Correio Braziliense, n. 19250, 08/02/2016. Política, p. 6

Cuidado na hora de declarar as deduções

IMPOSTO DE RENDA/ Erros básicos podem levar o contribuinte para as garras da malha fina. Fique atento e não crie muitas expectativas, pois os limites para despesas dedutíveis tiveram reajuste abaixo da inflação

 

ROSANA HESSEL

MARIANA AREIAS

 

 

O clima de animação do carnaval pode ter invadido o país, mas a contagem regressiva para o início do prazo da entrega do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) de 2016 já começou. Para não atrapalhar o zirigudum e evitar a água no chope dos foliões, é importante ficar atento na hora de lançar os gastos com despesas que podem ser deduzidas, como com dependentes, saúde, educação, empregado doméstico e a Previdência. Erros de digitação e falta de documentação são frequentes nesses casos e podem levar o contribuinte diretamente para as garras da malha fina.

A partir de 1° de março, o Leão passa a receber a Declaração de Ajuste Anual de 2016 referente ao ano-calendário de 2015. O último dia é 29 de abril. Quem não prestar contas com o Fisco até essa data estará sujeito à multa de 1% ao mês sobre o imposto devido, sendo que o valor mínimo é de R$ 165,74.

Especialistas lembram que, no caso das deduções, um erro de digitação, a omissão de dados ou a falta de comprovantes podem resultar em multas muito maiores. “É preciso ter cuidado, pois quando há desconfiança da Receita de fraude intencional, como o uso de recibos falsificados de médicos e de dentistas, por exemplo, a multa pode chegar a 150% do imposto devido. Isso porque o técnico que estiver avaliando os dados pode entender que houve dolo e achar que o contribuinte teve a intenção de lesar o Fisco”, alerta o advogado Alexandre Fiorot, diretor do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) no Espírito Santo. Esse tipo de ocorrência pode até acabar em processo criminal.

Este ano, o contribuinte pessoa física é obrigado a informar na declaração todos os CPFs de dependentes maiores de 14 anos e não mais que 16 anos. Ele também tem que declarar o CPF de todos os prestadores de serviços passíveis de dedução, como médicos e dentistas. São exigências para evitar fraudes com dependentes inexistentes ou que constam em mais de uma declaração e com recibos falsos.

Checagem

A Receita informa que, com a obrigatoriedade do CPF do prestador de serviço, ela vai cruzar com os dados dos clientes dos profissionais autônomos, que fazem a declaração pelo Carnê-Leão, mensalmente. Logo, se um deles não informar o CPF na declaração, tanto prestador quanto cliente, a malha fina é certa. É fundamental, portanto, ter todos os recibos em mãos mesmo após o envio da declaração, porque o Fisco pode pedi-los se encontrar alguma irregularidade.

O supervisor nacional do Imposto de Renda da Receita Federal, Joaquim Adir, avisa aos contribuintes para não deixarem tudo para a última hora. A conferência dos dados é outra dica do técnico para evitar erros de digitação. “Separe com antecedência todos os documentos e recibos para o preenchimento da declaração e verifique os dados para evitar erros antes de fazer o envio”, orienta, lembrando que a ferramenta do programa que checa pendências ajuda, mas não é suficiente.

A lista de despesas que podem ser deduzidas neste ano não mudou e inclui gastos com saúde, com educação, com dependentes e contribuição social para empregado doméstico. No entanto, a correção dos valores dos limites dedutíveis ficou muito abaixo da inflação oficial, de 10,67% no acumulado em 12 meses no ano passado, e medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) (veja o quadro). Até o desconto simplificado, para quem não precisar listar as deduções, foi corrigido abaixo do IPCA.

Pesquisas recentes revelam que o brasileiro trabalha 151 dias do ano apenas para pagar imposto. No entanto, a compensação que o Fisco concede para despesas que o contribuinte tem com serviços que o governo deveria prestar com mais qualidade, como a educação, é muito baixa. “O limite de dedução para gasto com ensino neste ano é de R$ 3.361,50, que chega a ser menor que a mensalidade de muitas escolas do país”, destaca Fiorot, do IBPT. De acordo com levantamento do Sindifisco, se a correção respeitasse a defasagem existente entre 1996 e 2015, esse valor deveria ser de R$ 6.132,04.

O advogado Amadeu Garrido de Paula, do escritório Garrido de Paula Advocacia, lembra que as deduções nunca refletiram os valores reais dos gastos dos contribuintes. “Infelizmente, os limites são muito baixos e corrigidos a taxas inferiores à da inflação. Com isso, o brasileiro está cada vez mais pobre”, critica.

Decepção

A servidora pública Verônica Lopes, 35 anos, que o diga. Ela costuma fazer a declaração completa para deduzir o plano de saúde privado e os gastos com consultas médicas e odontológicas ao longo do ano, mas sempre fica decepcionada com os valores das deduções. “Acho que poderíamos ser restituídos de forma mais justa”, afirma. Verônica nunca caiu na malha fina. “Tenho uma pasta e, durante o ano, vou colocando o que preciso declarar. Assim fica mais fácil e não corro riscos, pois, caso eu caia na malha fina, tenho todos os comprovantes”, completa.

As despesas médicas não têm limite, mas há exceções. Não podem ser incluídos na declaração gastos com veterinário, medicamentos, acupuntura, óculos, enfermeiros, viagem para tratamento médico ou com implante de silicone. Tome cuidado ao declarar as despesas com educação. Cursos de idiomas não podem ser deduzidos, por exemplo.

O diretor técnico da NK Contabilidade, Rogério Kita, orienta os contribuintes a utilizarem o modelo completo da declaração de ajuste para a dedução dessas despesas. Também podem ser descontadas no IR a pensão alimentícia, planos de saúde e odontológicos, pagamentos previdenciários com empregado doméstico e planos de previdência privada modelo PGBL. Nesse último caso, a dedução incide em até 12% da receita bruta depositada no fundo específico.

Defasagem

A defasagem na correção das deduções do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) também ocorre na tabela progressiva mensal usada para o desconto em folha. De acordo com o Sindifisco, o ajuste da tabela do IR não acompanha a inflação desde 1996. Nesse período, o custo de vida subiu 260,92% enquanto o Fisco fez correção de 109,63%. Se o ajuste levasse em conta os 72,17% de defasagem, os contribuintes que tivessem salário mensal de até R$ 3.250,29 seriam isentos para pagar o IR. No entanto, a tabela do ano-calendário de 2015 dá esse benefício para quem ganha até R$ 1.903,98.