O globo, n. 30143, 16/02/2016. País, p. 5

Manobra ajuda defesa de Cunha no Conselho de Ética

Troca feita pelo PTB aumenta grupo que apoia presidente da Câmara
Por: Evandro Éboli/ Eduardo Bresciani
 
 
EVANDRO ÉBOLI E EDUARDO BRESCIANI
opais@oglobo.com.br
 
- BRASÍLIA- O PTB da Câmara fez uma substituição no Conselho de Ética que deve beneficiar o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), no processo a que ele responde no colegiado e que pode levar à cassação de seu mandato. Os trabalhistas substituíram Arnaldo Faria de Sá ( SP), que era titular do conselho, por Nilton Capixaba ( RO). Faria de Sá foi um dos onze parlamentares que votou pela continuidade do processo contra Cunha, numa apertada votação de 11 a 9. A sua saída foi uma manobra do líder do PTB, Jovair Arantes ( GO), um dos principais aliados de Cunha. Capixaba é tido como voto pró- Cunha.

Capixaba é réu em dois processos no Supremo Tribunal Federal ( STF) relativos à Operação Sanguessuga, da Polícia Federal, que investigou fraude na compra de ambulâncias. Ele responde por crime contra a lei de licitações, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

O conselho deve fazer hoje sua primeira reunião de 2016 e já retomará o caso de Cunha. O relator do processo contra o peemedebista, Marcos Rogério ( PDT- RO), vai reler seu parecer a favor da continuidade da ação contra Cunha, paralisada após decisão do vice- presidente da Câmara, Waldir Maranhão ( PP- MA), que anulou decisões do colegiado e atrasou a tramitação do caso.

A mudança feita pelo PTB pode alterar a composição de forças no conselho, onde a votação é apertada, o que pode favorecer Cunha. Se o presidente da Câmara obtiver mais um voto — de um suplente que vote na ausência de um titular, por exemplo —, poderá obter onze apoios e reverter um quadro que não lhe é favorável. Cunha negou qualquer influência na decisão do PTB.

— Isso é problema interno do PTB. Não tenho nenhuma interferência nisso. E já tinha ocorrido na semana passada — disse Cunha, em mensagem de texto ao GLOBO.

 

LÍDER DO PTB NEGA FAVORECIMENTO

Arantes negou que a troca de titular de seu partido no conselho seja para beneficiar Cunha. Disse que Faria de Sá lhe pediu para sair, por estar interessado em assumir uma vaga na Comissão de Seguridade da Casa.

— Não tem nada a ver com votar contra ou a favor de Cunha. Os deputados do PTB têm plena autonomia. Ele ( Faria de Sá) foi quem me comunicou que irá deixar o conselho para ir para a Comissão de Seguridade Social, um antigo sonho seu. E, assim, no conselho é um ou outro. São muitos deputados para poucas vagas. O tatu é muito e o buraco é pouco — disse Arantes.

Faria de Sá, no entanto, disse que deixou o conselho por determinação de Arantes.

— O líder do meu partido pediu a vaga. Não vou ficar brigando com ele por causa de uma vaga. A vaga é do partido, e não vou criar caso — disse Faria de Sá ao G1.

Um deputado do colegiado só pode sair por decisão própria. O nome de Capixaba já consta da relação oficial da composição do Conselho de Ética. Um eventual empate em 10 a 10 na votação, levará o presidente do colegiado, José Carlos Araújo ( PSD- BA), a dar seu voto. E ele já se manifestou a favor da continuidade do caso.

 

LIGAÇÃO COM SANGUESSUGAS

Segundo a denúncia do Ministério Público Federal na Operação Sanguessugas, um grupo de parlamentares, do qual Capixaba fazia parte, viabilizava a aprovação das emendas. Também intercedia nas prefeituras para direcionar as licitações, fazendo com que empresas do grupo chefiado pelos empresários Luiz Antônio Vedoin e Darci Vedoin, donos da Planam, vencessem as disputas. Os parlamentares recebiam propina para participar do esquema.

A defesa do parlamentar alegou, nos autos de um dos processos, que ele não teve relação com a licitação e que o fato de o deputado ter apresentado emenda em favor do município não significa que ele participou dos desvios. O GLOBO fez contato com Capixaba, mas não obteve retorno.

O líder do PSOL na Câmara, Chico Alencar ( RJ), cujo partido é autor da representação contra Cunha, lamentou a troca feita pelo PTB. Disse que se trata de mais uma manobra do presidente da Câmara para protelar seu processo.

— Lamento que o Arnaldo ( Faria de Sá) tenha renunciado. Poderia ter resistido. A decisão é dele, e não do partido. Agora, a ação de Cunha no Conselho de Ética não tem limite. O conselho está sob intervenção, o que é muito ruim. Essa mudança do PTB altera substancialmente a relação de forças. Agora, está pau a pau — disse Alencar.

 

TEORI REVOGA SIGILO DE PROCESSO

Denunciado no STF por suspeita de recebimento de US$ 5 milhões de propina do esquema de desvios da Petrobras, Cunha decidiu em sua defesa atribuir ao PT a influência no esquema. O documento que responde à denúncia da Procuradoria Geral da República, assinado por seis advogados, diz que a denúncia protocolada no STF ignorou uma suposta sociedade entre o lobista Júlio Camargo ( um dos delatores que acusa Cunha) e o ex- ministro da Casa Civil José Dirceu. Segundo a defesa de Cunha, o ex- diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró foi indicação do PT, e não do PMDB.

