O globo, n. 30.151, 24/02/2016. País, p. 4

Vida difícil

Panelaços mostram que população voltou a se movimentar contra o PT. A vida de Lula não está fácil, e nada indica que melhorará nos próximos meses. O panelaço em nível nacional, alguns julgam o maior dos últimos tempos, indica que a movimentação contra o PT voltou a mobilizar a população, cujo estado de espírito já havia se revelado na pesquisa Ibope que deu a Lula uma megataxa de rejeição.

Investigado em várias frentes, ele corre o sério risco de vir a ser indiciado por diversos crimes que começam a ser explicitados. A unanimidade do plenário do Conselho Nacional do Ministério Público que derrubou a liminar do deputado petista Paulo Teixeira, que suspendera os depoimentos de Lula e Marisa na semana passada, tem um sentido político inegável.

Lula vai perdendo as blindagens que o protegiam, e várias forças- tarefas vasculham sua atividade nos últimos anos. O Ministério Público de Brasília aumentou o foco sobre a investigação da atuação do ex- presidente como lobista de empreiteiras aqui e no exterior, e já há indícios de que ele praticou tráfico de influência em favor da Odebrecht no país e no exterior.

Por sua vez, a força- tarefa do Ministério Público de São Paulo, formada pelos promotores Cássio Conserino, Carlos Blat ( natural), Fernando Henrique de Morais e José Guimarães Carneiro, teve confirmada a sua legalidade na investigação do tríplex do Guarujá, e deverá convocar novamente o ex- presidente e dona Marisa para depor.

A anotação encontrada com Marcelo Odebrecht que se refere a R$ 12 milhões para o IL ( Instituto Lula) parece ter procedência, pois começam a vir a público antigas reportagens que falam sobre a ideia de Lula de construir um prédio novo para o Instituto Lula, e cita o amigo do peito José Carlos Bumlai como o arrecadador de dinheiro entre os empresários.

Tudo vai se encaixando como peças de um quebracabeça pacientemente montado pelos procuradores da Lava- Jato, em Curitiba, com o auxílio da Polícia Federal. Não há histórico de irresponsabilidades nas centenas de prisões já feitas, e é improvável que tenham cometido um erro gigantesco como o de acusar o marqueteiro João Santana sem condições de provar as irregularidades.

O coordenador dos procuradores, Deltan Dallagnol, me disse certa vez que quando uma prisão é decretada, há quase 100% de certeza de que o acusado será condenado, pois as provas são muito robustas. Nesse caso do marqueteiro, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima disse que nunca haviam conseguido um conjunto de provas tão contundentes quanto nesta 23 ª fase da Operação LavaJato.

Mais uma vez as investigações vão encaixando as peças do quebracabeça, tornando difícil a contestação. Nos documentos de Marcelo Odebrecht foram encontradas há meses anotações que colocam sentido nos fatos posteriormente descobertos. Como, por exemplo, avisar ( a Edinho Silva, hoje ministro, ontem coordenador da campanha presidencial) que a conta na Suíça pode chegar a ela, numa clara referência à presidente Dilma.

Uma conta naquele país, de João Santana, já foi confiscada pelas autoridades financeiras suíças. E há também uma anotação que fala em liberar ( dinheiro) para o Feira ( codinome de João Santana). Difícil imaginar que a Odebrecht pagasse a João Santana por fora pelas campanhas presidenciais que ele andou fazendo para políticos ligados a Lula e ao PT na América Latina.

Seria um crime de qualquer maneira, pois as contas offshores não foram declaradas, mas não faz sentido que tenha sido usado para tal tarefa o engenheiro Zwi Skornicki, representante oficial no Brasil do estaleiro Keppel Fels, considerado um dos principais operadores de propinas ligado à Petrobras.

As acusações da força- tarefa da Lava- Jato vão sendo provadas uma a uma. Eles acusaram a Odebrecht de ter mandado para o exterior, desde o início da operação, vários executivos, para protegê- los e dificultar as investigações. Ontem, soube- se que um deles, o executivo Fernando Migliaccio, que tinha sua prisão pedida nessa 23 ª fase, foi preso em Genebra tentando encerrar contas bancárias.

Ele seria o encarregado de controlar as contas offshore, como as que encaminharam o dinheiro para João Santana no exterior, e fazer os pagamentos de propinas para diversas autoridades em países em que a empreiteira brasileira atua. Tudo indica que estamos chegando à reta final desse quebra- cabeça, que já tem praticamente todas as suas peças encaixadas.