Título: A lição das melhores
Autor: Werthein, Jorge
Fonte: Correio Braziliense, 08/10/2011, Opinião, p. 21

Doutor em educação pela Universidade Stanford (EUA), foi representante da Unesco no Brasil e vice-presidente da Sangari

A cada divulgação dos resultados do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), a imprensa destaca as escolas que se saíram melhor. Isso acaba de ocorrer de novo com a publicação dos resultados do Enem 2010. São os casos, por exemplo, do Colégio São Bento, no Rio de Janeiro, primeiro lugar geral e entre as particulares, e do Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Viçosa (Coluni-UFV), em Minas Gerais, primeiro lugar entre as públicas. O que eles têm em comum salta à vista: a busca pela excelência por meio do investimento generoso em formação e remuneração de professores, infraestrutura e ambiente acolhedor. No caso do São Bento, esse investimento começa no ensino fundamental, considerado responsável pelo ótimo desempenho dos níveis posteriores.

Pode-se argumentar que essas escolas atendem a uma elite econômica ou intelectual. No entanto, o rendimento delas e de outras escolas semelhantes não depende exclusivamente da situação financeira, do capital cultural dos pais e do preparo prévio de seus alunos. Sustenta-se ao longo de anos graças a rigoroso acompanhamento pedagógico, como atesta o diretor do Coluni-UFV, segundo o qual há casos de estudantes que se saem bem na prova de seleção à escola, mas que não mantêm o rendimento durante o curso e vice-versa. Para os que tiram notas baixas, o colégio oferece orientação especial.

Os depoimentos dos estudantes atestam o orgulho de frequentarem ¿ ou de terem frequentado ¿ uma instituição de ensino que, por um lado, exige disciplina e, por outro, oferece condições excelentes de aprendizado. Professores com pós-graduação e salários compatíveis com a função, aulas em período integral, material didático adequado, atenção especial a estudantes com problemas em casa, na escola ou em ambos são exemplos de iniciativas que trazem resultados positivos. Não há mágica. Não há nem mesmo novidade. São elementos indispensáveis a uma educação de qualidade seja onde for.

Com o Enem, mais que avaliar o desempenho dos estudantes, o governo avalia também as próprias escolas. Nas palavras do ministro da Educação, Fernando Haddad, o exame é um instrumento que auxilia a organização racional do currículo e orienta o trabalho dos professores na sala de aula. Como a grande maioria das escolas de ensino médio são de responsabilidade dos estados, a avaliação pode ser igualmente útil para a formulação de políticas educacionais em nível estadual e, por tabela, também municipal, uma vez que o desempenho no ensino médio depende, em larga medida, da base que se obteve (ou não) no ensino fundamental.

A visão de conjunto e de continuidade é imprescindível quando se trata de educação. Essa visão parece estar mais presente nas escolas particulares, maioria entre as mais bem classificadas no Enem 2010 e nos anteriores. Elas adotam estratégias e métodos que, uma vez provados eficientes, permanecem e aprimoram-se com o tempo. As mais bem-sucedidas demonstram estar afinadas com o próprio Enem, no sentido de que esse exame tem exigido dos estudantes algo diferente do tradicional vestibular ao buscar estimular mais o raciocínio lógico e uma visão abrangente do conhecimento. O próprio MEC, ao reformular o Enem, declarou a intenção de induzir a reestruturação dos currículos do ensino médio.

As escolas públicas de êxito, por sua vez, provam que é possível, sob determinadas circunstâncias, superar adversidades. Há um espaço de ação que é da instituição de ensino e não depende unicamente de decisões político-administrativas do Poder Executivo local. Gestores educacionais comprometidos com a excelência costumam obter resultados acima da média dentro de um mesmo município, como o provam as escolas mais bem classificadas no Enem 2010.

A ação conjunta do poder público e da sociedade é o caminho mais curto para uma educação de qualidade para todos desde o nível fundamental. Políticas públicas eficientes de um lado e comprometimento por parte das escolas (gestores, professores, estudantes, funcionários, familiares de alunos) de outro podem garantir não apenas maior número de notas elevadas em exames nacionais, como o Enem, mas também êxito na educação do país como um todo.