O Estado de São Paulo, n. 44.676, 11/02/2016. Política, p. A4

Moro decide por legalidade de provas e ação contra Odebrecht prossegue

Lava Jato. Juiz federal acata argumentos do Ministério Público e destrava processo ao determinar que os documentos enviados por autoridades suíças sobre offshores suspeitas de terem sido usadas para pagar propinas no exterior podem ser utilizados na investigação

Por: Fausto Macedo / Ricardo Brandt / Mateus Coutinho

 

O juiz federal Sérgio Moro recusou ontem a estratégia dos advogados de defesa do executivo Márcio Faria, que trabalhava na Odebrecht. Eles pediam a exclusão dos autos da Lava Jato de documentos enviados por autoridades da Suíça. Em termos práticos, com a decisão, o magistrado responsável pela operação na 1.ª instância da Justiça aceitou o uso dos documentos nos processos que envolvem a empreiteira e seu presidente afastado, Marcelo Odebrecht, preso desde junho em Curitiba.

No último dia 2, o juiz determinou a suspensão do prazo para entrega das alegações finais dos defensores dos réus, uma suspensão temporária no trâmite do processo contra o maior empreiteiro do Brasil. Os documentos enviados do exterior dizem respeito a uma conta na Suíça em nome da Havinsur S/A - offshore que tem como beneficiária econômica e controladora a Odebrecht, segundo o Ministério Público Federal.

A Justiça suíça considerou irregular a transferência de documentos de movimentações financeiras em offshores atribuídas à empreiteira para o Brasil. Porém, a Justiça daquele país rejeitou decretar a nulidade dos documentos, considerados fundamentais para a investigação que apura a ligação da empreiteira e de alguns de seus dirigentes com o esquema de desvio de dinheiro, formação de cartel e de corrupção na Petrobrás.

Após ouvir manifestação do Ministério Público Federal e dos advogados de Márcio Faria, preso desde 19 de junho de 2015 na Operação Erga Omnes, Sérgio Moro mandou seguir a ação. “Denegado o pedido, deve-se retornar à fase de alegações finais”, determinou ele.

Na sexta-feira passada, o Ministério Público afirmou que a defesa de executivos da Odebrecht busca fazer do processo da Operação Lava Jato uma “feira de chicanas ou fábrica de nulidades”, conforme manifestação entregue a Moro.

 

Argumentos. A defesa de Faria deverá recorrer da decisão de Moro. Para tentar excluir dos autos os documentos suíços, a defesa alegou que a Justiça do país europeu reconheceu que o envio dos extratos não foi realizado pelas vias regulares da cooperação internacional.

Essa argumentação, porém, não foi acolhida por Moro, que escreveu: “A Odebrecht, seus executivos e seus advogados, ao mesmo tempo em que deixam de explicar nos autos ou em suas inúmeras manifestações na imprensa os documentos alusivos às contas secretas, buscam apenas ganhar mais tempo”. Com um toque de ironia, o juiz ignorou outro argumento. “Quanto às demais alegações de que ele (Márcio Faria) e a Odebrecht seriam vítimas de uma espécie de conspiração universal, são desnecessários comentários do Juízo.”

Moro destacou que a ação penal que envolve os executivos ligados à empreiteira apura crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa. “Dirigentes da Odebrecht teriam efetuado o pagamento de milhões de dólares e reais em vantagem indevida a executivos da Petrobras. Para tanto, teriam utilizado contas secretas em nome de offshores no exterior.”

O juiz federal enfatizou que, “apesar do reconhecimento do erro procedimental suprível por parte do Ministério Público Suíço, a Corte Suíça não proibiu as autoridades brasileiras de utilizar os documentos, nem solicitou a sua devolução”.

 

EMPREITEIRA NO ALVO

Paulo Roberto Costa

No início de 2015, o ex-diretor da Petrobrás e delator afirmou que o então diretor da Odebrecht Rogério Araújo sugeriu a ele que “abrisse conta no exterior” para receber propinas da empresa no montante de US$ 23 milhões. A empreiteira negou a declaração.

 

Prisão

Em junho de 2015 foram presos o então presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht e quatro executivos. A força-tarefa disse ter provas de que a empresa e seus diretores capitaneavam o esquema de corrupção, cartel e fraudes em licitações da Petrobrás “como prática de negócios”.

