O globo, n. 30143, 16/02/2016. Economia, p. 18

MÍRIAM LEITÃO

COM ALVARO GRIBEL (DE SÃO PAULO)

Mudança tardia

 

Mudança tardia, para consertar erro inicial. Neste momento, com o preço do barril de petróleo na casa de US$ 30 e o Brasil sendo olhado com desconfiança pelos investidores, há pouco interesse em investir no pré- sal. A mudança do marco regulatório é obrigatória para viabilizar investimentos. O governo está tomando tarde a decisão de alterar regras que fazem da Petrobras a única operadora do pré- sal. Mesmo assim, a informação ainda não é oficial.

Anotícia divulgada ontem pelo “Valor Econômico” é a de que o governo começa a admitir a possibilidade de mudança do marco regulatório para tirar da Petrobras a obrigatoriedade de ser a operadora de todos os campos explorados, detendo 30% de cada investimento. O movimento é tardio e defensivo. Tenta se antecipar à discussão do projeto do senador José Serra.

Atualmente, o mercado está com mais oferta que demanda, por isso o barril oscila em torno de US$ 30. Todas as empresas de petróleo estão cortando investimento. A Petrobras, mais ainda, porque ela é atingida duplamente, pela queda dos preços e pela crise provocada pela corrupção e má gestão. Com seu superendividamento, a empresa não conseguiria, nem se a conjuntura de preços fosse outra, ser a operadora única e aportar 30% de todos os negócios. Só mesmo a teimosia do governo para justificar a permanência de uma obrigação que a empresa não tem como cumprir.

O professor da UFRJ Edmar Luiz Fagundes de Almeida avalia que o principal problema para o présal é a situação financeira da Petrobras e as regras que foram criadas no marco regulatório da partilha. A empresa ficou sobrecarregada, em um momento em que precisa fazer caixa para reduzir as suas dívidas:

— As curvas de preços projetadas pelas empresas para períodos de 10, 20, 30 anos à frente se inverteram. Neste momento, elas partem de um patamar baixo do barril e começam a subir. Por isso, acho que o pré- sal continua atraente. O problema são as regras que foram criadas no marco regulatório.

Ele explica que a Petrobras hoje é duas vezes mais endividada que a segunda petrolífera com mais dívidas no mundo, que é a PetroChina. A empresa brasileira tem hoje uma situação financeira que é um ponto fora da curva no setor de petróleo.

— Não é razoável para o Brasil limitar o investimento no pré- sal por causa da Petrobras. E é isso que vai acontecer caso não se mudem as regras. O cenário atual é de redução de investimentos da Petrobras, sem que outras empresas aumentem o investimento. O setor de óleo e gás no país está paralisado e diminuindo. É preciso criar condições para que a Petrobras reduza o seu tamanho, mas outras empresas ocupem esse lugar — disse.

Essa visão é a mesma do secretário executivo de exploração e produção do Instituto Brasileiro de Petróleo ( IBP) Antônio Guimarães. Ele também acha que as empresas olham para um período longo em termos de preço e que as projeções indicam uma recuperação do barril acima do breakeven do pré- sal, na casa dos U$ 40 a US$ 45. O problema, de novo, são as regras criadas no marco regulatório.

— Acho que o governo e o Congresso precisam urgentemente acabar com a obrigatoriedade de operação da Petrobras. Isso tem que passar no Senado e na Câmara e ser sancionado pela presidente Dilma ainda este ano. Se acontecer, já será uma sinalização muito importante para o setor — disse.

A mudança do modelo foi um erro desde o princípio. Fez o país perder os cinco melhores anos do setor de petróleo, quando havia interesse no mercado brasileiro e, particularmente, no pré- sal. A exploração do shale gás começou a mudar o cenário. Depois, novas fontes de energia reduziram a demanda, mudanças geopolíticas aumentaram a oferta, a redução do crescimento mundial projeta diminuição do consumo. Diante disso, o petróleo caiu fortemente de preço, e as empresas do setor cortaram investimentos. E só agora a presidente Dilma começa a admitir mudar o modelo da qual foi uma das principais formuladoras. Um modelo que fez o Brasil perder tempo, produção, investimento e empregos. Curiosa é a informação de assessores da presidente de que Dilma não admitirá nada que cause prejuízo a Petrobras. Só se é coisa recente, porque várias decisões tomadas por este governo causaram muito prejuízo à Petrobras.

 

Os pontos- chave

1 Obrigatoriedade de a Petrobras ser a única operadora do pré- sal é inviável no mundo

2 Petrobras é a petrolífera mais endividada do mundo, está cortando investimento e vendendo ativos

3 Governo dá sinais de aceitar mudança no marco regulatório

 

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