Ontem, o ministro Teori Zavascki, relator da Lava- Jato no STF, revogou o sigilo de um dos inquéritos que investiga Cunha. O caso apura se o parlamentar recebeu propina no valor de US$ 5 milhões para permitir a contratação de navios- sonda pela Petrobras. Nesse inquérito, Cunha já foi denunciado pela Procuradoria Geral da República. O relator espera que a denúncia seja julgada no plenário da Corte ainda este mês. Se o tribunal aceitar a denúncia, Cunha se tornará réu.

 

O líder do meu partido pediu a vaga. Não vou ficar brigando com ele por causa da vaga. A vaga é do partido”
Arnaldo Faria de Sá ( PTB- SP)

Deputado que deixou o Conselho de Ética

    Órgãos relacionados:

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    Dilma diz que não há mais onde cortar

    Presidente afirma que fará emenda criando alíquota de 0,18% da CPMF para estados
    Por: Simone Iglesias/ Catarina Alencastro/ Eduardo Barreto/ Danilo Fariello/ Júnia Gama/ Letícia Fernandes/ Maria Lima
     

    A presidente Dilma Rousseff retomou ontem sua ofensiva pela aprovação da nova CPMF. À noite, em reunião com senadores da base aliada, ela fez um apelo para que eles ajudem na aprovação de matérias que aumentem o caixa do governo. O objetivo é manter um nível mínimo de investimento em programas de infraestrutura e social.

    — O governo precisa estancar os gastos, mas não tem mais onde cortar. Vamos continuar perseguindo o corte de despesas e buscar fontes de receita. E a única fonte nova de receita hoje é a CPMF. Se não aprovar a CPMF vamos ter que buscar outras fontes com o aumento de carga já existente — disse Dilma, na reunião.

    A presidente também disse que o governo fará uma emenda para destinar um percentual do imposto ( 0,18%) a estados e municípios. Segundo senadores, ela afirmou que aguarda apenas a formalização do pedido de prefeitos e governadores para fazer a emenda.

     

    ALÍQUOTA DEVE SER DE 0,38%

    Com isso, o total da alíquota da CPMF deve chegar a 0,38%. Dilma afirmou, na reunião, que assumiu um compromisso com estados e municípios sobre a repartição da CPMF. A divisão ficaria em 0,20% para o governo federal e 0,18% para os outros entes federativos.

    — A presidente falou que a CPMF é uma prioridade, porque o Brasil precisa de recursos. Não há mais espaços para cortar, então precisa haver uma fonte nova. Foi falado da necessidade de envolver mais os prefeitos nessa discussão. Com a emenda que o governo vai mandar, eles vão ter parcela significativa ( do imposto) — disse a senadora Vanessa Graziontin (PCdoB- AM).

    Participaram da reunião os ministros Barbosa e Berzoini e senadores de partidos aliados, como Humberto Costa ( PTPE), José Pimentel ( PT- CE), Acir Gurgacz ( PDT- RO), Benedito de Lira ( PP- AL), Eunício Oliveira ( PMDB- CE), Wellington Fagundes ( PR- MT), Paulo Rocha ( PT- PA).

    À tarde, Dilma reuniu a coordenação política do governo com a participação de ministros dos partidos da base aliada.

    Em crise fiscal, o governo não tem alternativa extra de arrecadação, e por isso, disse um auxiliar próximo à presidente, precisa convencer a base aliada, bastante resistente à CPMF, e conversar com a oposição sobre o tema. Para suavizar a proposta, o Ministério da Fazenda vem sinalizando com a redução gradual da alíquota ano a ano.

    Além da CPMF, Dilma pediu aos ministros que conversem com seus partidos sobre a reforma da Previdência, cujo projeto- base deverá ser apresentado pelo fórum criado pelo governo amanhã.

    O governo também quer que seja agilizada na Câmara a votação da Lei do Antiterrorismo, aprovada em novembro passado pelo Senado. Como houve alterações, ela voltou à Câmara. A vontade do Executivo, porém, esbarra no presidente da Casa, Eduardo Cunha ( PMDBRJ), que está paralisando os trabalhos legislativos até que o Supremo Tribunal Federal ( STF) responda sobre o rito do impeachment que deve ser seguido pelo Legislativo.

    Dilma e seus ministros avaliaram como um sucesso a mobilização nacional contra o vírus zika, no último sábado. Eduardo Braga, um dos ministros que participou da reunião, disse que o clima político melhorou desde o ano passado.

    — Não estamos vivendo, neste momento, uma crise política. Tivemos momentos bastante estressantes no ano passado, mas agora é um momento de diálogo, de busca de entendimento — afirmou.

    Dando seguimento à estratégia de tentar se aproximar do Congresso, inaugurada este ano com ida inédita ao Parlamento para abrir o ano legislativo, Dilma deve fazer hoje reunião com os líderes na Câmara. A avaliação de auxiliares da presidente é que ela deve se aproximar dos líderes de cada partido da base e participar da retomada das discussões de matérias nas duas casas. ( Simone Iglesias, Catarina Alencastro, Eduardo Barreto, Danilo Fariello, Júnia Gama, Letícia Fernandes e Maria Lima).

     

    PRIORIDADES DE DILMA
     

    CPMF. A recriação da contribuição foi enviada ao Congresso em setembro de 2015 pelo governo e está parada na CCJ da Câmara.

    LEI ANTITERRORISMO. Tipifica esse crime. Foi aprovada com mudanças no Senado e voltou à Câmara, onde está parada.

    MP 694. Tributa os juros de capital. Está parada na comissão especial do Congresso e perde a validade em 8 de março.

    MP 695. Autoriza bancos estatais a comprarem participação em outras instituições financeiras públicas ou privadas.

    MP 696. Trata de corte de ministérios e redução de gastos de custeio.

    Senadores relacionados:

    Órgãos relacionados: