O globo, n. 30.155, 28/02/2016. Rio, p. 12

Esperança contra o zika

Em parceria com universidade americana, instituto no Pará deve ter vacina contra vírus em 1 ano

“O zika nos pegou de assalto, como uma tsunami. Trabalhamos com um vírus que é um completo mistério e muito agressivo”
Pedro Fernando da Costa Vasconcelos
Virologista “Nenhuma instituição de pesquisa brasileira tem condições de sozinha fazer rapidamente uma vacina contra o zika”

Único brasileiro em grupo da OMS, o virologista Pedro Vasconcelos diz que vacina contra o zika será testada em um ano, mas produção pode levar de 3 a 5 anos. O virologista Pedro Fernando da Costa Vasconcelos já viu alguns dos mais terríveis vírus do mundo em ação. Nenhum lhe causou tanta preocupação quanto o zika. Vasconcelos é o único brasileiro no grupo de especialistas sobre zika reunido pela Organização Mundial de Saúde ( OMS). Além disso, está à frente da equipe designada pelo Ministério da Saúde para desenvolver uma vacina. Ele espera que dentro de um ano os cientistas possam entregar ao ministério um produto para testes clínicos, em seres humanos.

FOTOS DE KELVIN SOUZA/IECEm estudo. Especialista no laboratório do Instituto Evandro Chagas (IEC), em Ananindeua, no Pará, onde está sendo desenvolvida uma vacina: expectativa é que em um ano seja entregue um produto para testes em seres humanos

O zika tem se mostrado tão agressivo e capaz de ludibriar o sistema imunológico, que os pesquisadores optaram por não usar na vacina vírus vivos ou inativados. Essas opções poderiam ser perigosas, e Vasconcelos explica que o foco é a segurança. A estratégia é empregar o que os especialistas chamam de subunidades de DNA, partes do vírus incapazes de causar doença.

— Já selecionamos e sequenciamos algumas proteínas da membrana e do envelope do zika. Vamos inseri-las numa partícula sintética, criada em laboratório. Essa partícula servirá como vetor (transportador) da vacina — afirma.

Se tudo funcionar como esperam os cientistas, a vacina poderá deflagrar uma reação do sistema imunológico para o zika e levar à produção de defesas pelo organismo. Ela não oferecerá qualquer risco de causar doença.

PROCESSO DEVE LEVAR DE 3 A 5 ANOS

A vacina para prevenir a infecção pelo zika está em desenvolvimento no Instituto Evandro Chagas (IEC), em Ananindeua, no Pará, dirigido por Vasconcelos, e na University of Texas Medical Branch (UTMB, na sigla em inglês), em Galveston, nos Estados Unidos. As instituições foram escolhidas pela experiência com arboviroses (infecções transmitidas por artrópodes como mosquitos).

O IEC é um dos centros de referência da OMS em arboviroses. A etapa seguinte ao desenvolvimento da candidata à vacina será experimentar em animais para avaliar a segurança e a proteção.

— Nenhuma instituição de pesquisa brasileira tem condições de sozinha fazer rapidamente uma vacina contra o zika. Daí a necessidade de parcerias com instituições estrangeiras — observa o médico e cientista.

Uma vez entregue a vacina para o Ministério da Saúde, este deverá escolher instituições para os testes com seres humanos. Numa primeira etapa, será avaliada a segurança. Se aprovado, o imunizante terá, então, a eficácia testada.

Obtido sucesso, é preciso escolher as instituições que poderão produzi- lo. Segundo Vasconcelos, o Brasil dispõe de Bio-Manguinhos/Fiocruz, no Rio, e do Instituto Butantan, em São Paulo, com capacidade técnica para isso.

— Esse processo pode levar de três anos a cinco anos. Não tem nada de trivial — salienta o virologista.

A princípio, observa Vasconcelos, a vacina deverá ser oferecida a gestantes, mulheres em idade fértil e pessoas com doenças autoimunes ou imunodeprimidas, como aquelas que se submetem a tratamentos de câncer e transplantes.

— Costumo dizer que o zika nos pegou de assalto como uma tsunami. O desenvolvimento de uma vacina é algo extremamente complexo, um processo normalmente demorado. Trabalhamos com um vírus que se revelou um completo mistério e muito agressivo. É uma dificuldade imensa buscar armas contra um vírus que sequer sabemos exatamente como afeta os seres humanos — destaca