Correio braziliense, n. 19.232, 21/01/2016. Economia, p. 6

BC cede ao Planalto e juros ficam em 14,25%

CONJUNTURA »Depois de dar seguidas indicações de que apertaria a política monetária, o Copom desiste de elevar a Selic. Para analistas, a decisão só foi tomada para atender a pressões do governo e do PT. Por isso, destruiu a credibilidade do Banco Central

Por: Antônio Temóteo

 

O Banco Central (BC) sucumbiu às pressões do governo e do PT  e manteve a taxa básica de juros (Selic) em 14,25% ao ano. Em uma decisão dividida, os membros do Comitê de Política Monetária (Copom) justificaram que as incertezas domésticas, e, principalmente, externas, pesaram na deliberação do colegiado, mesmo com as expectativas de inflação para 2016 rodando em 7%, acima do teto da meta definida pelo próprio Executivo. O Palácio do Planalto comemorou o veredito, mas o mercado classificou a medida como uma guinada na política monetária e já espera uma queda da Selic no segundo semestre.
A avaliação de boa parte dos economistas é de que as projeções para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) continuarão em alta ao longo do ano. A autoridade monetária, no entanto, parece convencida de que a recessão e o desemprego esfriarão ainda mais a demanda por produtos e serviços, contribuindo para a queda da inflação. Além disso, os membros do Copom mostraram preocupação com a volatilidade dos mercados internacionais, puxada pelo recuo do ritmo de atividade na China e pela queda dos preços do petróleo.
Para diversos especialistas, com uma economia ainda bastante indexada — o que alimenta a inércia inflacionária —, e diante de aumentos de impostos e tarifas, o IPCA caminha para estourar o teto da meta, de 6,5%, até o fim do ano. O pior é que o BC vinha indicando com ênfase, nas últimas semanas, que iria fazer o que fosse necessário para segurar a carestia, ou seja, subir os juros. Ao fazer o contrário, perdeu credibilidade. Com isso, o sacrifício para conter o avanço do custo de vida será, mais adiante, um ciclo de alta de juros ainda maior do que o projetado pelo mercado, de 1,25 ponto percentual. Na opinião de Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, a decisão do Copom jogou uma pá de cal na reputação da autoridade monetária. “Isso foi a prova de rendição do BC ao Executivo”, resumiu.
A percepção de que o BC foi cooptado pelos interesses políticos do Planalto e do PT foi reforçada pelas declarações dadas ontem pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em entrevista a blogs de notícias, Lula minimizou o risco de a inflação ficar acima de 8% e afirmou que “nem os banqueiros querem” subir juros. No mercado, a decisão do Copom foi vista como a adesão da autoridade monetária ao projeto da presidente Dilma Rousseff de mudar o rumo da política econômica e tentar recuperar o nível de produção e de emprego. Como na última reunião de 2015, o placar foi dividido: dois membros do colegiado — os diretores Sidnei Corrêa Marques, de Organização do Sistema Financeiro, e Tony Volpon, de Assuntos Internacionais — votaram em favor de elevar a Selic para 14,50%.

Guinada
Até o início da semana, a autoridade monetária sinalizava que trabalharia para reduzir a inflação para, no máximo, 6,5% em 2016, e fazer o IPCA convergir para a meta, de 4,5, em 2017. Para isso, seria preciso aumentar juros. No entanto, essa indicação provocou a ira do PT e de parte do governo, que consideram a medida descabida em um momento de baixo crescimento econômico. Nas avaliações do partido e de aliados, pesou também um cálculo político: o aprofundamento da recessão daria mais munição ainda à oposição nas eleições municipais deste ano e acabaria com as chances de um petista se manter no Planalto em 2018.
O BC ignorou até quando pôde as pressões, mas, na segunda-feira, em reunião com a presidente Dilma Rousseff, Tombini teria recebido um ultimato: “um ciclo longo de alta de juros não seria condizente com o momento econômico”. Para atender o desejo da chefe do Executivo, o presidente da autoridade monetária deu uma guinada no discurso. Em uma atitude nunca vista em véspera de reunião do Copom, divulgou nota, na terça-feira, em que avaliou como “significativas” as  projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) que apontam que a economia encolherá 3,5% em 2016 e ficará estagnada em 2017. Com isso, encontrou a justificativa para a manutenção da Selic em 14,25%.
Na avaliação do economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Newton Rosa, a imagem do BC perante ao mercado ficou arranhada. “O BC sinalizava que estava preocupado com a desancoragem das expectativas de inflação. Agora, o mercado fica com a pulga atrás da orelha para saber o que mudou da última semana até agora para a alteração do discurso”, afirmou. Ele comentou que deve revisar de 6,8% para 7% a previsão de alta do IPCA em 2016.
Para o economista-chefe do Banco Fibra, Cristiano Oliveira, a mudança no discurso do BC provocou ruídos desnecessários, apesar da a autoridade monetária ter argumentos técnicos para justificar a manutenção da Selic em 14,25%. Na opinião dele, a fraqueza da atividade econômica pode abrir espaço para que o BC inicie um ciclo de queda dos juros a partir do segundo semestre.

 

Crise externa
Oliveira ainda ressaltou que os desafios para a economia brasileira ficaram ainda maiores com a desaceleração global. Ele ressaltou que a queda nas bolsas europeias, norte-americanas e asiáticas não faziam parte do cenário dos economistas em todo o mundo. “Temos uma conjuntura internacional mais desafiadora. Talvez, o modo como BC escolheu para comunicar essa mudança tenha sido infeliz, mas o provável é que os juros caiam se o cenário for de queda de inflação”, destacou.