Título: Ajuda daqui, acordo de lá
Autor: pinto, Paulo Santos
Fonte: Correio Braziliense, 03/10/2011, Política, p. 2

contra a crise econômica que assola o continente, mas cobrará avanços nas negociações para o livre comércio com o Mercosul e uma posição sobre o conflito Israel-Palestina

Bruxelas ¿ A presidente Dilma Rousseff chegou ontem à capital da Bélgica para uma visita de dois dias em que buscará estabelecer uma relação de igualdade com os líderes europeus, com uma agenda que, segundo o Ministério das Relações Exteriores, inclui discussões sobre a economia mundial, desenvolvimento sustentável, meio ambiente e até mesmo os desdobramentos recentes no conflito entre Israel e Palestina. Dilma oferecerá ajuda à União Europeia contra a crise econômica mundial, mas também cobrará avanços no acordo de livre comércio entre o bloco e o Mercosul. Ela está acompanhada dos ministros das Relações Exteriores, Antonio Patriota; do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel; das Comunicações, Paulo Bernardo; da Cultura, Ana de Holanda; da Secretaria de Comunicação da Presidência, Helena Chagas; e da Ciência e Tecnologia, Aloízio Mercadante.

Se depender dos números, não será difícil para Dilma convencer os europeus da igualdade de condições nas conversas e negociações. O Brasil de hoje não só busca investimentos. É também um país que busca diversificar os próprios investimentos. O estoque de capital brasileiro nos países europeus é hoje de US$ 75 bilhões. Se ainda é bem menos do que os US$ 177 bilhões dos países europeus no Brasil, as perspectivas apontam para o equilíbrio. Dos dez maiores investidores na União Europeia, o Brasil foi o que mais cresceu no ano passado, com aporte de US$ 6 bilhões no ano. Os europeus investiram US$ 8 bilhões no Brasil em 2010.

Essa tendência à equiparação de forças no diálogo entre o Brasil e as principais potências globais não é, porém, um processo isento de turbulências. A visita de Dilma ocorre depois de a presidente ter feito críticas à implementação de soluções para a crise da dívida grega, cujos impasses têm colaborado para colocar quase todos os países do continente em recessão ou no mínimo estagnação econômica.

No dia 22 de setembro, em Nova York, aonde foi para a abertura da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Dilma afirmou que faltava vontade política por parte dos líderes europeus para ajudar a Grécia. Em razão disso, ela disse que o governo brasileiro "claramente" não planeja colocar dinheiro na linha de estabilidade financeira europeia. Os europeus responderam que não esperam nenhuma nova iniciativa do Brasil nesse sentido.

Tom amistoso O tom da visita nos próximos dois dias tende, contudo, a ser muito mais ameno, sem o clima de enfrentamento característico do principal fórum multilateral do mundo, a ONU. O presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, e o presidente do Conselho Europeu, Herman van Rompuy, recebem hoje Dilma para um jantar no Castelo Val Duchesse. Os compromissos mais densos de trabalho entre eles ocorrerão amanhã. Esta é a 5ª Cúpula Brasil-União Europeia, um evento que ocorre todos os anos, desde 2007, alternadamente, no Brasil e na Europa.

Deverão ser assinados com os europeus acordos nos setores de desenvolvimento tecnológico, políticas espaciais, transporte aéreo, cultura e turismo. Haverá discussões também para a dispensa de vistos de trabalho em períodos curtos.

A visita de hoje e de amanhã não é, porém, para falar apenas de União Europeia. Dilma está na capital da Bélgica e será recebida hoje à tarde pelo primeiro-ministro do país, Yves Leterme. O encontro renderá um acordo para facilitar a obtenção de bolsas de estudo por parte de estudantes brasileiros em universidades belgas. Amanhã, a comitiva brasileira é convidada para um almoço pelo rei da Bélgica, Albert II, e pela rainha, Paola. A programação de amanhã, antes de Dilma embarcar para a Bulgária, inclui ainda o encerramento do V Fórum Empresarial Brasil-União Europeia e a abertura do festival Europalia, no qual o Brasil é homenageado.

Copa na pauta

Hoje de manhã, antes da cerimônia oficial de chegada, Dilma tem um encontro fora da agenda com o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke. No governo brasileiro, há grande insatisfação com as críticas que vêm sendo feitas pela Fifa ao Brasil pelos atrasos nas obras da Copa e também por questões institucionais. Não agrada à entidade maior do futebol, por exemplo, a ideia de ter de conceder meia-entrada a estudantes e idosos nos jogos. No governo afirma-se, porém, que essas regras são determinadas por leis estaduais, e que foram feitas várias concessões à Fifa na Lei Geral da Copa enviada ao Congresso Nacional. A conversa entre Valcke e Dilma tende a ser uma das mais complicadas dessa viagem de uma semana, que se encerra na Turquia.

Parada obrigatória

Depois de chegar a Bruxelas, às 13h30, a presidente Dilma Rousseff foi para o hotel, onde almoçou. Às 15h30, visitou o Museu Magritte (1898-1967), pintor belga da escola surrealista, que tem entre os grandes expoentes o espanhol Salvador Dalí (1904-1989). A visita foi guiada pelo diretor do Museu, Michel Draguet. Segundo uma das pessoas da comitiva, Dilma interessou-se pelas informações que ouviu do diretor sobre a resistência de Magritte ao regime nazista nas décadas de 1930 e 1940.

A Alemanha nazista invadiu a Bélgica durante a Segunda Guerra Mundial. Uma das obras que Dilma olhou por mais tempo foi um quadro pintado durante a Grande Depressão que se seguiu à crise de 1929, que derrubou as cotações das ações na Bolsa de Nova York. Em viagens de trabalho, Dilma faz questão de reservar um tempo para visitar museus. Na visita a Nova York, no mês passado, foi ao Metropolitan Museum of Art. Antes do fim da viagem, passou pelo Museum of Modern Art. A visita de ontem ao Museu Magritte durou cerca de uma hora e meia. Depois disso, Dilma voltou para o hotel, onde descansou.