Valor econômico, v. 16, n. 3965, 17/03/2016. Política, p. A7

PGR vai analisar se investiga conversa gravada

Maíra Magro 

Carolina Oms

A Procuradoria-Geral da República vai analisar se abre investigação sobre a presidente Dilma Rousseff em razão de sua conversa com o ex-presidente Lula colhida em grampo autorizado pela Justiça.

Fontes graduadas avaliam que o juiz Sergio Moro poderia, sim, quebrar o sigilo da investigação e divulgar o seu teor. "Não há problema algum. O juiz pode decidir a qualquer momento sobre manter ou não o processo em sigilo", informou uma autoridade com competência na área. A única coisa que Moro não poderia fazer, segundo essa interpretação, seria começar a investigar apresidente pelo conteúdo da conversa, o que de fato não ocorreu.

O grampo foi colocado no telefone de Lula. Esse tipo de grampo o juiz concede autorização com prazo de 15 dias. Existe uma jurisprudência do Supremo Tribunal Federal segundo a qual, se a pessoa que é grampeada e ganha foro privilegiado no meio do prazo, a interceptação pode ser mantida por mais cinco dias após a concessão do novo foro.

Segundo especialistas, não tem problema de a Dilma aparecer. "Ela não era investigada. O que importa é saber que o alvo do grampo não tinha foro privilegiado e neste caso o alvo era o Lula".

O ministro Marco Aurélio Melo, do Supremo Tribunal Federal, havia dito, mais cedo, que ainda é cedo para opinar: "Temos que aguardar primeiro para constatar a veracidade desses áudios e, segundo, as instituições atuarem e percebermos as consequências, se foi um fato verídico".

À noite, Mello colocou em dúvida as gravações. "Quem teria determinado esse grampo? Seria uma prova ilícita?", questionou o ministro. Para ele, diante da gravidade das falas, é preciso submeter as interceptações a uma perícia.

A PGR e a presidência do STF não vão se manifestar. O procurador-geral, Rodrigo Janot, deu ordem de discrição total aos membros do Ministério Público. A ministra Rosa Weber, citada nas conversas do ex-presidente Lula, não está no Supremo e o gabinete não conseguiu contato com ela.

O ministro Teori Zavascki não vai comentar. O gabinete dele não recebeu nada ainda relacionado ao ex-presidente Lula e esse caso.

Para o especialista em Direito Constitucional e professor da FGV, Thiago Bottino, Moro não poderia divulgar os áudios. "Divulgar interceptação telefônica é crime, mas Moro foi no processo eletrônico e colocou em um site onde só obtém os documentos quem tem chaves de acesso específicas, mas ele sabe que não há controle sobre essas chaves de acesso e qualquer jornalista que cobre a Lava-Jato têm essas senhas". Para ele, Moro podia imaginar que as gravações vazariam, pois isso já aconteceu outras vezes e defende que o juiz "deveria ter mais cuidado. A decisão sugere que ele sabia que ia vazar. Acho que é irregular que ele tenha feito isso, ainda que de maneira formalmente correta", completa.

Mais cedo, enquanto julgava o rito do impeachment, o ministro do Supremo Gilmar Mendes aproveitou a leitura de seu voto para criticar a indicação para o comando da Casa Civil do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Gilmar Mendes afirmou que a iniciativa da presidente Dilma Rousseff de promover a troca na Casa Civil "causa desconforto" ao Supremo, externando a avaliação de que Lula busca refúgio em foro privilegiado deixando a investigação em primeira instância da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal (PF), da qual o petista é alvo. Na avaliação de Gilmar Mendes, a

nomeação de Lula para o primeiro escalão do governo ocorre "a pretexto a dar sobrevida ao governo e dar algum conforto no foro privilegiado" ao ex-presidente.

"É quase uma acusação de que esta Corte será complacente com malfeitos", disse o ministro durante a leitura de seu voto, no qual fez críticas às estratégias desencadeadas pelo Palácio do Planalto, com nomeações para ministérios e distribuição de cargos, na tentativa de evitar o impeachment da presidente no Congresso.

 

Também durante esta votação no STF, o ministro Marco Aurélio Mello afirmou que não se pode "pensar pequeno" e considerou que a ida do ex-presidente para o comando da Casa Civil "uma tentativa de reverter o quadro de impasse nacional no campo político pela ausência de entendimento entre o Executivo e o Legislativo".