Estado de São Paulo, n. 44.670, 17/05/2016. Política, p. A4

Compra de sítio em Atibaia foi lavrada em escritório do comprade de Lula

Relações. Roberto Teixeira, que emprestou casa para ex-presidente morar e o ajudou na compra de seu duplex em São Bernardo do Campo, participou do negócio da propriedade investigada pela Lava Jato; suspeita é de que empreiteiras tenham pago reforma do local

Por: Ricardo Galhardo / Guilherme Mazieiro

 

A compra do sítio usado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Atibaia (SP) foi formalizada no escritório do advogado e empresário Roberto Teixeira, compadre do petista, no bairro dos Jardins, em São Paulo.  O imóvel custou R$ 1,5 milhão, em outubro de 2010, dos quais R$ 100 mil (R$ 143 mil em valores atuais) foram pagos em dinheiro em espécie.

As informações constam das escrituras de compra e venda das duas áreas que compõem o imóvel de 173 mil m², investigado pela Operação Lava Jato sob suspeita de ter sido reformado a mando de empreiteiras que tiveram ex-executivos condenados na Justiça por envolvimento no esquema de desvios e de propinas da Petrobras.

Segundo o documento, Fernando Bittar, filho do ex-prefeito de Campinas (SP) Jacó Bittar, amigo de Lula, pagou R$ 500 mil por uma parte do sítio e Jonas Suassuna, primo do ex-senador Ney Suassuna, arcou com R$ 1 milhão. Ambos são sócios de Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, filho de Lula.

Dos R$ 500 mil pagos por Bittar, R$ 100 mil foram “recebidos em boa e corrente moeda nacional”. O restante foi pago em dois cheques do Banco do Brasil. O negócio foi formalizado no dia 29 de outubro de 2010, dois dias antes da eleição da presidente Dilma Rousseff, no 19.º andar de um prédio de escritórios na Rua Padre João Manoel, nos Jardins. O endereço é o do escritório de Teixeira.

Teixeira é amigo de Lula desde os anos 1980 e padrinho de Luís Cláudio, caçula de Lula. Durante anos o ex-presidente morou em uma casa pertencente ao empresário em São Bernardo. Teixeira também intermediou a compra da cobertura duplex onde Lula mora atualmente em São Bernardo do Campo e é proprietário do apartamento, onde vive Luís Cláudio.

Conforme revelou o Estado, o agrimensor Cláudio Benatti disse ter sido contratado por Teixeira em 18 de dezembro de 2010 para começar os serviços no sítio em 20 de janeiro de 2011, em caráter de urgência no sítio. Lula deixou o Planalto naquele mês e parte da sua mudança foi levada para o sítio. Benatti deve prestar depoimento na semana que vem à Lava Jato.

 

Gaveta. Conforme os documentos do sítio, a compra havia sido fechada pelo menos dois meses antes, no dia 5 de agosto de 2010, por meio de um Instrumento Particular de Compra e Venda firmado entre os compradores e o antigo dono, Adalton Santarelli, um comerciante de São Paulo.

O sítio usado por Lula e sua família em Atibaia é alvo de investigação da Operação Lava Jato. Segundo relatos de comerciantes locais e prestadores de serviço, parte da reforma foi bancada pelas empreiteiras OAS e Odebrecht, ambas investigadas pela Lava Jato.

A chegada da Lava Jato mudou a rotina do bairro do Portão, em Atibaia, limite entre a cidade e a área rural onde fica o sítio usado pelo ex-presidente. Vizinhos e comerciantes da região têm sido questionados pelos procuradores do Ministério Público Federal sobre a frequência das visitas, rotina e companhias do petista no local.

No depósito Dias, que forneceu parte do material para a reforma do imóvel, em 2011, os procuradores realizaram duas buscas de documentos e notas fiscais da época. O atual dono, Nestor Neto, que assumiu a loja em 2014, afirmou que o objetivo era encontrar provas e buscar novas informações. Há suspeita de que a Odebrecht pagou parte da conta. “Os procuradores analisaram algumas documentações antigas, como notas e comprovantes, que ainda estavam na loja. Acessaram salas que estavam fechadas pelo dono do prédio e eu não tinha mais acesso”, disse Neto. Duas atendentes da padaria Iannuzzi, que fica no acesso ao sítio, dizem que a ex-primeira-dama Marisa Letícia comprava no local.

 

Solicitação

O empresário Fernando Bittar não respondeu ao pedido de entrevista feito pelo Estado, assim como Jonas Suassuna. Em ocasiões anteriores, ambos negaram irregularidades no negócio.

 

HISTÓRICO

Negócio

A compra do sítio foi formalizada no escritório de Roberto Teixeira ao custo de R$ 1,5 mi em 2010.

 

Agrimensor

Claudio Benatti, que fez as medições do sítio, afirmou que Teixeira ordenava os serviços no local.

 

Reforma

Lava Jato apura se empreiteiras reformaram sítio a pedido de Lula em troca de contratos do governo.

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Teixeira diz que deu assessoria jurídica ao negócio

Por: Ricardo Galhardo

 

O advogado e empresário Roberto Teixeira disse, por meio de sua assessoria, que a escritura do sítio usado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Atibaia (SP) foi lavrada em seu escritório porque Fernando Bittar e Jonas Suassuna são clientes antigos do escritório.

“Ambos já eram nossos clientes”, disse ele por e-mail. Teixeira contradiz a escritura ao falar sobre os R$ 100 mil pagos em espécie. Segundo ele, o valor foi pago com o cheque administrativo 218 do Banco do Brasil. “A compra foi paga mediante cheques administrativos pelo valor total da venda, identificados na escritura”, afirmou Teixeira.

