O globo, n. 30.147, 20/02/2016.Opinião, p. 17

Sanear para sobreviver

Nenhuma civilização pode sobreviver em ambiente arruinado

É mais que oportuna a campanha da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil ( CNBB), cujo slogan é “Casa comum, nossa responsabilidade”. Lembra que o saneamento básico é uma necessidade civilizacional e que nele está em jogo o equilíbrio do ambiente em que vivemos. Na encíclica “Laudato Si”, o Papa Francisco trata da questão ambiental em sua amplitude e complexidade. Uma mobilização geral de todas as forças contra a destruição da natureza é necessária. O bom uso dos recursos naturais só é possível quando as pessoas entendem e aplicam as regras e práticas para conservá- los e administrá- los.

A educação é indispensável, mas a dificuldade é que os processos educacionais são por demais vagarosos para competir com a má utilização acelerada da água e da terra. A escolha desse tema é oportuna porque remete à intolerável incapacidade de o governo cumprir suas obrigações mínimas em relação às condições de vida dos brasileiros. Campanhas em âmbito nacional pela conservação devem ser iniciadas a fim de despertar as pessoas para uma consciência de que o homem é tão dependente da natureza quanto uma criança ainda por nascer é de sua mãe. De que ele é parte de uma biocomunidade e, embora seja o seu membro dominante, em uma perspectiva a longo prazo, não é o seu chefe, pois a natureza possui forças que o homem não pode anular. E nossos desmandos? Mais da metade dos brasileiros não tem acesso às redes coletoras de esgoto. Apenas 39% do esgoto do país são tratados, enquanto na média das cem maiores cidades brasileiras não chega a 41%, segundo levantamento do Instituto Trata Brasil, especializado no assunto. Somente dez das grandes cidades conseguem tratar mais de 80% do seu esgoto. Pesquisadores localizaram o vírus zika em cérebro de bebês, e já são milhares de brasileiros contaminados com o Aedes aegypti.

Essa campanha, introduzindo a filosofia e a prática dos cuidados e da conservação da natureza, deve ser coordenada com esforços oficiais e educacionais em todos os níveis. A conservação da natureza em um sentido moderno é a sábia utilização dos recursos naturais renováveis. Isso significa que o homem deveria tentar alcançar um equilíbrio biológico entre suas necessidades e a capacidade a longo prazo da natureza de satisfazê- las. “Recursos naturais renováveis” incluem ar, água, solos, plantas e animais. Estes são os recursos essenciais à sobrevivência do homem. O fator crucial ao se buscar a conservação da natureza está em entender a função do ecossistema, da paisagem viva e do inter- relacionamento entre organismos vivos e o meio ambiente. Nenhuma civilização pode sobreviver em um ambiente arruinado. A história tem ensinado muitas vezes essa lição. Isto será repetido no futuro, a menos que o capital roubado à natureza seja restituído de modo que ela produza novamente seus dividendos anteriores. Esta é uma tarefa enorme, mas fundamental, porque nenhuma outra civilização anterior à nossa levou tão longe a destruição dos recursos naturais. Carlos Alberto Rabaça é sociólogo e professor