Correio Braziliense, n. 19264, 22/02/2016. Política, p. 2

Constrangimento bate à porta do Senado

Nívea Ribeiro

A volta ao Congresso do senador Delcídio do Amaral (MS), preso em novembro e suspenso do PT, vai causar desconforto na rotina da Casa e novos embates entre a oposição e o governo. O parlamentar, que retorna às atividades após a soltura na última sexta-feira, é presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e deve renunciar ao cargo por pressão partidária. Para substituí-lo na CAE, o partido indicou a senadora Gleisi Hoffmann (PR).

Na última sexta-feira, o ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal, converteu a prisão preventiva em medidas alternativas. De acordo com a decisão de Zavascki, o senador é obrigado a se recolher em domicílio durante a noite e nos dias de folga, enquanto o mandato durar; a comparecer em juízo quinzenalmente e a todos os atos do processo, quando for intimidado. Delcídio não pode deixar o país — o passaporte foi entregue, no sábado, à Justiça. Ao longo desta semana, a defesa do senador espera esclarecer a restrição de horários, já que as sessões do Congresso podem se estender até a noite.

Amaral também deve apresentar, nesta semana, defesa contra a cassação. Uma reunião do Conselho de Ética está agendada para quarta-feira, e será discutido o pedido, feito pela defesa de Amaral, de destituição do senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO) da relatoria da ação. A defesa alega que Oliveira é de partido que assinou a representação contra Delcídio, portanto, não poderia ser relator. Há ainda a hipótese de que ele peça licença de 120 dias para continuar com as prerrogativas de senador — entre elas, de ser julgado somente pelo Supremo Tribunal Federal. O PT ainda precisar de expulsá-lo dos quadros.

 

Delação

Na manhã de 25 de novembro, em sessão extraordinária, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal referendou, por unanimidade, a prisão preventiva de Delcídio, autorizada por Zavascki. O ex-líder do governo no Senado era suspeito de atrapalhar as investigações: para tentar impedir a delação premiada de Nestor Cerveró, o senador ofereceu uma “mesada” de R$ 50 mil pelo silêncio do ex-diretor da Petrobras. Após a decisão do Supremo, a prisão de Delcídio do Amaral foi para análise no Senado, que acolheu a decisão do STF na noite do mesmo dia.O colegiado, convocado por Zavascki, confirmou ainda as prisões temporárias de André Esteves, dono do Banco BTG Pactual, e de Diogo Ferreira, chefe do gabinete do senador; além da prisão preventiva do advogado Edson Ribeiro, que defendeu Cerveró. Em gravações de conversas entre Amaral, Bernardo Cerveró e Edson Ribeiro, foram citados os ministros do STF Dias Toffoli, Edson Fachin, Gilmar Mendes e Teori Zavascki. O senador sugeriu que o grupo “centrasse fogo no STF”, para pressionar os ministros por habeas corpus que assegurassem a liberdade de Cerveró.

A decisão da semana passada também é válida para Ferreira. Já André Esteves saiu do presídio em 18 de dezembro, cumprindo pena domiciliar desde então. Ele teve que deixar a presidência do banco, não pode ter contato com investigados nem sair do país. Ribeiro segue preso.

 

Caso Donadon

Em 2010, o deputado Natan Donadon (PMDB-RO) foi sentenciado pelo Supremo Tribunal Federal por desvio de dinheiro. Após três anos de julgamento dos recursos, foi o primeiro parlamentar a ser preso em exercício após a Constituição de 1988, por ordem do STF. Donadon foi condenado a 13 anos e 4 por peculato e formação de quadrilha, e, mesmo assim, não perdeu o mandato: a cassação só ocorreu após duas votações na Câmara. A primeira, com votos secretos, foi favorável a ele. Já a segunda foi realizada por meio de votação aberta, que decidiu por unanimidade pela perda do mandato. Expulso do PMDB, Donadon está preso até hoje, em Brasília.

 

 

 

Diálogos

Confira trechos do diálogo comprometedor que levaram à prisão de Delcídio do Amaral, gravado por Bernardo Cerveró, filho do ex-presidente da Petrobras. Uma das acusações envolve o pagamento de R$ 50 mil mensais para Nestor Cerveró não fizesse delação.

 

EDSON: Só pra colocar. O que eu combinei com o Nestor que ele negaria tudo com relação a você e tudo com relação ao (...). Tudo. Não é isso?

 

BERNARDO: Sim

 

EDSON: Tá acertado isso. Então não vai ter. Não tendo delação, ficaria acertado isso. Não tendo delação. Tá? E se houvesse delação, ele também excluiria. Não é isto?

 

DELCÍDIO: É isso.

 

EDSON: É isto.

 

DELCÍDIO: Bom, aí mas porque que eu to falando isso.

 

EDSON: Porque aí não tem nada assinado.

 

BERNARDO: É, basicamente isso.

 

Amaral mencionou alguns ministros do Supremo Tribunal Federal:

 

DELCÍDIO: Agora, agora, Edson e Bernardo, é eu acho que nós temos que centrar fogo no STF agora, eu conversei com o Teori, conversei com o Toffoli, pedi pro Toffoli conversar com o Gilmar, o Michel conversou com o Gilmar também, porque o Michel tá muito preocupado com o Zelada, e eu vou conversar com o Gilmar também.

 

EDSON: Tá.

 

DELCÍDIO: Porque o Gilmar ele oscila muito, uma hora ele tá bem, outra hora ele tá ruim e eu sou um dos poucos caras...

 

EDSON: Quem seria a melhor pessoa pra falar com ele, Renan, ou Sarney...

 

DELCÍDIO: Quem?

 

EDSON: Falar com o Gilmar

 

DELCÍDIO: Com o Gilmar, não, eu acho que o Renan conversaria bem com ele.

 

EDSON: Eu também acho, o Renan, é preocupante a situação do Renan.

 

DELCÍDIO: Eu acho que, mas por que, tem mais coisas do Renan? Não tem...

 

EDSON: Não, mas o..., acho que o Fernando fala nele, não fala?

 

DELCÍDIO: Fala, mas fala remetendo ao Nestor.

 

DELCÍDIO: Diogo, nós precisamos, nós precisamos marcar isso logo com o Fachin, viu!

 

DIOGO: Hum rum!

 

DELCÍDIO: Fala com o Tarcísio lá.

 

DIOGO: Tá!

 

DELCÍDIO: Pra ver se eu faço uma visita pro Fachin.

 

EDSON: Esse todo mundo devia cair em cima e pedir por que resolve tudo

 

DELCÍDIO: Esse mata tudo... Quer dizer sobre o ponto de vista jurídico em função do HC só tá faltando o Gilmar.

 

DIOGO: Han rã!

 

 

DELCÍDIO: E eu vou essa ideia do Edson é boa, e eu vou falar com Renan também …, é, na verdade tá Renato e

 

EDSON: Isto, são os dois

 

DELCÍDIO: E Nestor está na mesma, na mesma, (...)

 

 

EDSON: E aí vai servir para Zelada também que é igual [vozes sobrepostas]

 

 

DELCÍDIO: E outra é falar com Tarcísio para marcar um café meu com Fachin... é importante isso.