Valor econômico, v. 16, n. 3973, 30/03/2016. Política, p. A12

Manobra pode mudar composição do Conselho de Ética

Por Raphael Di Cunto e Thiago Resende | De Brasília

 

Líderes do PT e da oposição acusaram ontem o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de tentar alterar o regimento interno da Casa para mudar a composição do Conselho de Ética e salvar seu mandato. O projeto de resolução que promove a redistribuição das vagas foi aprovado pela manhã em reunião da mesa diretora - presidida pelo pemedebista - e será votado em plenário hoje.

A proposta altera imediatamente a distribuição de vagas de todos os órgãos da Casa compostos com fundamento no princípio da proporcionalidade partidária, "interrompendo-se, quando for o caso, os mandatos que se achem em curso". Parlamentares contrários ao pemedebista dizem que isso inclui o Conselho de Ética e talvez até a comissão do impeachment.

O líder do Rede na Câmara, Alessandro Molon (RJ) classificou o projeto como gravíssimo e ameaçou ingressar com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir a aplicação e reforçar o pedidopara que Cunha seja afastado do cargo. "Se isso for aprovado mostra, mais uma vez, que o poder dele tem impedido o regular funcionamento do Conselho de Ética", disse.

O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) afirmou que o projeto acertado inicialmente pelos líderes não incluia o parágrafo que prevê a troca inclusive dos cargos com mandatos em curso. O líder do PT, Afonso Florence (BA),criticou a proposta, dizendo que é "mais uma manobra golpista" de Cunha, e a oposição avisou que não votaria favoravelmente.

Para Molon, a mudança afetará três integrantes do conselho que votam contra Cunha e que mudaram de partido: o presidente do colegiado, José Carlos Araújo (BA), que trocou o PSD pelo PR; o relator da representação contra Cunha, Marcos Rogério (RO), que mudou do PDT para o DEM; e o ex-relator do processo contra o pemedebista, Fausto Pinato (SP), que saiu do PRB para ingressar no PP. Se mudar a composição do colegiado, Araújo perderia sua vaga.

Cunha afirmou entender que as mudanças não valeriam para o conselho, que tem regimento próprio, e que apenas os deputados da Mesa Diretora da Câmara e da comissão do impeachment que mudaram de partido perderão os cargos. "Quem quer politizar o processo, que politize. [...] Têm alguns que gostam e tentar desviar a discussão", disse.

O pemedebista, contudo, não quis concordar ontem em plenário com a aprovação de emenda para deixar explícito que a mudança não valeria para o Conselho de Ética e respondeu que isso deveria ser proposto quando o projeto de resolução fosse votado em plenário. A ideia inicial era aprovar ontem, mas, diante das acusações, aliados de Cunha aconselharam a adiar para hoje.

O projeto visa, oficialmente, alterar o número de vagas de cada partido nas comissões temáticas após o troca-troca que ocorreu com a janela de 30 dias para que deputados mudassem de legenda sem perderem seus mandatos. Mais de 80 parlamentares trocaram de partidos, três siglas deixaram de ter representação, e, por isso, é discutida uma redistribuição das cadeiras.

Haveria, ainda, redistribuição de vagas, com o bloco do PMDB (que vota com Cunha) ganhando mais uma (destinada ao PTN) e o do PT (que faz oposição ao pemedebista), perdendo. Depois de várias manobras regimentais que arrastaram análise de admissibilidade que demoraria 10 dias por cinco meses, a abertura do processo contra Cunha por suposta omissão de patrimônio e mentir à CPI da Petrobras sobre possuir contas no exterior foi aberta por 11 votos a 10.

O projeto também promove outra mudança que poderá favorecer o pemedebista, embora tenha reflexo em várias outras votações - como na comissão do impeachment. Pela proposta, o suplente que terá prioridade para votar será o do mesmo partido do titular ausente. Hoje vale o voto de quem registrar presença primeiro dentro dos suplentes do bloco, mesmo que de outra legenda. Essa regra obrigou o PR a trocar seu titular no dia daabertura da representação contra Cunha para que o suplente, do PT, não votasse.