Correio Braziliense, n. 19269, 27/02/2016. Brasil, p. 8

ONU ataca Lei Antiterrorismo

A Organização das Nações Unidas (ONU) emitiu ontem um comunicado oficial de reprovação ao texto da Lei Anterrorismo aprovado pela Câmara dos Deputados. O Projeto de Lei nº 2016/15 passou pelo plenário da Casa na última quarta-feira. De acordo com a organização, o texto carrega uma série de incoerências e ambiguidades que podem acabar por dificultar a execução da própria legislação, que dispõe sobre as especificações para enquadramento no crime de terrorismo no Brasil. O projeto prevê uma reclusão de 12 a 30 anos pela prática.

“O projeto de lei inclui disposições e definições demasiadamente vagas e imprecisas, o que não é compatível com a perspectiva das normas internacionais de direitos humanos”, diz nota assinada por Amerigo Incalcaterra, representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) na América do Sul. Desde o início da tramitação na Casa, o PL repercutiu negativamente entre os movimentos sociais. Advogada do movimento Artigo 19, de São Paulo, Camila Marques afirma que o texto compõe um cenário de restrição a direitos fundamentais “Nós acompanhamos o trâmite e a aprovação do PL no Congresso e o que se viu foi uma urgência de aprovação que impossibilitou o debate público, não houve interesse do Congresso em nos ouvir. Essa lei é uma ameaça aos movimentos sociais”, afirmou Camila.

Em nota, a Câmara afirmou que uma emenda retirou a possibilidade de enquadramento dos movimentos sociais no crime de terrorismo quando a conduta individual ou coletiva nas manifestações políticas, nos movimentos sociais, sindicais, religiosos ou de classe profissional tiverem como objetivo defender direitos, garantias e liberdades constitucionais. Entretanto, esses atos violentos continuarão sujeitos aos crimes tipificados no Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40). O texto do Senado retirava essa exceção do texto.

O PL permite o enquadramento por porte, uso ou transporte de explosivos, uma vez que for identificada a intenção de depredação ou destruição. A regra se aplica a compostos químicos, biológicos e nucleares que se apliquem a identificação. A depredação de meios de transporte ou de instituições reconhecidas como patrimônio público também passa a ser autuada como crime de terrorismo. A pena pode ir de 12 a 30 anos em regime fechado.
 

Sessão na Câmara

Deputados defenderam, após a aprovação da proposta, que o texto aprovado pela Câmara é superior ao enviado pelo Palácio do Planalto. “Após essa conversa com todos os partidos, nós escolhemos por ficar com esse texto, por considerá-lo mais abrangente e por trazer mais tranquilidade. Agora, é bem verdade que existem alguns pontos convergentes. A investigação criminal fica a cargo da Polícia Federal; o processamento e o julgamento, da Justiça”, afirmou Alberto Fraga (DEM-DF). “O terrorismo foi definido como um ato que viola os direitos humanos, que viola o respeito e a integridade humana. Nesse sentido, recebeu o repúdio coletivo das nações democráticas no âmbito da ONU”, disse Raul Jungmann (PPS-PE).

 

Para Ivan Valente (PSol-SP) a reformulação no texto acabou criando uma legislação punitiva, restritiva e de ataques às liberdades de expressão e manifestação. O parlamentar afirmou ser evidente a tendência de criminalizar os movimentos sociais no Brasil. “Não é à toa que o Senado enrijeceu ainda mais. Qualquer atividade social, sindical ou popular já era taxada de terrorismo. Essa tipificação só serve àqueles defensores dos privilégios, àqueles defensores da grande propriedade e da riqueza.” disse.