O globo, n. 30.148, 21/02/2016. País, p. 8

PT vai pedir para Delcídio deixar comissão do Senado

Preocupados com constrangimento, aliados e até oposicionistas sugerem licença para tratamento psicológico

Um dia após deixar a prisão, o senador Delcídio Amaral (PT-MS) sinalizou aos colegas que pretende retomar o lugar no Senado “de cabeça erguida” e que não aceitará ter seu mandato cassado no Conselho de Ética. Correligionários do senador no PT defendem, porém, que ele foque apenas em sua defesa, abra mão de qualquer protagonismo e renuncie à presidência da Comissão de Assuntos Econômicos ( CAE). Lideranças de partidos da base e da oposição avaliam que o clima para a permanência de Delcídio no Senado é ruim e defendem que ele tire uma licença para evitar ser cassado.

AILTON DE FREITAS/30-4-2015Retorno. Delcídio sinalizou aos colegas que deseja voltar de “cabeça erguida”

Delcídio avisou interlocutores de que pretende fazer um corpo a corpo com os senadores para defender seu mandato e evitar perder o foro privilegiado, o que acarretaria a transferência de seu processo do Supremo Tribunal Federal (STF) para a Justiça Federal do Paraná, a exemplo dos investigados comuns da Lava-Jato.

Alguns senadores disseram ter interpretado recados de Delcídio como uma pressão para que não cassem seu mandato. Segundo relatos, o petista teria dito a interlocutores ter muitas informações sobre as operações na Petrobras, o que foi visto como um aviso de que pode decidir falar e comprometer colegas caso fique isolado.

A volta do senador está provocando constrangimento, especialmente no PT. A primeira questão que deverá ser definida de imediato é sobre a presidência da CAE, que está vaga desde que Delcídio foi preso. O PT pretende, esta semana, apresentar um pedido de substituição de Delcídio pela senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), que já foi assinado por mais da metade da bancada. Para petistas, Delcídio deve retornar de forma “discreta e serena” e agir com parcimônia no caso da CAE.

— O que pode causar um constrangimento grande é ele querer assumir a presidência da CAE. Seria terrível para o PT, para o governo e para o Senado, que teria como presidente de uma das comissões mais importantes um preso. O PT não vai retirar o requeri-

mento que indicou Gleisi e espera-se que ele renuncie à presidência da comissão — afirma um petista.

Uma reunião na bancada do PT está prevista para o início desta semana. A tendência é que os senadores petistas defendam que Delcídio tenha como foco exclusivo na volta ao Senado a sua defesa. Na ocasião, os colegas tentarão convencê-lo a abrir mão do cargo na CAE.

— O Delcídio passou por todo esse drama e a prioridade dele é fazer sua defesa, dentro e fora do Senado. Certamente é isso que ele vai fazer. Vamos ter uma reunião do PT para ver o que será feito sobre a CAE e toda essa situação — afirma o senador Jorge Viana (PT-AC).

O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), telefonou na sexta-feira para Delcídio para cumprimentá-lo pela decisão do Supremo. Segundo relatos, o tom da conversa foi apenas protocolar, e Delcídio agradeceu pela ligação, afirmando que estará de volta ao Senado na segunda-feira. O senador disse que pretende entregar pessoalmente sua defesa ao Conselho de Ética, na sessão que está marcada para quarta-feira. Delcídio não deu sinais de que pretende se licenciar do mandato, como defendem alguns senadores.

— O clima para Delcídio no Senado ficou muito complicado. Depois de tudo o que passou, ele deveria tirar uma licença de 120 dias para fazer um tratamento psicológico e não perderia o mandato. Mas isso é uma decisão que cabe exclusivamente a ele e ao PT — afirma o líder do PMDB, senador Eunício Oliveira (CE).

Na oposição, o cenário também é de constrangimento com a volta de Delcídio. Tucanos defendem que o Conselho de Ética seja célere em apreciar o processo contra o senador, mas dizem não ter posição definida sobre o tema até que ele apresente sua defesa. A licença do mandato também é defendida pela oposição.

— Acho que é justificável que alguém que foi submetido a tudo o que ele passou saia do exercício do mandato para ter assistência psicológica e continuar amparado no regimento. A rigor, Delcídio ainda está preso, foi só o regime que mudou. É muito constrangedor ter uma situação dessas indefinida. Como o país vai enxergar essa circunstância de ter um senador que está preso e deve ficar trancado em casa à noite? O pior para Delcídio e para o Senado é a demora em se decidir essa questão. Precisa haver agilidade no Conselho de Ética para julgá-lo — afirma o líder do PSDB, senador Cássio Cunha Lima (PB).