O globo, n. 30129, 02/02/2016. País, p. 6

O ‘ IRRISÓRIO’ SALÁRIO DE DIRCEU

Ex- ministro diz a Sérgio Moro que recebia de empresas em troca de seu nome e prestígio
Por: Renato Onofre/ Luiza Souto

 

RENATO ONOFRE E LUIZA SOUTO

pais@oglobo. com. br

- SÃO PAULO E BRASÍLIA-

 

‘ Sem falsa modéstia, R$ 120 mil ( por mês) é irrisório”, disse o ex- ministro José Dirceu, ao explicar ao juiz Sérgio Moro os valores cobrados por ele para prestar consultoria de empresas investigadas na Operação Lava- Jato. Acusado de receber propina no esquema de corrupção da Petrobras, Dirceu depôs por quase três horas à Justiça Federal na última sexta- feira.

Os vídeos foram divulgados ontem. O ex- ministro admitiu ter recebido favores de lobistas, mas negou relação com contratos da estatal.

Questionado por Moro sobre a razão de receber, em alguns contratos, R$ 120 mil por mês, disse que as empresas pagavam para usar seu nome e prestígio no Brasil e no exterior. O montante equivale a 136 salários mínimos ( R$ 880) ou a 1.560 benefícios básicos ( R$ 77) do Bolsa Família. Moro quis saber como o valor pago pela Engevix era definido:

— Sem falsa modesta, R$ 120 mil é irrisório. Quero aproveitar para declarar que estou sendo alvo de notícias de que enriqueci. ( Dizem) que tenho um patrimônio de R$ 40 milhões. A minha empresa faturou R$ 40 milhões, 85% são despesas, são custeios. Eu ganhei o que ganha qualquer consultor ou advogado, R$ 60 mil, R$ 80 mil por mês.

O petista foi o último dos 15 réus denunciados na 17 ª fase da Lava- Jato, batizada de “Pixuleco”, ouvido por Moro. Ele é suspeito de ter recebido mais de R$ 11 milhões de propina através de falsos contratos de consultoria. Dirceu explicou que traçava panoramas políticos e econômicos do Brasil e da América Latina aos seus clientes.

— Não vou dizer para o senhor que fazia relatórios, que eu dava um tipo de consultoria que eu não dava, porque vou faltar com a verdade. Vou fazer um falso testemunho — explicou — Eu emprestava meu nome, meu prestígio, e orientava essas empresas. Eu não fazia um trabalho que consultor faz de cavar uma licitação, cavar um contrato

Dirceu disse que, no julgamento do mensalão, sua vida financeira foi “devastada” pela Receita Federal e que praticamente recebeu um “atestado de honestidade” do órgão. Porém, admitiu que errou ao aceitar favores do lobista Milton Pascowitch, um dos operadores do esquema de pagamento de propinas da Petrobras que pagou a reforma da casa do ex- ministro em Vinhedo, no interior paulista. Ele negou ainda ter indicado Renato Duque à Diretoria de Serviços da Petrobras.

— Não se pode dizer que indiquei o senhor Renato Duque, mas também não se pode dizer que não tive participação. Vou tomar com base o depoimento do ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No governo, a indicação vem da base partidária do governo, de ministros, parte da equipe de transição, não é uma indicação exclusiva.

Ele admitiu ter voado em aviões cedidos pelo lobista Júlio Camargo em 2010 e 2011. Mas negou ter feito 113 viagens.

 

DIRCEU PEDE EXTINÇÃO DE SUA PENA

Dirceu pediu ontem ao ministro do Supremo Tribunal Federal ( STF) Roberto Barroso, relator do mensalão, a extinção de sua pena, alegando que já cumpre os requisitos. Em outubro de 2015, um mês após Dirceu virar réu em ação penal da LavaJato, o procurador- geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao STF a regressão do regime de prisão do petista pela condenação do mensalão, devido ao seu envolvimento na Lava- Jato. Dirceu cumpria pena de sete anos e onze meses em regime aberto desde novembro de 2014. Já estava em regime domiciliar, mas Janot pediu que voltasse ao fechado. Hoje, está preso, mas por ordem de Morto.

“Sem falsa modéstia, R$ 120 mil é irrisório. Eu ganhei o que ganha qualquer consultor ou advogado: R$ 60 mil, R$ 80 mil por mês”
José Dirceu

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LAVA- JATO CONDENA EX- DIRETOR DA PETROBRAS

Zelada terá que cumprir 12 anos e 2 meses de prisão por receber propina
Por: Renato Onofre/ Dimitrius Dantas
 
- SÃO PAULO - O juiz Sérgio Moro condenou ontem o ex- diretor da área Internacional da Petrobras Jorge Luiz Zelada a 12 anos e dois meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro. Ele está preso desde o início de julho, na 15 ª fase da Operação Lava- Jato. É acusado de receber propina envolvendo contrato de navios- sonda da Petrobras.

O ex- diretor mantinha 12 milhões de euros numa conta secreta no exterior. Moro determinou o confisco de R$ 123 milhões de Zelada.

Moro ainda condenou o exgerente da Petrobras Eduardo Musa a 11 anos e oito meses. Em delação premiada, Musa contou como transferiu pagamentos de propina ao ex- diretor. Ele foi um dos primeiros a confirmar que o empréstimo do Banco Schahin ao pecuarista José Carlos Bumlai serviu para pagar dívidas de campanha do PT.

 

CONTRATO DE NAVIO- SONDA

Zelada e Musa teriam aceitado receber propina para favorecer a contratação da empresa Vantage Drilling Corporation, comandada pelo americano Nobu Su, no afretamento do naviosonda Titanium Explorer, por US$ 1,816 bilhão. O pagamento da propina, porém, não foi feito pela americana Vantage, intermediária do afretamento, que se recusou a fazê- lo. Foi feito diretamente com a proprietária da embarcação, a Taiwan Maritime Transportation, também comandada por Nobu Su.

O contrato foi fechado em 2009, e parte da propina, repassada a Hamylton Padilha, que pagou os dois funcionários da Petrobras.

Em outubro, o GLOBO mostrou que Zelada se referia à propina como “confetes”. Em mensagem intitulada “Carnaval”, ele é informado que R$ 1,026 milhão de “confetes” foram depositados em sua conta.

Os documentos integram uma segunda investigação que apura o pagamento de propina relativa a contratos de exploração do Campo de Mexilhão, na Bacia de Santos, a maior reserva da gás natural do país. Há indícios da participação de empresas norueguesas no esquema de corrupção. Zelada seria um dos beneficiários finais.

 

MORO PRORROGA PRISÃO

O juiz condenou ainda os lobistas João Augusto Rezende Henriques e Hamylton Pinheiro Padilha Júnior, respectivamente, a seis anos e oito meses, e a 12 e 2 meses de reclusão. Devido a acordos de colaboração, Musa, Henriques e Padilha cumprirão a pena em casa, em regime aberto.

Ainda ontem, Moro prorrogou por mais cinco dias a prisão de dois envolvidos na 22 ª fase da Lava- Jato: Ademir Auada e Nelci Warken permanecerão presos até sexta- feira. Segundo Moro, há provas de que Auada praticou fraude por meio da empresa Mossack & Fonseca, considerada uma fábrica de empresas direcionadas a lavagem de dinheiro. Nelci está ligada à Murray, empresa dona de um tríplex no Condomínio Solaris, no Guarujá. ( Renato Onofre e Dimitrius Dantas, sob supervisão de Flávio Freire).