Correio braziliense, n. 19.228, 17/01/2016. Política, p. 3
Com uma receita operacional que gira em torno de R$ 80 bilhões — envolvendo a distribuição de combustíveis em mais de 7,5 mil postos de combustíveis — e um lucro líquido acima de R$ 3,2 bilhões entre 2013 e 2014, a BR Distribuidora é um alvo cobiçado por partidos políticos. Assumir uma de suas quatro diretorias representa um passo importante para conquistar poder e influência em todas as regiões do Brasil. Os quatro diretores e o presidente da empresa têm, em suas canetas, o poder para indicar cerca de 1 mil nomes sem a necessidade de concurso público. A denúncia do procurador-geral da República (PGR), Rodrigo Janot, que veio à tona esta semana e está sob análise do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, passa a limpo como funcionou o esquema de nomeações com interesses políticos e financeiros que tomou conta da empresa.
Levantamento do Correio/ Estado de Minas, com os nomes que ocuparam os principais cargos da BR Distribuidora nos últimos anos, demonstra que, a partir de 2009, o ex-presidente Fernando Collor (PTB) conseguiu emplacar apadrinhados em três das quatro principais secretarias da empresa. Na subsidiária da Petrobras, os cargos foram ocupados por funcionários de carreira — a maioria deles com mais de duas décadas na empresa —, no entanto, para ocupar as cadeiras mais altas, foram necessárias indicações de partidos políticos e de ministros influentes no Palácio do Planalto.
Desde o segundo mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o senador Fernando Collor passou a integrar a base aliada do governo federal. Em 2010, após ser derrotado na disputa pelo governo de Alagoas em primeiro turno, o ex-presidente declarou apoio ao ex-governador Ronaldo Lessa (PDT) no segundo turno — que disputava com Teotônio Vilela Filho (PSDB) — e à presidente Dilma Rousseff (PT). A aproximação de Collor gerou insatisfação dentro do PT, mas as críticas foram controladas.
Menos de um ano antes, em 2009, Collor e seu partido PTB apoiariam pela primeira vez nomes para a BR Distribuidora. Foram indicados Luiz Cláudio Caseira Sanches, para a Diretoria de Rede de Postos e Serviços, e José Zonis, para a Diretoria de Operações e Logística. A nomeação de pessoas ligadas a Collor foi motivo de ataques durante a disputa eleitoral de 2010, com José Serra (PSDB) criticando o PT por entregar cargos para um político destituído do Planalto “por atos de corrupção”.
Como é
Saiba mais sobre a BR Distribuidora
Sociedade anônima de capital fechado (não tem ações na bolsa de valores).
Subsidiária da Petrobras. Atua no segmento de distribuição e comercialização de combustíveis derivados de petróleo, como óleo diesel, gasolina, querosene de avião e biocombustíveis.
Fundada em 1971, no governo Médici, durante o milagre econômico.
Em seu terceiro ano de existência, assumiu a ponta entre as empresas distribuidoras de derivados de petróleo no Brasil.
Até 2014, era a segunda maior empresa brasileira (atrás apenas da Petrobras)*.
Em 2013, alcançou lucro líquido recorde de R$ 2,132 bilhões. Em 2014, com o início das investigações da Lava-Jato, o lucro caiu pela metade. Mas, ainda assim, ficou em R$ 1,12 bilhão.
Receita operacional líquida (movimentação financeira em toda a rede de distribuição de combustíveis): R$ 86 bilhões.
Patrimônio líquido em dezembro de 2014: R$ 12,1 bilhões.
Funcionários em dezembro de 2015: 4.054.
Funcionários não concursados em dezembro de 2015: 1.243.
Número de postos de combustíveis: 7,5 mil.
*Levantamento da Revista Exame
Fonte: BR Distribuidora
O tamanho da cobiça
Confira os últimos três ocupantes dos cargos de comando da BR Distribuidora
Presidente
» Carlos Alberto Barra Tessarollo (Economista e funcionário da Petrobras desde 1978) – Desde 17/9/2015
» José Lima de Andrade Neto (Engenheiro químico e funcionário da Petrobras desde 1978) – 14/8/2009 a 16/9/2015 – Indicação de Collor
» José Eduardo Dutra (Geólogo e funcionário da Petrobras desde 1983) – 21/9/2007 a 13/8/2009 – Indicação do PT
Diretoria de Rede de Postos e Serviços
» Thomaz Lucchini Coutinho (Engenheiro mecânico e funcionário da Petrobras desde 1990) – Desde 15/7/2015
» Luis Alves de Lima Filho (Engenheiro de produção química e funcionário da Petrobras desde 1980) – 8/7/2013 a 14/7/2015 – Indicação de Collor
» Luiz Cláudio Caseira Sanches – 21/9/2009 a 7/7/2013 – Indicação de Collor
Diretoria Financeira
» Carlos Alberto Barra Tessarollo (Economista e funcionário da Petrobras desde 1978) – Desde 26/3/2015
» José de Lima Andrade Neto (Engenheiro químico e funcionário da Petrobras desde 1978) – 21/3/2014 a 25/3/2015 – Indicação de Collor
» Nestor Cunat Cerveró (Engenheiro químico e funcionário desde 1975) – 3/3/2008 a 20/3/2014 – Indicação de PT e PMDB
Diretoria de Mercado Consumidor
» Antônio Carlos Alves Caldeira (Engenheiro civil e funcionário da Petrobras desde 1983) – 15/7/2015 até hoje
» Andurte de Barros Duarte Filho (Engenheiro mecânico e funcionário da Petrobras desde 1982) – 3/3/2008 a 14/7/2015 – Indicação do PT da Câmara
» Marco Antonio Vaz Capute (Engenheiro eletricista e funcionário da Petrobras desde 1979) – 17/5/1999 a 2/3/2008
Diretoria de Operações e Logística
» Ivan de Sá (Engenheiro mecânico e funcionário da Petrobras desde 1985) – 1/7/2015 até hoje
» Vilson Reichemback Silva (Formado em direito e funcionário da Petrobras desde 1976) – 8/7/2013 a 30/5/2015 – Indicação de Collor
» José Zonis (Engenheiro de Produção e funcionário da Petrobras desde 1983) – 21/9/2009 a 7/7/2013 – Indicação de Collor e do PMDB
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O último nome ligado ao ex-presidente Collor a deixar a BR Distribuidora foi José Lima de Andrade Neto, que ocupou o principal cargo da empresa por seis anos — desde agosto de 2009 até setembro de 2015. Na época, ele foi indicado com o apoio do então ministro de Minas e Energia, Edison Lobão (PMDB). Ao renunciar à presidência da distribuidora em setembro, Andrade Neto apresentou como justificativa motivos de saúde.
Segundo a denúncia da Procuradoria-Geral da República, entre 2010 e 2014, foi criada “uma organização criminosa preordenada principalmente ao desvio de recursos públicos em proveito particular”. O documento integra uma peça protocolada no STF contra o deputado federal Vander Loubet (PT-MS), acusado de lavagem de dinheiro e corrupção no esquema investigado pela Lava-Jato. Apesar de o ex-presidente Lula não ser alvo da investigação, Janot aponta que Lula deu poder a Collor na BR Distribuidora. Procurada pela reportagem para comentar as denúncias do procurador-geral da República, a assessoria de Collor não respondeu até o fechamento desta edição. Segundo a assessoria do PTB, que também não quis se manifestar sobre as denúncias, a equipe do senador está de férias. (MF)