Correio Braziliense, n. 19260, 18/02/2016. Economia, p. 10

Para governo, corte de nota é temporário

O Ministério da Fazenda tentou minimizar o rebaixamento do Brasil pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P), de BB+ para BB, colocando o país entre os ativos considerados lixo pelos investidores. Para o governo, o corte na nota de crédito “é temporário e será revertido tão logo os resultados das medidas em andamento comecem a produzir efeitos na economia, levando ao reequilíbrio fiscal e à recuperação do crescimento”. A perspectiva da agência, no entanto, é negativa, o que significa que, se houver mudança, é mais provável que seja para rebaixar ainda mais o país.
Em nota, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, destacou que o rebaixamento não “altera a perspectiva de recuperação da economia a médio prazo” e apresentou uma série de medidas para retomar o reequilíbrio fiscal. “O governo destacou os avanços já obtidos. “O esforço fiscal realizado em 2015 engloba a redução dos gastos públicos e a recuperação das receitas, e totalizou R$ 134 bilhões. As despesas discricionárias foram reduzidas em R$ 82,6 bilhões em relação ao previsto na Lei Orçamentária Anual. As despesas obrigatórias foram ajustadas em R$ 25,7 bilhões. Do lado da receita, houve aumento de R$ 25,7 bilhões em revisões de desonerações, atualizações de taxas e tributos”, listou.
A Fazenda explicou que a prioridade para 2016 é a aprovação das propostas de emendas constitucionais da Desvinculação das Receitas da União (DRU) e da Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras (CPMF), que tramitam no Congresso. Além disso, assegurou que propostas para dar sustentabilidade ao sistema previdenciário a médio e longo prazos serão encaminhadas ao Congresso até o fim de abril.
“O governo trabalha, ainda, em um conjunto de propostas de regras fiscais que contemplarão, entre outras medidas, a limitação do crescimento das despesas primárias a médio prazo”, assinalou o ministério. Essas medidas, emendou, serão capazes de “reduzir as incertezas fiscais, melhorar os níveis de confiança, diminuir as taxas de juros de longo prazo e a volatilidade do câmbio, condições fundamentais para a retomada dos investimentos”.
O ministério prometeu também o desenvolvimento de um melhor ambiente de negócios, com ações legislativas de caráter estrutural para aumentar a eficiência, previsibilidade e produtividade da economia. Há, segundo a pasta, uma busca pelo aperfeiçoamento de marcos regulatórios e de programas de investimento em logística e energia, que visam atrair recurso importantes para a recuperação da economia.
A nota ainda ressaltou que, pelo tamanho e diversidade da economia brasileira, a estratégia de recuperação do crescimento “é gradual e envolve várias iniciativas”, entre elas, aumentar o investimento em educação, viabilizar a maior participação do Brasil no comércio mundial e melhorar a competitividade do setor manufatureiro.

 

Reação parlamentar

 

No Congresso, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), lamentou, em plenário, a decisão da Standard & Poor’s de rebaixar novamente a nota de crédito do Brasil. Ele ressaltou que a decisão foi tomada depois de a agência de risco avaliar que o processo de ajuste da economia brasileira não alcançará os objetivos expostos ou buscados pelo governo. O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), considera que o rebaixamento “traduz o desastre que é o atual governo”. “O mercado, a exemplo dos brasileiros que sofrem com desemprego e inflação, não confia em Dilma”, afirmou. Já o líder do PT na Casa, senador Humberto Costa (PE), afirmou que o rebaixamento do Brasil era aguardado. Costa ressaltou, no entanto, que o diálogo entre os diferentes partidos, inclusive com a oposição, “naturalmente vai ajudar a reverter a situação econômica”.

