O Estado de São Paulo, n. 44.6710, 10/02/2016. Política, p. A4

Estados registraram no ano passado a maior queda de receitas em uma década

Contas públicas. Reflexo da retração da economia, rendimento corrente líquido de 25 unidades da Federação caiu 4,2% em 2015, interrompendo um ciclo de bonança nos governos estaduais; em São Paulo, a perda real foi de 6,5%, a sétima mais significativa no ranking

Por: Daniel Bramatti

 

Dados publicados no fim de janeiro pelos governos estaduais mostram que a queda de receita registrada em 2015, em termos reais, foi a maior dos 10 anos anteriores – superior até à ocorrida em 2009, quando o País sofreu os efeitos da crise internacional provocada pelo estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos.

A receita corrente líquida dos 25 governos que já publicaram seus dados – somente os da Paraíba e do Rio Grande do Norte ainda não o fizeram – caiu 4,2%, no acumulado de 2015, em relação ao ano anterior. Em 2009, a retração foi de 2,2%. Os valores se referem à variação real, ou seja, foram corrigidos pela inflação para permitir comparações.

A queda no ano passado interrompeu um ciclo de bonança para os governadores: entre 2009 e 2014, a receita média dos 25 governos cresceu 23% acima da inflação. Isso propiciou uma expansão de investimentos e gastos – alguns dos quais se tornaram permanentes, como a contratação de novos servidores estáveis.

Com a retração da economia, e a consequente queda nas receitas de impostos e repasses federais, os governadores passaram a segurar gastos e buscar fontes alternativas de recursos para fechar as contas.

Em 2015, por exemplo, as despesas com pessoal do conjunto dos Estados – excluídos Paraíba e Rio Grande do Norte – cresceram um pouco abaixo do ritmo da inflação, o que resultou numa queda real de 0,5%. Nos anos anteriores, os gastos com servidores vinham crescendo em termos reais.

O freio nas despesas com a folha de pagamento foi verificado em 16 dos 25 Estados analisados pelo Estadão Dados. Em vários casos, esse ajuste foi adotado para evitar a ultrapassagem de limites de gastos estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

 

Limites. No fim do ano passado, 19 dos 25 governos estaduais com dados publicados gastavam com pessoal mais de 44,1% de sua receita corrente líquida, ou seja, estavam enquadrados em pelo menos um dos limites estabelecidos pela LRF – de alerta, prudencial e máximo.

Três governos – do Rio Grande do Sul, de Mato Grosso e do Tocantins – superaram o teto legal de gastos do Executivo, de 49% da receita corrente líquida, e Minas Gerais só não ultrapassou o limite graças a uma manobra fiscal (mais informações no texto abaixo). Outros 11 chegaram ao limite prudencial, o que indica que estão muito próximos do teto. No fim de 2014, havia três Estados acima do teto (Tocantins, Alagoas e Paraíba) e apenas cinco no limite prudencial.

A receita corrente líquida é tudo o que os Estados arrecadam ou recebem em repasses federais, menos receitas atípicas, gastos com fundos de previdência e os recursos que repassam para os municípios.

Acre, Amapá e Amazonas, todos da Região Norte, foram os Estados que mais perderam receita no ano passado – respectivamente, 16,4%, 12,9% e 10%.

São Paulo, o maior Estado do País em termos econômicos e populacionais, enfrentou uma queda real de receita de 6,5%, a sétima mais significativa no ranking das perdas.

No outro extremo, o Paraná conseguiu ampliar seu bolo de recursos em 2,5% em termos reais, ou seja, acima da variação da inflação.

 

Fontes. Na busca por novas receitas, a alternativa preferida dos governadores foi a apropriação de parte dos depósitos judiciais, administrados pelos Tribunais de Justiça dos Estados. Esse bolo de recursos é formados por depósitos em juízo de governos, empresas ou pessoas físicas envolvidos em litígios que incluem pagamentos, multas ou indenizações.

O dinheiro fica sob administração da Justiça até que haja uma sentença definitiva, o que pode demorar até décadas.

Em 2015, pelo menos R$ 17 bilhões foram sacados dos depósitos judiciais por 11 governadores, segundo levantamento feito pelo Estado e publicado em janeiro. Esses recursos, porém, representam uma solução temporária e emergencial, já que precisarão ser devolvidos no futuro, com a devida correção e, em muitos casos, pagamento de juros.

