O Estado de São Paulo, n. 44.671, 06/02/2016. Política, p. A4

Testemunha afirma que empreiteira pagou em dinheiro móveis de sítio

Funcionário da empresa Kitchens, especializada em cozinhas, relata pagamentos em espécie feitos por ex-executivo da OAS para equipar propriedade em Atibaia, utilizada pelo ex-presidente Lula e sob suspeita de estar em nome de laranjas

Por: Andressa Matais, Fabio Fabrinni e Fausto Macedo

 

Um funcionário da empresa Kitchens afirmou, em depoimento ao Ministério Público, que a empreiteira OAS pagou em dinheiro vivo os móveis e eletrodomésticos da cozinha e da área de serviço do sítio em Atibaia (SP) frequentado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua família. A testemunha relatou ter recebido a primeira parcela, de R$ 50 mil, em espécie e ainda confirmou que a compra foi negociada pelo ex-executivo da OAS Paulo Gordilho.

“Em relação aos móveis da cozinha e área de serviço do sítio, além do pagamento do sinal em pecúnia (de R$ 50 mil), que presenciou, obteve, ao levantar informações documentais para entrega ao MPF (Ministério Público Federal), que as demais parcelas também foram quitadas mediante pagamento em espécie, na loja”, relata a investigação. O nome do funcionário, com cargo de gerente, vem sendo mantido em sigilo. O total comprado para o sítio foi de R$ 180 mil. Só com eletrodomésticos e mobiliários da cozinha, foram R$ 130 mil.

O sítio passou a ser investigado pela Operação Lava Jato por suspeitas de que as melhorias foram usadas como pagamento de propina em troca de contratos fechados pela empreiteira no governo. Há suspeitas de que Lula seja o real dono do sítio, que está em nome dos empresários Fernando Bittar e Jonas Suassuna, sócios de Fábio Luís Lula da Silva, filho de Lula.

Embora a OAS tenha pago pelos equipamentos, a empreiteira pediu que Bittar figurasse como comprador. “Gordilho, no momento de aquisição dos armários do sítio, indicou os dados de Bittar para que constasse na nota fiscal”, aponta outro trecho de documento da investigação em curso.

A indicação fez os vendedores suporem que o sócio de Lulinha, como Fábio Luís é conhecido, era um funcionário da OAS. “Para a empresa Kitchens, o tal Fernando Bittar seria um diretor da OAS, uma vez que o projeto inicial e o orçamento foram solicitados pela OAS, além da intermediação e pagamento.”

O MP suspeita que Suassuna e Bittar atuaram como “laranjas” do petista no imóvel rural. A área tem 173 mil m², o equivalente a 24 campos de futebol e foi comprada por R$ 1,5 milhão. Embora os dois tenham comprado terrenos contíguos, supostamente de mesmo tamanho, Suassuna pagou R$ 1 milhão e Bittar, R$ 500 mil. O advogado Roberto Teixeira – a compra do sítio foi lavrada no escritório de Teixeira, compadre de Lula –, disse que a diferença dos valores é “porque os sócios convencionaram dessa forma, como é absolutamente lícito em qualquer negócio privado”.

Filho de um amigo de Lula, o fundador do PT e ex-prefeito de Campinas Jacó Bittar, Fernando Bittar é sócio de Lulinha na G4 Entretenimento. A empresa tem fatia da BR4 Participações, que, por sua vez, tem participação do grupo Gol Mídia, de Jonas Suassuna. Ele consta como atual ou ex-sócio de 17 empresas.

O gerente deu, ainda, um detalhe que intrigou os investigadores. A formalização da compra, incluindo pedido, contrato e projetos, foi assinada fora da Kitchens, que a recebeu já com as firmas, por meio de um portador da OAS. Isso significaria que o verdadeiro comprador não queria aparecer. A Kitchens não foi autorizada a entrar no sítio para fazer as medições dos armários, o que é atípico, pois havia uma reforma no imóvel. Os armários foram fabricados com base numa planta fornecida pelo ex-executivo.

Tríplex. O gerente confirmou a informação de que a OAS comprou cozinha e armários para o tríplex do Guarujá que está sob suspeita de pertencer a Lula. Nesse caso, contudo, os pagamentos foram feitos por meio de transferência bancária e via escritório da empresa.

Procurado, por telefone e e-mail, Fernando Bittar não se pronunciou. A defesa de Suassuna diz que o sítio é dele e a parte registrada em seu nome não tem benfeitorias. A OAS não atendeu aos telefonemas doEstado. Gordilho não foi localizado.

