Combate ao zika no radar do planalto

Naira Trindade

Com o fim do carnaval, a preocupação com os avanços de contágio do vírus zika pelo país volta ao foco da agenda do Palácio do Planalto. Ministros da coordenação política se encontram hoje com a presidente Dilma Rousseff para traçar as próximas estratégias de combate ao Aedes aegypti, o mosquito da dengue, chikungunya e zika. Duas reuniões são esperadas no Palácio. A primeira, pela manhã, com ministros da coordenação para tratar sobre os rumos da vacina e a segunda, com a presidente, para definir como será o ataque ao transmissor da doença. Estudo publicado ontem reforçou que um terço dos bebês com microcefalia sofre anomalias visuais.

Apesar das consequências, o ministro da Saúde, Marcelo Castro, se posicionou contrário ao aborto de mulheres grávidas infectadas pelo zika. “A posição do Ministério da Saúde é inequívoca. É a posição em defesa da lei. Somos agentes públicos e não podemos ter outra defesa que não seja a defesa estrita da lei. A legislação brasileira só permite aborto em três situações, que não incluem essa daí (microcefalia)”, afirmou em entrevista ao vivo à TV Cidade Verde, afiliada do SBT no Piauí. Castro lembrou que a legislação brasileira permite aborto apenas para gravidez resultante de estupro, quando há risco de morte para a mãe e de fetos com anencefalia.

A declaração do ministro bate de frente com o pedido da Organização das Nações Unidas (ONU), que, na semana passada, fez um apelo pela liberação do aborto para casos de microcefalia. Também contrária à interrupção da vida, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) pretende envolver a campanha da fraternidade ecumênica de 2016 que tem o lema “Casa comum, nossa responsabilidade” no combate ao Aedes aegypti. Porém, a entidade vai esbarrar num impasse econômico. Em crise, o governo federal deve reduzir investimentos da área de saneamento deste ano. De acordo com dados do Siga Brasil, em 2015, o Planalto empenhou R$ 1,093 bilhão. A dotação orçamentária anual era de R$ 2,7 bilhões.

Para 2016, a dotação inicial prevista pela Lei Orçamentária Anual (LOA) é de R$ 636,1 milhões — 41% menor que o utilizado no ano anterior. Sem vacina para conter os avanços da doença no organismo das pessoas, a presidente Dilma tem se empenhado em tentar impedir que o mosquito nasça. No fim de semana, Dilma lidera o “sábado da faxina”, campanha que pretende mobilizar todos os órgãos públicos de todos os estados a fazerem uma limpeza geral nas ruas.

A ideia é que a presidente visite algumas casas e converse com moradores sobre as medidas que devem ser tomadas para eliminar os focos de proliferação do mosquito. Cada ministro deverá escolher um estado e fazer corpo a corpo nas ruas. Como existe maior preocupação com o estado do Rio de Janeiro, por ser a sede das Olimpíadas, a presidente deve visitar residências no Rio. Um estudo publicado ontem pela Capital economics observa que o “maior impacto que o Brasil deve sofrer (com a infecção do zika) é no turismo”.

Recomendação

Na última sexta-feira, pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz informaram que isolaram o vírus zika ativo na saliva e na urina. A notícia soou como um alerta aos foliões durante o carnaval, apesar de ainda não ser possível informar se a transmissão da doença se dá por esses fluidos. A instituição recomendou que grávidas aumentem os cuidados e sugeriu que pessoas infectadas não beijem e não compartilhem objetos, como talheres e copos.

Marcelo Castro e o ministro de Ciência e Tecnologia, Celso Pansera, desenvolveram, em conjunto, um projeto para ser apresentado a Dilma na reunião de hoje com uma série de medidas relacionadas ao surto da doença. Em reuniões passadas, ficou definido que o governo vai fornecer o pagamento do Benefício de Prestação Continuada (equivalente a um salário mínimo) às famílias que tiverem crianças diagnosticadas com microcefalia; a distribuição de repelentes para grávidas que recebem o Bolsa Família (cerca de 400 mil mulheres); e a atuação de militares das Forças Armadas no próximo sábado.

O comunicado à mobilização saiu da Casa Civil na quinta-feira da semana passada para todos os ministros, secretários executivos das pastas e presidentes de empresas públicas autarquias e fundações federais. Assinada pelo titular da Casa Civil, Jaques Wagner, o ofício convoca todos a participarem do mutirão. Serão 220 mil militares das Forças Armadas em 356 municípios do país para tentar erradicar os criadouros do Aedes aegypti, responsável por transmitir o zika. A expectativa é visitar 3 milhões de residências só no sábado.

Pedaladas no carnaval

Debaixo de uma fina garoa e com o dia ainda escuro, a presidente Dilma Rousseff aproveitou a terça-feira de carnaval para se exercitar. Ela saiu do Palácio da Alvorada pontualmente às 6h30 e pedalou por quase uma hora. Acompanhada do personal trainer e do secretário de Segurança da Presidência da República, general Marcos Antônio Amaro dos Santos, ela fez um longo trajeto, que passou em frente ao Palácio do Jaburu, residência do vice-presidente, foi até a ciclovia do Centro Cultural Banco do Brasil e, no retorno, percorreu também a Vila Planalto. Com capacete, óculos e luvas, equipamentos de segurança dos quais não abre mão, a presidente estava bem-humorada e distribuiu cumprimentos.

 

Correio braziliense, n. 19252, 10/02/2016. Política, p. 2