O Estado de São Paulo, n. 44.689, 24/02/2016 Política, p. A5

PF vê ‘proximidade’ em relação com presidente

Relatório mostra que publicitário atuava como intermediário entre aliados e Dilma Rousseff ao deixá-los enviar e-mails à petista de sua conta pessoal

Por: Ricardo Brandt / Mateus Coutinho / Fausto Macedo

 

Após analisar relatório referente a uma conta de e-mail do publicitário João Santana em 2015, a Polícia Federal chegou à conclusão de que o marqueteiro “possui relação de muita proximidade” com a presidente Dilma Rousseff e “certa influência sobre as ações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva”.

O documento não traz acusações e nem levanta suspeitas sobre os interlocutores de Santana - responsável pela campanha da reeleição de Lula à Presidência, em 2006, e das duas campanhas de Dilma, em 2010 e em 2014. Mostra como esses interlocutores se valiam de uma conta de e-mail do publicitário, com sua anuência, para tentar se comunicar com a presidente ou com o ex-presidente.

A peça, de 21 de janeiro, foi encartada pela PF nos autos da Operação Acarajé, deflagrada anteontem com ordem de prisão contra Santana, sua mulher, Monica Regina Cunha Moura, e outros investigados.

Um dos contatos é o ex-ministro de Assuntos Estratégicos Roberto Mangabeira Unger.

No dia 25 de outubro de 2015, Mangabeira mandou mensagem para Dilma, usando o endereço eletrônico do marqueteiro. “Senhora presidente. Renovo meu pedido de audiência - se for possível na segunda-feira, 9 de novembro, ou na terça-feira, 10 de novembro, quando estiver em Brasília desde as 7 da manhã daquela segunda-feira, vindo dos Estados Unidos. Ficarei, senhora presidente, triste e inconformado se não puder levar adiante a colaboração que a senhora me propôs. As dificuldades por que passam o país e o governo só reforçam o meu desejo de ajudá-la.”

O delegado Filipe Hille Pace, que subscreve o relatório, anotou: “A conclusão possível de ser tirada da simples leitura das mensagens trocadas é a de que Roberto Mangabeira Unger utiliza João Santana para repassar mensagens à Presidente da República. Além disso, pede, explicitamente, que o investigado (Santana) interceda junto à Presidente em seu favor, solicitando, inclusive, que João Santana empreenda esforços a fim de viabilizar um encontro pessoal entre Mangabeira e Dilma Rousseff.”

Em outro trecho, o relatório policial diz que “nas mensagens corrobora-se a conclusão já alcançada de que João Santana possui relação de muita proximidade com a Presidente da República, sendo indicado por ela, através de ministros e de assessores, para tratar de assuntos relevantes para o governo federal, dentre elas a CPMF e a Olimpíada de 2016”.

No dia 15 de novembro, Mangabeira envia recado para Lula, via e-mail de João Santana. O ex-ministro comenta sobre textos que publicou na imprensa e se queixa de não ter recebido atenção da presidente.

 

‘Curioso’. “Curioso é que Mangabeira, para encaminhar os textos ao ex-presidente, enviou-os para o e-mail de João Santana. A conclusão lógica é que o investigado (Santana) também possui relação extremamente próxima com Luiz Inácio Lula da Silva até os dias atuais. O mesmo tipo de relação é partilhado com a atual Presidente da República.”

_______________________________________________________________________________________________________

Cardozo faz defesa de Dilma e de Santana

Por: Vera Rosa

 

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, classificou ontem como “uma coisa estapafúrdia” a tentativa do PSDB e de setores dissidentes do PMDB de vincular os pagamentos sob investigação para o marqueteiro João Santana com a campanha de 2014 da presidente Dilma Rousseff.

“A campanha de Dilma pagou R$ 70 milhões para João Santana. É a maior contratação que temos. Por que quem paga R$ 70 milhões tem que pagar por fora alguma coisa como US$ 7,5 milhões? Não tem o menor sentido. É um verdadeiro nonsense, uma coisa estapafúrdia”, disse Cardozo.“Quem declarou R$ 70 milhões pode declarar R$ 80 milhões, R$ 85 milhões.

Porque então (o marqueteiro) teria de receber no caixa 2?”, questionou.

A Lava Jato, porém, não investiga apenas a suspeita de caixa 2. Ela apura se Santana recebeu no exterior recursos ilícitos desviados da Petrobrás.

“Todo mundo sabe que o que está em discussão no TSE são as finanças da campanha da presidente Dilma. Se o partido A, B, C ou D recebeu alguma coisa, isso não se comunica com as campanhas. Seria a mesma coisa que eu tivesse de cassar o mandato de todos os eleitos de um partido por uma situação de um desvio qualquer, que, no caso, não está nem provado”, afirmou Cardozo.

Questionado se estaria acusando o próprio PT, o ministro reagiu e disse que “de forma nenhuma”.