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Minas dribla descumprimento da LRF com depósitos judiciais

Estado usa R$ 5 bilhões desses recursos como receita corrente líquida e escapa de estourar limite de gastos com pessoal

Por: Daniel Bramatti

 

Graças a um artifício contábil, Minas Gerais não entrou em 2015 na lista dos Estados que descumprem os tetos de gastos com funcionalismo estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal. No ano passado, o governador Fernando Pimentel (PT) enquadrou como “receita corrente líquida” recursos sacados de depósitos judiciais administrados pelo Tribunal de Justiça. Dessa forma, a receita que serve como base para calcular os limites de gastos foi inflada em pouco mais de R$ 5 bilhões.

Graças a esse critério contábil, o Estado registrou ter gasto com servidores 47,91% de sua receita corrente líquida – menos do que o teto legal de 49%. Se não fossem os R$ 5 bilhões, porém, a parcela comprometida com a folha de pagamento teria chegado a mais de 53%.

O critério adotado por Minas é, no mínimo, controverso. Outros Estados que se utilizam de recursos de depósitos judiciais, como São Paulo, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul, registram esse dinheiro como receita de capital ou como recursos extraorçamentários.

Em documentos sobre a LRF, a Secretaria do Tesouro Nacional informa que a receita corrente líquida é aquela com que os Estados podem contar sempre – impostos e repasses federais, por exemplo. Receitas atípicas não devem entrar no cálculo.

E as receitas de depósitos judiciais são atípicas, pois não podem ser obtidas todos os anos. Além disso, precisarão ser devolvidas. Nesse sentido, se assemelham a empréstimos, cujos recursos são enquadrados como receitas de capital.

Para o professor do MBA Executivo em Finanças do Insper Alexandre Chaia, o que Minas faz é um exemplo de “contabilidade criativa”. “A situação dos Estados é tão ruim que alguns estão escolhendo qual lei vão desrespeitar primeiro”, afirma.

A assessoria da Secretaria da Fazenda de Minas foi procurada na sexta-feira, mas o secretário José Afonso Bicalho não foi localizado para se pronunciar.

 

Teto. O Rio Grande do Sul, que não incluiu os recursos de depósitos judiciais no cálculo da receita corrente líquida, acabou estourando o teto de gastos com pessoal no ano passado, chegando a 49,18% da receita corrente líquida. Segundo a Secretaria da Fazenda, os recursos de depósitos judiciais não foram considerados como receita corrente líquida porque, nesse caso, parte deles teria de ser usada no pagamento da dívida com a União e em outras despesas de vinculação obrigatória.

Os recursos de depósitos judiciais são aqueles relacionados a litígios que envolvem governos, empresas e pessoas físicas. O dinheiro em disputa fica depositado até que uma das partes tenha ganho de causa. /D.B.

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Rio corta R$ 18 bilhões do orçamento para 2016

Por: Constança Rezende

 

O governo do Rio publicou na semana passada, no Diário Oficial, um corte de R$ 18,4 bilhões do orçamento estadual deste ano. A medida foi tomada por causa da queda da estimativa de receita. O governo esperava gastar R$ 79,9 bilhões, mas diminuiu a previsão para R$ 61,5 bilhões, um ajuste de 23%.

O corte vai afetar pastas essenciais para a população, como Saúde, que perdeu 7,6% de seu caixa e atualmente passa por crise financeira, com hospitais sem verbas para insumos. A Educação ficou com menos 9,3%, Assistência Social, 30,91%, Segurança, 32,1%, e Administração Penitenciária, 22%.

Segundo a secretária estadual de Planejamento e Gestão, Cláudia Uchôa, o orçamento será aberto com o ajuste estabelecido e, como ocorreu em 2015, as liberações de recursos vão acontecer ao longo do ano na medida em que houver aumento na arrecadação do Estado.

De acordo com Cláudia, o cálculo do ajuste foi baseado na reestimativa da receita para este ano, feita pela Secretaria de Fazenda. “No caso dos recursos do Tesouro, a arrecadação prevista caiu 22,59%, passando de R$ 73,8 bilhões para R$ 57,1 bilhões. Nas outras fontes, a queda é de 13,99%, de R$ 25,9 bilhões para R$ 22,3 bilhões.”

 

Empréstimo. Semana passada, o governo conseguiu pagar salários de 8.315 funcionários de 13 empresas públicas – um total de R$ 26,8 milhões. Na quinta-feira, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) obteve empréstimo de até R$ 1 bilhão para compensar perdas de arrecadação dos royalties de petróleo e garantir o pagamento de aposentados e pensionistas do Rioprevidência. A transação foi autorizada pela Assembleia Legislativa.

A medida permitiu ao governo contratar o empréstimo no Banco do Brasil, com juros de 19,45% ao ano, com prazo de 15 anos para o pagamento.