Correio Braziliense, n. 19259, 17/02/2016. Política, p. 6

Tragédia sanitária

 
SAÚDE » Dados do Ministério das Cidades apontam que 42% dos brasileiros de zonas urbanas não possuem sistema de esgotamento sanitário

Por: NÍVEA RIBEIRO

 

ESPECIAL PARA O CORREIO

 

Quase metade dos brasileiros ainda não tem coleta de esgoto em casa. De acordo com o Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgotos de 2014, divulgado ontem pelo Ministério das Cidades, 42,4% da população de áreas urbanas não é atendida pelas redes coletoras. As discrepâncias regionais chamam a atenção: no Sudeste, 83,3% são beneficiados, frente a 9,9% na Região Norte do país. Já o abastecimento de água, fator importante para combater o Aedes aegypti, chegou a 93,2% dos moradores de zonas urbanas em todo o país.

A meta de ampliação da coleta de esgoto, que estabelece que o serviço deve chegar a 93% até 2033, é difícil de ser atingida, assume o secretário nacional de Saneamento Ambiental, Paulo Ferreira. O prazo foi definido em 2013, no Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab). Outros objetivos são a universalização do abastecimento de água até 2023 e também da coleta e disposição adequada de resíduos sólidos urbanos até 2033.

“Eu acho que, neste ritmo, teremos dificuldade de atingir a meta, especialmente no que diz respeito a esgoto, que é uma obra mais demorada. Esperamos que, com a melhora da economia, consigamos recuperar a velocidade e a quantidade dos investimentos”, afirmou Ferreira. “No momento, olhando o horizonte de 2033 com os olhos de hoje, ainda vejo uma certa dificuldade.”

Em 2014, o investimento total desembolsado em serviços de água e esgotos chegou a R$ 12,2 bilhões, crescimento de 16,7% em relação a 2013. Os municípios e estados, também responsáveis, contribuíram com, somente, cerca de R$ 1 bilhão desse total. “Há uma forte dependência. Podemos analisar o problema tarifário. Temos municípios que não cobram água e esgoto. Há uma visão, às vezes, inadequada de que água é de graça, sendo que é um serviço que tem valor econômico. Todos têm direito e todos pagam uma tarifa social, ainda que seja menor”, esclareceu o secretário.

 

Aedes

O professor Pedro Luiz Tauil, do Núcleo de Medicina Tropical da Universidade de Brasília, explica que dois elementos do saneamento básico são fundamentais para o controle do mosquito, transmissor de dengue, zika e chikungunya: o abastecimento regular de água e a coleta adequada de resíduos. “Não basta dizer que há abastecimento. Ele não pode ser intermitente, que obrigue as pessoas a coletarem e a armazenarem água. E, sem coleta de resíduos, não tem lugar no mundo que vá combater o Aedes”, diz Tauil. “Além disso, é necessária a melhoria das condições de habitação. Cortiços, invasões, mocambos e favelas são estruturas que favorecem a proliferação.”

Segundo Ferreira, do Ministério das Cidades, a higiene das casas é o que mais preocupa diante da atual epidemia, já que o saneamento trabalha a longo prazo. “Dois terços da contaminação ocorrem dentro dos quintais. Temos que eliminar o foco do mosquito, criar condições para que ele não se desenvolva. O saneamento tem uma função importante porque, se você tem coleta de esgoto, a probabilidade de ter água parada é muito menor”, completou.

No entanto, Tauil lembra que o Aedes deve ser combatido antes das metas de saneamento básico, por meio de novidades tecnológicas, como a criação de mosquitos transgênicos estéreis. “Estamos

 

Saneamento no Brasil

Em 5.114 municípios brasileiros, estima-se que 156,4 milhões de pessoas tenham acesso à abastecimento de água. Confira o índice (%) de atendimento nas cidades

•Região      Água    Coleta de esgoto

•Norte    67,8    9,9

•Nordeste    89,5    31,1

•Sudeste    96,8    83,3

•Sul    97,3    44,4

•Centro-Oeste    96,7    51,7

•BRASIL    93,2    57,6