Correio braziliense, n. 19.231, 20/01/2016. Brasil, p. 6

Foi falha humana

EDUARDO CAMPOS » Relatório da Aeronáutica descartou evidências de problemas mecânicos na aeronave
Por: Hédio Ferreira Júnior

 

A inabilidade técnica do piloto e do copiloto na condução da aeronave PR-AFA e as condições climáticas adversas na manhã de 13 de agosto de 2014, em Santos (SP), teriam sido determinantes para causar o acidente aéreo que matou o ex-governador de Pernambuco e então candidato à Presidência da República Eduardo Campos e outras seis pessoas. A falha mecânica dos equipamentos de pouso e de segurança do avião foi descartada.

Relatório apresentado pela comissão do Centro de Investigações e Prevenções de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) da Força Aérea Brasileira (FAB), na tarde de ontem, apontou a falha humana e a desorientação espacial da tripulação como responsáveis pelo descontrole do avião que caiu no interior paulista durante a campanha presidencial. O resultado das investigações deixou os familiares do piloto Marcos Martins e do copiloto Geraldo Magela contrariados com o laudo da comissão.

 

Experiência

Tidos como experientes, com mais de 20 anos de carreira na aviação e milhares de horas de voo em outras aeronaves, os dois foram apontados pelas investigações como com pouca experiência na pilotagem do avião modelo Cessna 560 XL e nenhum treinamento específico para o painel de controle da aeronave.

Apesar das conclusões apresentadas durante quase 2 horas apontando o despreparo dos tripulantes no contorno do acidente, o chefe da Cenipa, brigadeiro Dilton José Schuck, preferiu dividir as responsabilidades. Dizer que tem condição direta, a gente não pode dizer que tem, não, afirmou, antes de completar que nenhuma evidência de falha mecânica foi encontrada.

As más condições meteorológicas foram contribuintes para o acidente, segundo o brigadeiro, e estariam próximas dos mínimos de segurança. Antes de pousar, os tripulantes fizeram uma pequena alteração na rota do voo sem consulta nem aviso prévio à torre de controle. O mau tempo não colocaria em risco a operação, caso o perfil de orientação do plano de pouso tivesse sido seguido.

 

“Desorientação”

desorientação espacial dos pilotos foi, por diversas vezes, lembrada como um elemento que influenciou na perfeita condução da aeronave. Levantamento do relatório do acidente identificou lacunas no comportamento do copiloto, apontado como um profissional passivo diante da postura mais assertiva do colega. O piloto teria, inclusive, reclamado da sobrecarga de trabalho por assumir atividades que o outro não conseguia desempenhar, segundo o relatório.

O documento também descartou algumas suposições apontadas por testemunhas na época do acidente: vídeos ajudaram os técnicos a concluírem que a aeronave se chocou com o solo a cerca de 700 km/h, não estava pegando fogo e não estava em posição invertida, ou seja, virada de cabeça para baixo.

Antes da apresentação à imprensa do relatório da comissão, familiares das vítimas estiveram reunidos com os investigadores, que os apresentaram à conclusão da apuração. Parentes do piloto e do copiloto mortos no acidente não compareceram. A defesa dos dois tenta provar que houve falha no projeto da aeronave.

 

Frase

“O mau tempo não colocaria em risco a operação, caso o plano de pouso tivesse sido seguido

Dilton José Schuck, Brigadeiro

 

Principais pontos

» Desorientação espacial

No cenário em que se deu a colisão da aeronave contra o solo, diversas condições teriam sido desfavoráveis aos pilotos, como a redução da visibilidade por causa das más condições do tempo, o estresse e o aumento da carga de trabalho, a falta de treinamento adequado e uma “possível perda da consciência situacional”.

 

» Falta de disciplina e atitude da tripulação

Piloto e copiloto desviaram a rota de pouso na chegada ao aeroporto de Santos, sem consultar nem comunicar previamente os controladores de voo. A alteração do trajeto acabou fazendo com que eles não adotassem os procedimentos previstos e se vissem na necessidade de arremeter a aeronave.

 

» Mau tempo

A chuva e os ventos fortes na manhã do acidente fizeram com que a Cenipa avaliasse as condições do tempo como próximas dos mínimos de segurança. O mau tempo, porém, não apresentava risco à operação, caso os pilotos tivessem consultado previamente o boletim meteorológico.

 

» A queda

O relatório também descartou algumas suposições apontadas por testemunhas na época do acidente: vídeos ajudaram os técnicos a concluir que a aeronave se chocou com o solo a cerca de 700 km/h, não estava em chamas e mantinha sua posição normal (e não invertida, virada de cabeça para baixo).

 

» Aeronave

Perícia feita nos destroços do avião apontou que os freios não foram acionados no momento da queda e o trem de pouso estava recolhido, procedimento diferente do que deveria acontecer durante a aterrissagem. A aeronave estava abastecida e os técnicos não identificaram ‘anormalidades pré-pouso” nos equipamentos.

 

Memória

Sete mortos em Santos

Na manhã de 13 de agosto de 2014, a aeronave que transportava o então candidato à Presidência da República pelo PSB, Eduardo Campos, caiu sobre uma área residencial da cidade de Santos (SP). No momento do acidente, o tempo estava chuvoso e ventava na região. Além dele, do piloto Marcos Martins e do copiloto Geraldo Magela, estavam no avião o assessor de imprensa de Campos, Carlos augusto Ramos Leal Filho, o assessor Pedro Almeida Valadares Neto, o fotógrafo Alexandre Severo Gomes e Silva e o funcionário da campanha Marcelo de Oliveira Lyra. A candidata à vice na chapa de Eduardo Campos, Marina Silva, assumiu a campanha e se manteve à frente das pesquisas, ameaçando a reeleição de Dilma Rousseff e a polarização do PT com o PSDB do senador Aécio Neves, também na disputa.

O avião Cessna PR-AFA estava registrado na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) em nome da AF Andrade, um grupo de usineiros de Ribeirão Preto. Porém, não há registro de que a AF Andrade atue como empresa de táxi aéreo. Os gastos com o avião não foram incluídos na primeira prestação de contas do PSB ao TSE.

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