A escritura deixa claro que Suassuna pagou R$ 1 milhão em cheque e Bittar quitou R$ 400 mil também em cheque e R$ 100 mil “em boa moeda corrente”. / R.G.

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Empresário é anfritrião na casa de Angra

Jonas Suassuna, sócio de Lulinha no sítio, já recebeu o ex-presidente na Ilha dos Macacos

Por: Luciana Nunes Leal / Alfredo Mergulhão

 

Um dos donos do sítio frequentado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Atibaia (SP), o empresário Jonas Leite Suassuna Filho é conhecido na alta sociedade da Barra da Tijuca, bairro onde mora na zona oeste do Rio, pelo gosto por vinhos, charutos cubanos, fina gastronomia e obras de arte. Em junho de 2013, a festa de casamento dele com Claudia Bueri, também empresária, foi reservada a 70 convidados e tema de colunas sociais, que registraram a cerimônia realizada no sofisticado duplex do casal no Condomínio Península.

Amigos de muitos anos sabem do gosto do casal pela casa na Ilha dos Macacos, em Angra dos Reis (sul fluminense), mas não sabiam da propriedade no interior paulista. A ligação com o ex-presidente e com um dos filhos do petista, Fábio Luís, o Lulinha, também não é muito comentada por Jonas, segundo amigos.

“Já fui convidada algumas vezes para a casa de Angra, mas não conheço. Não sabia que ele tinha esse sítio. Se ele emprestou ao presidente Lula, não há por que recriminá-lo”, diz a socialite Vera Loyola, símbolo da “sociedade emergente” da Barra da Tijuca, amiga do empresário há 20 anos.

Suassuna é dono, em sociedade com os filhos, Bianca e Caio, do Grupo Gol, conglomerado que reúne editora e empresas de tecnologia da informação e criação de aplicativos, como o “Bíblia no celular”, com trechos do livro sagrado na voz de Cid Moreira.

Durante alguns anos, o Grupo Gol pagou o apartamento onde Lulinha morava, nos Jardins, em São Paulo. Agora, Lulinha mora em apartamento em Moema, de propriedade do empresário. Lulinha e Suassuna são sócios na empresa Gamecorp.

Outro amigo que já tinha ouvido falar muitas vezes da casa de Angra dos Reis, mas desconhecia a existência do sítio em Atibaia, é o empresário Eder Meneghine, produtor de festas badaladas na Barra.  Foi dele a produção do casamento de Suassuna e Claudia. “Soube do sítio em Atibaia quando li nos jornais. Jonas sempre foi uma pessoa maravilhosa. Poucos clientes nos pagam antecipado, à vista. Jonas é um deles”, comenta o produtor.

 

Ilha. As paredes da fachada em vidro verde, de frente para o mar, cercadas por palmeiras e com a Mata Atlântica ao fundo, chamam a atenção de quem navega ao largo da Ilha dos Macacos, vizinha à turística Ilha Grande, joia do litoral do Estado do Rio.  A história que se conta na Ilha Grande, sem comprovação documental e sem testemunhas que o tenham visto, é de que a casa pertenceria ao ex-presidente. “A gente passa aqui com turistas e mostra essa casa como se fosse do Lula. Eu não tenho certeza, mas o comentário é esse”, afirma o condutor de táxi boat Bruno Moreira, de 32 anos.

Odileia Generoso, de 63 anos, moradora de uma das outras três casas da Ilha dos Macacos, conta já ter visto o filho do ex-presidente na casa do vizinho. “Lulinha já esteve aí várias vezes. O Lula, eu só ouvi falar.”

Da prainha onde ela mora, saía uma trilha que chegava à casa de Suassuna. “Depois da reforma, colocaram cerca e não tem como ir para lá andando.”

Durante a reforma, feita há cerca de dois anos, embarcações traziam os materiais de construção de Angra. Nesta semana, a colunista social Anna Ramalho divulgou, em seu site, que a obra custou entre R$ 3 milhões e R$ 4 milhões, custeados por Suassuna, que teria supervisionado pessoalmente os trabalhos, sendo que em uma ocasião na companhia do sócio Lulinha.

O caseiro que cuida da propriedade de Suassuna, e que se identificou apenas como Sebastião, negou que haja relação do imóvel com Lula e Lulinha. “Sempre passa um povo aqui de barco xingando o Lula, mas essa casa não tem nada a ver com ele. Aqui é da família Suassuna. O resto é boato, cada um fala o que quer”, afirma.

O advogado Wilson Pimentel, que há dez anos atende Suassuna, informa que o empresário comprou o imóvel na Ilha dos Macacos há cerca de cinco anos e que já recebeu na casa a visita do ex-presidente e de Lulinha. Afirma, porém, que Lula e o filho jamais dormiram na casa.

Segundo Pimentel, eles estavam a passeio em Angra e fizeram visitas durante o dia. O advogado diz que Suassuna nega que tenha decorado uma suíte exclusiva para Lula, como circula em redes sociais.  Sobre o sítio em Atibaia, o advogado diz que Suassuna e Fernando Bittar, também sócio de Lulinha, compraram na mesma época dois terrenos contíguos, mas com matrículas diferentes na prefeitura, e que eles não são sócios na propriedade.

A respeito do apartamento onde Lulinha vive, em São Paulo, o advogado afirma que ele paga aluguel mensal a Suassuna, declarado no Imposto de Renda.