Correio braziliense, n. 19.236, 25/01/2016. Política, p. 3

Aposta na saída de Cunha

Semana que antecede o fim do recesso promete ser tensa. Enquanto Dilma revive o Conselhão para tentar salvar a economia, aliados voltam a atenção para processo de Cunha no STF e para a briga da liderança no PMDB

Por: LUIZ CARLOS AZEDO E PAULO DE TARSO LYRA

 

Mesmo com a ameaça do impeachment ainda no radar político — o Supremo Tribunal Federal retomará os trabalhos na primeira semana de fevereiro e deverá publicar o acórdão da decisão do plenário sobre o tema — a presidente Dilma Rousseff viverá nesta semana uma etapa decisiva para a retomada da confiança do mercado. Na próxima quinta-feira, será ressuscitado o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), batizado de Conselhão, reunindo empresários, banqueiros, sindicalistas, representantes de movimentos sociais e artistas.

Em processo de reaproximação tímido com a presidente Dilma, o vice-presidente Micher Temer não participará do Conselhão. Preocupado com a convenção nacional do PMDB, marcada para março, o vice-presidente prosseguirá com as viagens pelo país para tentar consolidar a própria manutenção na presidência da legenda. No dia do Conselhão, ele estará no Paraná e em Santa Catarina ao lado do presidente da Fundação Ulysses Guimarães, Moreira Franco.

Antes do Conselhão, Dilma estará no Equador, participando da reunião da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), um grupo criado pelo ex-presidente da Venezuela, Hugo Chávez, para funcionar como uma Organização dos Estados Americanos (OEA), sem a presença dos Estados Unidos e do Canadá e com a participação de Cuba. A criação da Parceria Transpacífica, liderada pelos Estados Unidos e Japão e que atrairá a adesão de Chile, Colômbia e Peru e a reaproximação diplomática de americanos e cubanos tende a diminuir o poder político do bloco.

No campo político, o Planalto aposta no afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), pelo Supremo Tribunal Federal (STF) — que deve ser apreciado a partir de 14 de fevereiro — para estabilizar a base no Congresso Nacional. A Corte retomará os trabalhos na semana anterior ao carnaval, com sessões plenárias na quarta e na quinta-feira, dias 3 e 4 de fevereiro. Há um pedido encaminhado ao STF pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao presidente do STF, Ricardo Lewandowski, propondo o afastamento. Entretanto, a partir da retomada dos trabalhos, em 1º de fevereiro, Cunha tem 10 dias úteis para apresentar a defesa.

Janot alega que a suspensão do peemedebista do Legislativo é necessária para garantir a ordem pública, a regularidade de procedimentos contra ele no STF e a normalidade das investigações no Conselho de Ética, onde Cunha é alvo de processo por quebra de decoro parlamentar. De acordo com o procurador-geral da República, Cunha pode vir a perder o mandato, por via judicial ou política, tanto por ele ser suspeito de ter cometido corrupção e lavagem de dinheiro no esquema de desvio de recursos da Petrobras, quanto por ter mantido dinheiro no exterior sem declarar à Receita Federal.

O presidente da Câmara rebate as alegações e acusa Janot de tentar mudar o foco do Congresso sobre a discussão do impeachment. Entretanto, sabe que não tem muito a fazer em relação ao pedido de afastamento, pois a decisão cabe ao Supremo. Por se tratar do presidente de um Poder, o ministro-relator da Operação Lava-Jato, Teori Zavascki, não pode resolver a questão na segunda turma, que se reunirá na terça-feira, 2 de fevereiro, a mesma que decidiu afastar e prender o ex-líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral (PT-MS). A matéria terá de ser votada em plenário, o que depende do presidente Ricardo Lewandowski.

 

Liderança

Eduardo Cunha também mantém outra queda de braços com o Palácio do Planalto na disputa pela liderança do PMDB na Casa. O governo pretende manter no cargo o líder da bancada do PMDB, Leonardo Picciani (PMDB-RJ), na eleição prevista para 17 de fevereiro — primeira semana após o carnaval. Para isso, desembarca na terça-feira em Brasília com o firme propósito de consolidar a candidatura do deputado Hugo Motta (PB), seu aliado. Na semana passada, a estratégia de Cunha para derrotar Picciani sofreu forte fricção. A intenção era lançar dois candidatos contra o atual líder de bancada, mas Leonardo Quintão (MG) retirou a candidatura.

O deputado mineiro, que chegou a assumir a liderança do PMDB em dezembro, mas foi deposto do cargo em uma ação articulada do Palácio do Planalto com o grupo do ex-governador fluminense Sérgio Cabral e o Presidente do SenadoRenan Calheiros(AL), saiu da disputa sentindo-se traído por Cunha, que agora tenta lamber as feridas causadas pela manobra. E a interferência do Palácio do Planalto na bancada vai além, pois a presidente Dilma acena com a nomeação do novo ministro da Aviação Civil para alguém indicado por Picciani, se o mesmo for reconduzido.

Nessa queda de braços, Cunha perdeu o apoio do maior aliado na cúpula do PMDB, o vice-presidente Michel Temer, com quem havia articulado a destituição de Picciani. Preocupado com os reflexos do enfrentamento na convenção nacional do PMDB, prevista para março, Temer assumiu posição de neutralidade em relação à liderança da bancada da Câmara, abriu negociações com o grupo de Renan Calheiros para compor a direção da legenda e se reaproximou formalmente da presidente Dilma Rousseff.

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