O Estado de São Paulo, n. 44.691, 26/02/2016. Política, p. A6

Mônica liga Odebrecht a caixa 2 na Venezuela

Mulher e sócia de João Santana afirma que empreiteira pagou por campanha de Chávez

Por: Ricardo Brandt, / Fausto Macedo / Mateus Coutinho

 

A empresária Mônica Moura, mulher e sócia do marqueteiro João Santana, afirmou à Polícia Federal que, em 2011, “foi orientada” a procurar Fernando Migliaccio, então executivo da Odebrecht e apontado pelos investigadores como pagador de propinas da empreiteira no exterior, para receber parte de valores referentes à campanha à reeleição de Hugo Chávez (morto em 2013) na Venezuela.

O dinheiro foi depositado na conta Shellbill Finance, que João Santana abrira em 1998 na Suíça. Segundo Mônica, a campanha chavista teve “um alto custo”: US$ 35 milhões. Ela admitiu que “grande parte desse valor foi recebida de maneira não contabilizada”. A empresária afirmou que, “diante das dificuldades de pagamento”, vários doadores efetuavam repasses. Ela definiu Migliaccio como “um executivo da Odebrecht no Brasil que colaboraria no custeio de parte da campanha (de Chávez)”.

Migliaccio foi preso no dia 17 de fevereiro em Genebra tentando fechar contas bancárias, segundo autoridades daquele país. Offshores controladas por ele teriam sido usadas para pagamentos de valores ilícitos e lavagem de dinheiro. Uma delas seria a Klienfeld.

Segundo Mônica, em 2011 ocorreu a maior movimentação na conta Shellbill. Naquele ano, disse, o casal fez três grandes campanhas presidenciais: Hugo Chávez (Venezuela), José Eduardo Santos (Angola) e Danilo Medina (República Dominicana).

A Odebrecht afirmou que desconhece “as tratativas mencionadas por Mônica Moura em seu depoimento.”

João Santana e Mônica estão presos desde terça-feira, um dia depois de deflagrada a Operação Acarajé, 23.ª fase da Lava Jato. Na manhã de ontem, ele reconheceu ser dono da Shellbill, na Suíça, e disse que os valores recebidos em suas contas foram por serviços prestados a campanhas eleitorais no exterior, entre elas a de Angola e do Panamá. Ele confirmou recebimentos da Odebrecht e do lobista Zwi Skornicki, apontado pela investigação como operador de propinas do esquema na Petrobras.

“O mais importante de tudo é que eles admitiram erros”, afirmou o criminalista Fábio Tofic, que defende o casal. “Admitiram ter recebido recursos no exterior de conta não declarada.” A força-tarefa da Lava Jato, no entanto, suspeita que o casal tenha recebido dinheiro desviado da Petrobras.

Ouvido por cerca de três horas, Santana disse que abriu a conta Shellbill “em 1998 para receber recursos de uma campanha na Argentina e foi a forma como ele tinha para receber”. “Na época achava que não tinha problema, porque era recurso recebido em outros países. Ele achava que não tinha problema em ser conta não declarada”, disse Tofic.

A Lava Jato aponta o recebimento de US$ 7,5 milhões, entre 2012 e 2014, nessa conta de dois investigados por corrupção na Petrobras, o Grupo Odebrecht e o operador de propinas do estaleiro Keppel Fels, Zwi Skornicki - também preso na Operação Acarajé.

 

Depoimento

“O mais importante é que eles (João Santana e Mônica Moura) admitiram erros”

Fábio Tofic

ADVOGADO DO CASAL

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Moro quer ter acesso à conta da Suíça

Por: Mateus Coutinho / Ricardo Brandt

 

O juiz da Lava Jato, Sérgio Moro, determinou à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal que se manifestem sobre o pedido da defesa pela revogação da prisão temporária do marqueteiro do PT João Santana e da mulher dele e sócia, Mônica Moura. No despacho, o juiz ainda manda o casal apresentar os extratos da conta da offshore Shellbill Finance mantida por eles na Suíça. Os dois autorizaram o acesso às contas.

Até agora, a Lava Jato só utilizou os dados da conta da empresa no Citibank nos Estados Unidos, que não foi declarada para as autoridades brasileiras, para apurar as suspeitas de que o marqueteiro das campanhas presidenciais de Lula (2006) e de Dilma (2010 e 2014) teria recebido recursos ilícitos do esquema de corrupção na Petrobras no exterior.

“Para melhor análise deste Juízo, seria ideal que fossem disponibilizados pelos investigados e sua defesa os extratos completos da conta em nome da offshore Shellbil S/A, no Banque Heritage, na Suíça, já que somente se dispõe das transações efetuadas pelo banco correspondente nos Estados Unidos”, disse Moro no despacho.

Santana e sua mulher estavam trabalhando na campanha à reeleição do presidente da República Dominicana e voltaram ao Brasil após a deflagração da 23.ª fase da operação. /M.C. e R.B.

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Empreiteira atuou em obra de sítio de Atibaia

 

A empreiteira Odebrecht confirmou ontem por meio de nota que participou das obras do sítio de Atibaia, no interior de São Paulo, frequentado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a família dele, conforme reportagem publicada ontem pelo jornal Folha de S.Paulo.

A reforma foi realizada na propriedade no ano de 2010, quando Lula exercia seu segundo mandato na Presidência.

No texto, a construtora afirma ter descoberto, após realizar uma apuração interna, que o engenheiro da Odebrecht Frederico Barbosa trabalhou no sítio atendendo a um pedido feito por um superior da empresa.

A empreiteira, no entanto, não revelou o nome de quem teria dado essa ordem a Barbosa. O Estado voltou a questionar a Odebrecht sobre quem era o “superior” citado pela empresa, mas não obteve resposta.

De acordo com a Odebrecht, o engenheiro realizou “acompanhamento técnico de obras no sítio” e “apoiou a mobilização de pessoas envolvidas na execução dos serviços, que foram remuneradas pelo responsável pela obra” na propriedade.

Ainda de acordo com a companhia, o engenheiro Frederico Barbosa trabalhou no imóvel por aproximadamente um mês - o texto fala da segunda quinzena de dezembro de 2010 até a meados de janeiro de 2011.

Na nota, a empreiteira ainda diz que não recebeu qualquer pagamento pelos serviços prestados no sítio de Atibaia. “A Construtora Norberto Odebrecht não recebeu qualquer pagamento por esses serviços, nem custeou de qualquer modo insumos ou materiais utilizados”, diz o texto da construtora.

A reportagem também questionou novamente a empresa sobre os motivos que a levaram a trabalhar na obra da propriedade frequentada por Lula sem receber remuneração, mas não teve respostas da empreiteira até a conclusão desta edição.

Procuradores que investigam o sítio suspeitam que o imóvel, que tem 173 metros quadrados, pertença a Lula.

A propriedade, no entanto, está registrada em nome dos empresários Fernando Bittar e Jonas Leite Suassuna Filho, que são sócios do filho mais velho do ex-presidente, o Lulinha. Por meio de sua assessoria, Lula nega ser dono do sítio e afirma frequentar a propriedade aos fins de semana.