O globo, n. 30130, 03/02/2016. Economia, p. 21

INDÚSTRIA LADEIRA ABAIXO

Produção cai 8,3% em 2015, maior queda em 13 anos. Nem alta de exportação deve evitar novo recuo
Por: LUCIANNE CARNEIRO

LUCIANNE CARNEIRO

lucianne. carneiro@ oglobo. com. br

 

A indústria brasileira registrou queda recorde de 8,3% na produção em 2015 — o maior tombo em 13 anos — e caminha para acumular três anos seguidos de retração, quando consideradas as previsões para 2016. Analistas de mercado dão como certa uma nova queda este ano, estimada em 3,8%. E nem em 2017 a recuperação estaria garantida: a média do mercado prevê crescimento de 1,5%, patamar longe de compensar as perdas recentes. Mas já há quem estime recuo no próximo ano, de 2%, como a MB Associados.

A sucessão de quedas na indústria ainda está longe do fim. Economistas estimam que a indústria terá novos recuos nos próximos meses — embora menos intensos — e algum sinal de recuperação só é esperado em meados do segundo semestre. O caminho para a reação da indústria passaria necessariamente pelo aumento das exportações, beneficiadas pelo dólar alto, mas seu impacto é considerado limitado, segundo especialistas. O peso das exportações na indústria — o chamado coeficiente de exportações, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI) — era de apenas 19,8% no terceiro trimestre de 2015.

A retração na indústria no ano passado foi ainda mais intensa que em 2009, quando o setor recuou 7,1% sob os efeitos da crise financeira internacional. A indústria voltou a operar no mesmo patamar de 2009 e está 19,5% abaixo de seu nível recorde, obtido em junho de 2013. O resultado do ano passado chama a atenção não apenas pela intensidade da perda, mas também pelo comportamento generalizado: 25 dos 26 setores tiveram taxas negativas. A única exceção foi a indústria extrativa, com alta de 3,9%.

— Infelizmente teremos que nos conformar em 2016 e 2017 com uma indústria que terá nível de produção de 2004 e 2005. Mesmo com algum crescimento no ano que vem, a indústria mal retomará o patamar de 2015. As consequências serão mais desemprego no setor, com pessoal realocado para outros setores, como serviços. Só que a indústria é o setor que mais concentra trabalho formal e vagas com renda maior — afirma o diretor de Pesquisa Econômica da GO Associados, Fabio Silveira.

Ele destaca que um dos entraves à recuperação é que o governo não tem como recorrer a fórmulas recorrentes para estimular o setor, como redução de juros ou diminuição da carga tributária. Neste cenário, os sinais de alento viriam das exportações de produtos como automóveis, têxteis e produtos industrializados. A retomada da economia argentina também teria efeito positivo.

 

RAZÕES PARA A CRISE SE MANTÊM

Para Leonardo Carvalho, técnico do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a solução para a crise do setor dependerá de ações de efeito mais lento, como redução do custo- Brasil e investimento em logística.

O pessimismo em relação a 2016 se explica porque fatores que comprometem o desempenho da indústria — como confiança em baixa de empresários e consumidores, crédito mais caro e mercado de trabalho mais fraco, com aumento de desemprego e queda na renda — se mantêm, segundo Carvalho:

— A indústria está parada desde o segundo semestre de 2010 e, mais recentemente, a situação se intensificou com problemas ligados à demanda. Já foram perdidos cinco anos desta década. Se as coisas continuarem em passo lento, e a solução do problema parece nebulosa, poderíamos ter mais um ano perdido, o de 2016.

Gerente da Coordenação de Indústria do IBGE, André Luiz Macedo avalia que a conjuntura econômica permanece com as mesmas características observadas ao longo de 2015. A alta na produção de bens duráveis em dezembro, de 9,4%, não deve ser interpretada como um alívio, já que a base de comparação é muito deprimida.

E há quem acredite que o fundo do poço ainda não foi alcançado, como o economista chefe da MB Associados, Sergio Vale. Na sua avaliação, os primeiros sinais de janeiro no setor de veículos “não dão alento para o resto do ano”. A Federação Nacional de Veículos Automotores (Fenabrave) divulgou que a venda de veículos novos caiu 38,8% em janeiro, frente a janeiro de 2015. Sua projeção é de recuo de 5,5% da indústria em 2016. Sem mudança política, diz Vale, há risco de queda em 2017:

— Dado que a incerteza política continuará durante todo o semestre, é difícil imaginar que consiga haver recuperação. O que se precisa urgentemente é uma mudança política. Sem isso a indústria afunda não apenas neste ano, mas também em 2017.

Economista do Instituto para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rafael Cagnin diz que “as exportações favorecem, mas não salvam”:

— O peso das exportações na indústria não é tão grande, então as exportações não são uma panaceia. É um fator favorável pela substituição de importações, mas precisamos lembrar que a economia internacional não está crescendo tanto.

Como reforçam Silveira, da GO Associados, e Sergio Vale, da MB Associados, o setor exportador não é capaz de alavancar a indústria sozinho.

— Nem as exportações conseguirão ser um alívio, pois a dependência do mercado doméstico ainda é maior — diz Vale.

Uma das preocupações é a perda de participação da indústria. Economista chefe da Rosenberg& Associados, Thais Zara lembra que a fatia da indústria no Produto Interno Bruto (PIB) caiu de 18% em 2005 para uma parcela de 12%.

Considerando apenas o mês de dezembro, a produção caiu 0,7% frente a novembro e 11,9% em relação a dezembro de 2014. Colaborou Marina Brandão, estagiária, sob supervisão de Lucianne Carneiro

 

Frase

“A indústria está parada desde o segundo semestre de 2010. (....) Já foram perdidos cinco anos desta década. ”

Leonardo Carvalho

Técnico do Ipea