 

Denúncias

A força-tarefa denunciou em outubro a cúpula da Odebrecht por suposto pagamento de R$ 137 milhões em propinas em oito contratos da Petrobrás. Marcelo Odebrecht e outros executivos da empreiteira já respondem a uma ação penal por corrupção, lavagem e organização criminosa.

 

Alegações finais

No mês passado, a Procuradoria pediu ao juiz Sérgio Moro a condenação à pena de prisão em “regime fechado” de Marcelo Odebrecht por corrupção, lavagem e organização criminosa. O procurador Deltan Dallagnol disse que a expectativa é de que o empresário seja condenado a “menos de 100 anos de prisão”.

 

IMBRÓGLIO

 

1. Suspensão de prazos. Os advogados Dora Cavalcanti e Rafael Tucherman, defensores de Márcio Faria, ex-diretor da Odebrecht e réu na Lava Jato, pediram a suspensão dos prazos das defesas para apresentação das alegações finais na ação penal que envolve o executivo. A justificativa é que o Tribunal Penal da Suíça julgou “ilegal” a remessa, ao Brasil, de extratos de contas no exterior por meio das quais a empreiteira teria pago propina.

 

2. Pedido aceito. O juiz da Lava Jato, Sérgio Moro, acolheu na semana passada o pedido dos advogados do ex-diretor da Odebrecht e determinou o congelamento dos prazos para apresentação das alegações finais pela empreiteira. Alegações finais são a parte derradeira do processo, em que Ministério Público e defesas apresentam suas argumentações. A Procuradoria já entregou seus memoriais.

 

3. Embate. Para a Procuradoria, o tribunal suíço autorizou a Odebrecht a apenas ingressar com “recurso interno”. Já a defesa do ex-executivo pediu a retirada dos extratos dos autos com base na “ilegalidade” da remessa.

 

4. Decisão. Após manifestação do Ministério Público Federal pela legalidade das provas da Suíça, Sérgio Moro decidiu ontem pela validade dos documentos enviados pelo país europeu contra

a Odebrecht e mandou prosseguir ação contra a empreiteira.

 

Alvo. O empresário Marcelo Odebrecht

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Para a defesa, decisão da Suíça ‘não deixa dúvidas’

Por meio de nota, a defesa do ex-diretor da Odebrecht Marcio Faria informou ontem ter protocolado petição na Justiça Federal na qual reafirma considerar o envio das provas “ilegal”. Segundo os advogados, a decisão da Justiça do país europeu “não deixa dúvidas” quanto a isso. Para a defesa, “não se tratou de um mero ‘erro procedimental na transmissão de documentos’”.

Os advogados Dora Cavalcanti e Rafael Tucherman argumentam que a Suíça não “deu carta branca” para o Brasil usar os documentos.

“As autoridades suíças haviam alertado o Brasil, no mesmo dia em que os documentos chegaram, para a existência de uma exceção que impediria o seu uso. Essa exceção é exatamente o procedimento ilegal de cooperação que a Suíça chama de ‘cooperação selvagem’, e que o Tribunal Penal Federal daquele país reconheceu ter acontecido.” A defesa cita decisão anterior do juiz Sérgio Moro na qual ele afirma que “o processo é uma marcha para a frente”. “O processo marchava para a frente mediante a construção de muros impenetráveis”, afirma a nota dos advogados.

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Petrobrás é 2º maior caso de corrupção, diz ONG

Em votação mundial da Transparência Internacional, esquema na estatal só perdeu para ex-presidente ucraniano

Por: Fausto Macedo / Fernanda Yoneya

 

O esquema de propinas instalado na Petrobras entre 2004 e 2014 foi eleito o segundo maior caso de corrupção do mundo, aponta pesquisa feita pela organização não governamental Transparência Internacional. Os desvios na estatal petrolífera brasileira despontam entre os maiores escândalos mundiais de malfeitos.

A ONG Transparência promoveu uma votação de âmbito internacional pela internet sobre os episódios mais importantes da corrupção. Foram citados, ao todo, 400 casos.

Com 11.900 votos, a Petrobras pegou o segundo posto, ficando atrás apenas de Viktor Yanukovych, ex-presidente da Ucrânia (2010/2014), merecedor de 13.210 votos.