_______________________________________________________________________________________________________

Calote no radar

Rodolfo Costa

As empresas brasileiras que precisarem tomar empréstimos no exterior vão enfrentar um quadro bastante adverso com o novo rebaixamento do país pela Standard & Poor’s (S&P). O crédito ficará mais caro e escasso. Com isso, projetos de investimentos tenderão a ser adiados, restringindo a oferta de vagas e contribuindo para a redução da renda dos trabalhadores. “Teremos tempos ainda mais difíceis pela frente”, disse Hugo Monteiro, da BullMark Financial Group. Para ele, a perspectiva é de que o quadro econômico se agrave, com a recessão fazendo estrago maior na vida das empresas e dos consumidores.
O analista chamou a atenção ainda para a disparada da dívida pública. Como o governo terá mais dificuldade para se financiar no mercado, será obrigado a emitir títulos para conseguir honrar seus compromissos em dia. O resultado será mais desconfiança e possíveis novos rebaixamentos do país, uma vez que o endividamento atingirá níveis alarmantes, de mais de 70% do Produto Interno Bruto (PIB), índice característico de países à beira do calote.
“Há custo elevado para o governo pegar dinheiro emprestado no mercado. Se a estrutura de dívida e de pagamento piora, os credores cobrarão mais para emprestar. Se não quiser emitir mais títulos para se financiar, o governo terá que ampliar a arrecadação por meio de impostos. Qualquer que seja a alternativa, é ruim para o país”, afirmou Monteiro. O ideal, acrescentou, seria um ajuste fiscal consistente. Como ele não existe, o país paga caro.
O rebaixamento do Brasil pela S&P, no entanto, não surpreendeu o mercado financeiro. Segundo o diretor de pesquisa econômica da GO Associados, Fabio Silveira, os investidores já vinham antecipando a decisão da agência. Isso não diminui, porém, a preocupação dos impactos da medida na economia. “O fato em si implica em adiamento da retomada do crescimento. Fica mais distante observar no horizonte quando o país sairá da recessão”, frisou, reforçando a expansão do PIB em 2017, mesmo que mínima, se tornou mais difícil.
Na opinião de Silveira, o país chegou ao ponto em que o aumento de carga tributária será um “mal necessário” para evitar um “mal ainda maior”. “Temos muitas despesas contratadas e menos certezas de receitas para fazer frente aos gastos. Corremos o risco de que vários direitos assegurados pela constituição podem não ser atendidos, como serviços públicos de saúde e educação e o pagamento de salários aos servidores”, disse.

_______________________________________________________________________________________________________

Bolsa cai mil pontos em minutos

Simone Kafruni

Um movimento de pânico tomou conta das bolsas de valores tão logo a agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P) anunciou o novo rebaixamento do Brasil. O Ibovespa, que mede a lucratividade das ações mais negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) e registrava alta de mais de 3%, chegou cair 1 mil pontos em questão de minutos. Aos poucos, porém, a calmaria voltou e o saldo final foi até positivo, devido aos resultados positivos dos mercados internacionais, influenciados pela alta do preço do petróleo.
A Bovespa encerrou o pregão com alta de 1,67%, aos 41.630 pontos, o nível mais elevado desde 6 de janeiro. O dólar não sofreu abalos e registrou queda de 2,15%, cotado a R$ 3,983 para venda. Mas, no entender dos especialistas, o nervosismo tenderá a voltar aos mercados diante do agravamento da recessão econômica e da possibilidade de o Brasil sofrer novos cortes em sua nota de crédito.
Tanto o Banco Barclays quando a Nomura Securities já esperam que a própria S&P, além de outras agências, promova mais um rebaixamento do país até o fim do ano. A justificativa das instituições é a de que a crise política chegou a tal ponto, que será muito difícil para o governo promover qualquer mudança tangível ao curto prazo na política fiscal. “Os acontecimentos que tiveram lugar desde o fim de 2015 sugerem fortemente que a sequência de más notícias sobre os ratings do Brasil está longe de terminar”, afirmou Mario Robles, analista da Nomura.
Para ele, o Brasil está pronto para mais uma má notícia em 2016. “Acreditamos ser provável que a Moody’s se junte à S&P e à Fitch na desclassificação da nota do país”, disse. Trata-se de um retrocesso e tanto. Até bem pouco tempo, o Brasil era citado como exemplo para o mundo, por ter conseguido domar a inflação, retomar o crescimento e, principalmente, distribuir renda. Hoje, o que se vê é exatamente o contrário: recessão profunda, carestia, desemprego e empresas em dificuldade.
Na avaliação de Fábio Silveira, diretor de pesquisa econômica da GO Associados, o novo rebaixamento do Brasil evidencia a total incapacidade dos poderes Executivo e Legislativo de retirarem a economia do atoleiro. “Os agentes econômicos não querem saber se quem está no comando do país é de partido A, B ou C. A redução da nota de crédito veio porque há a percepção de que somos incapazes de sinalizar um equilíbrio fiscal. Não há um diálogo entre o governo federal e o Congresso que aponte para um ajuste minimamente sério”, criticou.
A S&P foi a primeira a tirar o grau de investimento do Brasil, em setembro do ano passado. Ontem, derrubou a nota de BB+ para BB, com perspectiva negativa. Em dezembro, o país foi rebaixado pela agência Fitch. Na classificação da Moody’s, o Brasil segue com grau de investimento (Baa3), mas a agência já avisou que pode cortar a nota do país a qualquer momento.