Mas não será surpresa se, ao longo do ano, a estatal for obrigada a reduzir o valor da gasolina e do diesel para evitar que a inflação estoure o teto da meta, de 6,5%, pelo segundo ano consecutivo.
Ontem, o barril do óleo Brent chegou a ser negociado abaixo de U$ 28, o menor valor desde 2003, diante da retirada das sanções comerciais ao Irã — o quarto produtor mundial, com 2,8 milhões de barris diários — pelos Estados Unidos e a União Europeia. No fim do dia, porém, houve uma ligeira recuperação e o petróleo foi cotado a US$ 28,55, com queda de 0,97% ante a véspera.
Pelos cálculos do diretor de Pesquisas Macroeconômicas do Bradesco, Octavio de Barros, a diferença entre o preço que a Petrobras cobra pelos combustíveis no mercado doméstico e o valor que paga ao importar o produto é de 44%. Se essa defasagem fosse zerada, a inflação poderia cair 1,23 ponto percentual, o que faria com que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encerrasse 2016 em 5,25%.
Para o Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie), a gasolina está 26,4% mais cara no Brasil e o óleo diesel, 54%. E é possível que essa diferença aumente nos próximos dias, diante da perspectiva de que o barril de petróleo caia para US$ 25. Segundo os especialistas, há hoje sobra de 1,5 milhão de barris por dia no mundo, volume que pode subir para 2,5 milhões de barris com a entrada do Irã no mercado.

Desespero
Na opinião de René Rodrigues, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), não há perspectiva de recuperação para o preço do petróleo, devido ao enfraquecimento da demanda, à menor atividade econômica mundial e ao fato de os Estados Unidos terem parado de importar óleo e se tornado exportadores. “Isso ocorreu sem que nenhum país produtor reduzisse a oferta. A Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) não baixou a produção. E agora o Irã voltou ao mercado, intensificando a oferta e acelerando a queda”, analisou. Por trás da decisão da Opep, está a Arábia Saudita, o principal produtor mundial. O país quer quebrar o Irã e inviabilizar a extração do gás de xisto nos EUA.
Segundo Adilson de Oliveira, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o excesso de oferta tem efeito nos preços. “A pergunta é como os outros agentes vão agir. Os EUA vão reduzir? E o Irã? O Brasil, como se sabe, não pretende diminuir a sua produção porque a Petrobras precisa, desesperadamente, de fluxo de caixa”, disse. A boa notícia, afirmou ele, é que o gás natural importado da Bolívia ficará mais barato. “Isso pode derrubar o custo da energia elétrica gerada por térmicas”, alertou.

Política de preços
Para Oliveira, a queda dos preços dos combustíveis praticados no Brasil depende do governo. “No passado, o Planalto errou ao evitar reajustes quando o barril foi além de US$ 100, para conter a inflação. Agora, seria o momento de preservar a Petrobras, dar um fôlego à estatal. Além disso, os preços praticados pela empresa não podem ficar tão submetidos às oscilações do mercado internacional. O mais sensato seria ter uma estratégia clara e transparente”, opinou.
No entender da economista Celina Ramalho, do Conselho Federal de Economia (Cofecon), a Petrobras foi drenada por mais de 10 anos por meio de políticas populistas. “Nos últimos dois anos, houve restrições para promover a reposição de preços dos combustíveis porque resultaria em mais inflação. Isso também explica o fato de ao menos 80 usinas produtoras de etanol terem entrado em situação falimentar. Os preços do álcool ficaram retidos”, lembrou.
Segundo Celina, o governo precisa escolher. “Ou olha para a Petrobras com interesse de recuperação da empresa, ou para o efeito macroeconômico da inflação. A escolha é política”, assinalou. Para ela, a tendência de consumo de combustíveis no Brasil é de queda por conta da crise econômica e de o litro da gasolina estar acima de R$ 4. 

Colaborou Antonio Temóteo

Barbosa nega socorro

O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, garantiu ontem que o governo não trabalha com a possibilidade de socorrer a Petrobras neste ano. Há uma especulação enorme entre os investidores de que a estatal, mesmo engordando o caixa com os preços dos combustíveis mais caros que os praticados no exterior, será obrigada a passar por um forte processo de capitalização para conseguir honrar suas dívidas e os investimentos programados para o aumento da produção. Como maior acionista da petroleira, o Tesouro Nacional teria que liderar o movimento de reforço de capital.

Brasil é o maior risco
A Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) ressaltou ontem, em nota, que o Brasil é hoje o maior risco para a demanda de óleo bruto entre todos os países da América Latina. Como a economia brasileira está mergulhada na recessão, o consumo de combustíveis está caindo. Segundo a entidade, somente em novembro do ano passado, a retração foi de 5,1%. O país demandou 2,356 milhões de barris de petróleo por dia. No caso da gasolina, o consumo encolheu 8,2% no mesmo período. Já o de diesel, tombou 7,2% e o do querosene de aviação, 5,9%. Não há previsão de recuperação.