O esquema na Petrobras, desmontado na Operação Lava Jato, supera, na avaliação dos entrevistados, outros capítulos marcantes de fraudes, como o caso Fifa (1.844 votos) e o do ex-presidente panamenho Ricardo Martinelli (10.166 votos), acusado pelo desvio de US$ 100 milhões. Martinelli encerrou a votação da Transparência em terceiro lugar.

 

Campanha brasileira. A lista faz parte da campanha “Desmascare os corruptos”, da ONG sediada em Berlim que, em janeiro, declarou apoio a uma outra campanha, “10 Medidas contra a Corrupção”.

Idealizado pelo Ministério Público Federal brasileiro a partir do combate ao esquema de propinas e desvios na Petrobras, o projeto 10 Medidas contra a Corrupção já conta 1,3 milhão de assinaturas e será levado ao Congresso quando atingir 1,5 milhão de adesões.

A Petrobras informou que não vai comentar a pesquisa divulgada ontem pela Transparência Internacional. / F.M. e FERNANDA YONEYA

Órgãos relacionados:

  • Congresso Nacional

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‘Não se para mais de puxar o fio’

Por: Altamiro Silva Júnior  

 

O procurador da força-tarefa  da Lava Jato Antonio Carlos Welter disse, em evento na noite de anteontem em Nova York, que a operação começou pequena, mas conseguiu demonstrar que havia uma organização criminosa dentro da Petrobrás que envolvia de políticos a empreiteiros, além de executivos da companhia e doleiros. “O fio era pequeno e quando veio, não se para mais de puxar esse fio”, afirmou. / ALTAMIRO SILVA JÚNIOR

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Juiz manda presidente afastado voltar ao cárcere

Otávio Azevedo, do grupo Andrade Gutierrez, foi levado novamente à prisão ontem; ele estava fora desde sexta-feira

Por: Ricardo Brandt / Fausto Macedo

 

O executivo Otávio Azevedo, presidente afastado da Andrade Gutierrez, voltou ontem para a prisão em regime fechado. Por ordem do juiz federal do Rio Marcelo Bretas, a Polícia Federal prendeu o executivo em sua residência em São Paulo.

O juiz considerou que deveria ter se pronunciado acerca da prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica a que Azevedo estava submetido desde a sexta-feira, passada por decisão de um colega dele, o juiz federal da Operação Lava Jato Sérgio Moro.

Por ter fechado acordo de delação premiada, o executivo da Andrade Gutierrez obteve a prisão em regime domiciliar.

Contra Azevedo, porém, pesam duas ordens de prisão. Uma em Curitiba, base da Lava Jato, e outra no Rio. Em Curitiba, sob responsabilidade de Sérgio Moro, corre ação sobre esquema de propinas na Petrobrás. No Rio, sob responsabilidade do juiz Marcelo Bretas, tramita ação sobre esquema de propinas na Eletronuclear envolvendo seu ex-presidente, o almirante Othon Pinheiro.

A delação premiada de Otávio Azevedo foi firmada no âmbito da Lava Jato em Curitiba, onde o juiz Moro autorizou a remoção do empreiteiro para o regime domiciliar, sob monitoramento de tornozeleira eletrônica. O juiz federal do Rio, no entanto, considerou que tem que se pronunciar sobre a medida porque contra Otávio Azevedo há mandado de prisão nos autos sob sua guarda.

A defesa de Azevedo não foi localizada ontem.

 

Tensão. O conteúdo da delação do executivo tem causado grande apreensão no meio político, especialmente no Palácio do Planalto. O temor é de que ele tenha fornecido informações sobre contribuições eleitorais à campanha de Dilma Rousseff, que teve o ministro Edinho Silva (Comunicação Social) como tesoureiro em 2014.

Por causa disso, petistas já têm pronta uma estratégia de defesa na esfera da política: apontar a relação de Azevedo com o tucano Aécio Neves, que também recebeu doação da empresa. / R.B. e F.M.

 

Preventiva

Otávio Azevedo passou quase 8 meses preso em Curitiba. Ele foi detido pela 1ª vez em 19 de junho de 2015.

Senadores relacionados:

  • Aécio Neves