Correio Braziliense, n. 19268, 26/02/2016. Política, p. 3

Zelotes mira o grupo Gerdau

Eduardo Militão

A Polícia Federal apontou a mira para o grupo siderúrgico Gerdau, um dos alvos da Operação Zelotes e suspeito de tentativa de sonegar R$ 1,5 bilhão. Ontem, agentes e delegados saíram às ruas de quatro estados e do Distrito Federal com 18 mandados de busca e apreensão e 20 de condução coercitiva, um deles para o executivo André Gerdau, filho do presidente do conselho consultivo Jorge Gerdau. A 6ª fase da Zelotes mobilizou homens até dentro do Complexo Penitenciário da Papuda, além de São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e Rio Grande do Sul. Segundo o Ministério Público, todos os mandados foram cumpridos.

A Gerdau afirmou em nota que colaborava com as investigações, negou participar de irregularidades e disse não ter autorizado ninguém a agir em seu nome para cometer crimes. De acordo com a apuração, diversos autos de infração da Gerdau estão sob suspeita. Apenas dois deles somam R$ 1,5 bilhão. No Carf, esse pagamento acabou revertido em favor da siderúrgica. Além de André Gerdau, um segundo executivo do grupo foi alvo de mandado de condução, mas a PF informou não se tratar de Jorge Gerdau.

Em Brasília, uma das buscas ocorreu no escritório da Gerdau. Houve nove conduções coercitivas na cidade, incluindo duas sócias de José Ricardo Silva, ex-integrante do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Ele e o lobista Alexandre Paes do Santos, o APS, estavam presos na Papuda e receberam a visita da polícia também. Mais tarde, por volta de meio-dia, eles foram levados à Superintendência da PF em Brasília. As sócias de José Ricardo, a irmã Eivanice Canário Silva e a empresária Adriana Ribeiro, foram conduzidas à polícia para depor.

As conduções coercitivas se deram sobre pessoas consideradas intermediárias do esquema. As buscas, em empresas e escritórios de advocacia possivelmente usados para “dissimular contrato” com SGR Consultoria, de José Ricardo, que era conselheiro do Carf e, ao mesmo tempo, atuava “em processo no qual sua empresa estava representando o contribuinte correspondente”, segundo o Ministério Público. O advogado de José Ricardo, Getúlio Humberto Sá, tem dito que ele não julgava processos nos quais defendia clientes. E afirma que, apesar da discussão ética, sua atuação dupla era legal.

As investigações apontam que a Gerdau contratou escritórios de advocacia para se defender de ações no Carf. Com o dinheiro recebido, escritórios subcontrataram outros advogados e consultores. Dali, os recursos seguiram para conselheiros. Investigadores ouvidos pelo Correio sustentam que há provas documentais que ligam a siderúrgica também aos escritórios subcontratados que fizeram a intermediação pagamento de propinas. O Ministério Público diz que a Gerdau, que tem presença em 14 países, fez “contratações e subcontratações irregulares” para “interferir em julgamentos realizados pelo tribunal administrativo”. As decisões favoráveis foram obtidas entre 2012 e 2014.

Em nota, a Gerdau informou que colabora com as investigações e que não participou de irregularidades. “Com base em seus preceitos éticos, a Gerdau não concedeu qualquer autorização para que seu nome fosse utilizado em pretensas negociações ilegais, repelindo veementemente qualquer atitude que possa ter ocorrido com esse fim”, disse. “A Gerdau (...) possui rigorosos padrões éticos na condução de seus pleitos junto aos órgãos públicos.”

Na operação de ontem, foram apreendidos documentos, mídias e telefones celulares. De acordo com a delegada Fernanda Costa Oliveira, uma das responsáveis pela Zelotes, a operação já indicou que vários contribuintes podem ter se beneficiado de um esquema de corrupção e compra de decisões no Carf.  “Hoje, estamos aprofundando a atuação desses contribuintes”, esclareceu ela, em entrevista coletiva na Superintendência da Polícia Federal no Distrito Federal.

 

Escritórios

Segundo Fernanda Costa, o objetivo das ações de ontem foi reforçar provas já obtidas. “Queremos delimitar ainda mais a autoria e a materialidade. Para a deflagração da operação de hoje, há havia autoria e materialidade bastante robusta. Estamos com a identificação dos alvos que atuaram nos processos no Carf e nos escritórios de advocacia junto aos contribuintes. E a gente precisa desse arremate final.”

A delegada enfatizou que a continuidade das atividades criminosas foi o motivo das ações de ontem, pedidas ao juiz da 10ª Vara Federal, Vallisney Oliveira, que ordenou as buscas e conduções coercitivas. “Foi exatamente a existência desses indícios (a razão das ordens judiciais para buscas e conduções). Indícios de que o grupo continuava em atividade.”

 

Fernanda Costa destacou que o aprofundamento das investigações decorreu da análise de materiais apreendidos a partir da 1ª fase da Zelotes, em março de 2015 e também de informações obtidas ao longo do ano passado.  “Em um ano, muita coisa acontece”, lembrou a delegada.