Título: Falta sintonia nas investidas de Iriny
Autor: Gama, Júnia
Fonte: Correio Braziliense, 08/10/2011, Brasil, p. 10

Segundo especialistas, secretária de Políticas para as Mulheres deveria, além de se preocupar com o conteúdo da tevê, fortalecer as ações de combate à violência física e de atendimento a vítimas

As recentes interferências da Secretaria de Políticas para as Mulheres em obras de ficção e em uma campanha publicitária vêm gerando reações favoráveis e contrárias na sociedade. Após solicitar a suspensão da propaganda em que Gisele Bündchen, de lingerie, ensina a maneira correta de dar uma má notícia ao marido, a ministra da pasta, Iriny Lopes, enviou esta semana ofício à Rede Globo sugerindo que a personagem Celeste, da novela Fina Estampa, procure o serviço da Rede de Atendimento à Mulher ¿ Ligue 180 quando for agredida pelo marido e que o personagem agressor seja responsabilizado. Em seguida, a ministra endossou pedido do Sindicato dos Metroviários de São Paulo para que seja retirado do ar o quadro Metrô Zorra Brasil, em que uma usuária de um vagão lotado é assediada.

A professora de antropologia da Universidade de Brasília (UnB) Lia Zanotta considera uma ¿intromissão¿ da ministra a sugestão ao autor da novela. ¿Cabe à secretaria divulgar o disque denúncia, não é papel da novela fazer campanha de uma política do governo¿, pontua.

A diretora de Justiça da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul, Rúbia Abs, considera a interferência pertinente e destaca o diminuto orçamento da pasta para efetuar políticas públicas. ¿É um debate válido, a secretaria não é órgão de polícia e cumpre seu papel dentro de uma restrição orçamentária muito grande¿, afirma.

A farmacêutica Maria da Penha, que inspirou a lei homônima que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, defende a tentativa de inserção de preocupações nas obras de ficção, mas destaca que apenas isso não basta para enfrentar o problema. ¿Ainda há muito a se fazer para mudar o cenário atual. Precisamos de mais políticas públicas, de mais delegacias, de um funcionamento mais eficiente do 180 e de denúncias quando houver omissão do Estado¿, aponta a líder de movimentos de defesa dos direitos das mulheres.

A assessoria da secretaria informou que somente atua nesses casos quando é acionada a partir de denúncias e solicitações encaminhadas pela população à ouvidoria do órgão. Ontem, a Rede Globo respondeu à sugestão de Iriny, afirmando entender que o ofício da ministra não representa uma tentativa de coibir a liberdade de expressão.

A secretária negou que tenha pedido a retirada do ar do quadro de humor do programa Zorra Total e que tenha tentado intervir na novela Fina Estampa. Afirmou que é recorrente ¿se solidarizar com manifestações que contestem todas as formas de banalização da condição da mulher¿ e que ¿é natural que a secretaria possa fazer sugestões sobre um tema delicado, que toca na esfera da segurança pública, assim como é natural o direito do autor de aceitar ou não a sugestão¿.