Órgãos relacionados:

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Força tarefa da operação apura elo de Teixeira com a propriedade

 

Negócio da compra do sítio de Atibaia foi formalizado no fim de 2010 no escritório do advogado em São Paulo

A força-tarefa da Operação Lava Jato investiga as relações do advogado Roberto Teixeira, compadre do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com a compra e a reforma do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP). O negócio foi formalizado no fim de 2010, no escritório de Teixeira, na capital paulista, conforme revelou na sexta-feira, 5, oEstado com base nas escrituras de compra e venda da propriedade.

O sítio de Atibaia está em nome de Fernando Bittar, filho do ex-prefeito de Campinas (SP) Jacó Bittar, fundador do PT e amigo de Lula que deixou o partido sob suspeita de irregularidades, e do empresário Jonas Suassuna – sócio de um dos filhos do ex-presidente.

A família de Lula usa frequentemente o sítio, que foi totalmente reformado em 2011, após sua compra. As suspeitas da Polícia Federal e do Ministério Público Federal são de que duas empreiteiras acusadas de cartel na Petrobrás – OAS e Odebrecht – tenham executado os serviços, de maneira irregular. Bittar e Suassuna podem ter servido para ocultar os verdadeiros donos do sítio, que tem 173 mil metros², lago, piscina e uma ampla residência, suspeita a investigação.

A PF solicitou ao Cartório de Registros de Imóveis de Atibaia cópia da matrícula e do contrato de compra e venda do sítio. Segundo o registro, foram pagos por Bittar e Suassuna R$ 1,5 milhão pela propriedade.

O negócio foi formalizado em 29 de outubro de 2010, dois dias antes da eleição da presidente Dilma Rousseff, no 19.º andar de um prédio na Rua Padre João Manuel, nos Jardins, zona sul de São Paulo, onde funciona o Teixeira, Martins e Advogados.

Teixeira é amigo de Lula desde os anos 1980 e é padrinho do filho o ex-presidente Luís Cláudio – que mora em imóvel registrado em nome de uma empresa da família do advogado nos Jardins.

O elo de Teixeira com o sítio foi descoberto após o topógrafo Cláudio Benatti ter dito ao Estado, em 12 de janeiro, que Teixeira era quem indicava os serviços a serem feitos no local.

“Todos os serviços que foram executados, meus, de topografia, sempre foram o Roberto Teixeira”, afirmou Benatti, na ocasião.

Benatti mora em Monte Alegre do Sul (SP), onde Roberto Teixeira tem propriedades, entre elas, um sítio. “Roberto Teixeira eu conheço ele desde 1972. Ele tem sítio aqui em Monte Alegre. Foi aqui que o Lula vinha tomar as pingas dele, em Monte Alegre.”

 

Assessoria. Teixeira, em nota divulgada ontem, afirmou que prestou “assessoria jurídica, em 2010, a Fernando Bittar e Jonas Suassuna, compradores do referido imóvel e meus clientes, na celebração do Instrumento Particular de Compra e Venda e da lavratura da escritura. Indiquei igualmente o engenheiro agrimensor, profissional que comumente recomendo para trabalhos semelhantes”. O advogado declarou que Lula, “vem sofrendo intensa perseguição”.

 

RICARDO GALHARDO, GUILHERME MAZIEIRO, ESPECIAL PARA O ESTADO, e F.M.

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Empresário diz que só cheques foram usados

 

O advogado e empresário Roberto Teixeira nega qualquer tipo de ilegalidade no negócio envolvendo o Sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP). Ontem ele divulgou nota na qual afirma que a totalidade do sítio foi paga com cheques.A escritura de compra e venda do imóvel em Atibaia informa que um montante de R$ 100 mil, do valor total do custo da propriedade, foram pagos em “boa e corrente moeda nacional”. De acordo com o documento de escritura, o negócio da propriedade de Atibaia foi formalizado no escritório de Teixeira, que é compadre do ex-presidente Lula, no bairro dos Jardins, em São Paulo, no dia 29 de novembro de 2010. Ainda segundo a escritura, o negócio havia sido fechado no dia 5 de agosto do mesmo ano, por meio de um Instrumento Particular de Compra e Venda. Na nota divulgada ontem,Roberto Teixeira apresentou uma foto do que seria um documento mostrando que os R$ 100 mil mencionados foram pagos por meio de um cheque administrativo do Banco do Brasil. “Não houve pagamento em dinheiro. Os R$ 100 mil referidos no documento encaminhado foram pagos por meio do cheque administrativo n.º 218, do Banco do Brasil, por ocasião da celebração do instrumento particular de compra e venda”,afirmou Roberto Teixeira na nota divulgada ontem. Questionado anteontem pelo Estado sobre a diferença entre o Instrumento Particular de Compra e Venda e a escritura, o advogado não se pronunciou.