Valor econômico, v. 16, n. 3964, 16/03/2016. Política, p. A10

Fator Lula mantém PMDB em suspenso

Por: Raymundo Costa

Por Raymundo Costa | De Brasília

 

A virtual nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode levar uma parte do PMDB, especialmente do Senado, a apostar numa sobrevida do governo Dilma Rousseff. Lula é considerado habilidoso o bastante paraassegurar 171 votos para a presidente barrar o impeachment. Mas terá de demonstrar, na prática, que está em condições de apontar e negociar saídas para a crise econômica.

Até agora, o PMDB permaneceu calado sobre a possibilidade de Lula integrar o ministério. Nem o presidente do Senado, Renan Calheiros, se manifestou. Ele apostava suas fichas numa saída parlamentarista que preservasse o mandato da presidente Dilma, mas tudo indica que o Supremo Tribunal Federal, em sessão marcada para hoje, deve decidir que a mudança do sistema de governo só pode ocorrer se for aprovada em plebiscito.

Em convenção realizada no sábado, o PMDB estabeleceu um prazo de até 30 dias para decidir se fica ou sai do governo. Nesse período, nenhum filiado ao partido deve aceitar cargos, sob pena de expulsão. A presidente Dilma Rousseff decidiu desafiar a convenção pemedebista e formalizou convite para o deputado Mauro Lopes (PMDB-MG) assumir a Secretaria de Aviação Civil (SAC). Lopes quer ser ministro mas está ameaçado de enfrentar um processo de expulsão.

Ontem o deputado consultou o vice-presidente Michel Temer, reconduzido no sábado ao comando do PMDB. O vice respondeu que não era nada pessoal, que ele poderia assumir, se quisesse, mas que a decisão daconvenção seria cumprida. A própria direção regional do PMDB mineiro desaconselhou o deputado, por entender que o momento não é favorável a essa decisão. Dirigentes do próprio PMDB mineiro ameaçam executar a expulsão.

Apesar dos avisos, Lopes teria decidido aceitar o convite da presidente, segundo apurou o Valor PRO com três parlamentares que conversaram com o pemedebista. O anúncio é mantido sob sigilo até que o governoformalize a indicação. Lopes esteve ontem com a presidente Dilma, quando foi feito o convite oficial.

A ofensiva do Palácio do Planalto sobre os ministros do PMDB incluiu uma reunião na noite de segunda-feira, quando eles disseram a Dilma que a decisão do partido fora tomada numa hora em que a convenção estavaesvaziada. Os ministros, no entanto, compareceram à reunião, ficaram em silêncio e foram embora tão logo votaram, o que deixou o Palácio do Planalto irritado. Na véspera, o próprio Lula ligou para Michel Temer, preocupado com a decisão que o PMDB iria tomar e foi informado de que o partido não romperia durante a convenção nacional.

Lula não chegou a pedir apoio de Temer em sua volta ao ministério, mas a senadora Gleisi Hofmann (PT-PR), em discurso no Senado, cobrou uma postura "institucional" do PMDB, que além do vice-presidente conta comsete ministros no governo Dilma e cargos nos diversos escalões. Gleisi fez a cobrança num aparte ao senador Romero Jucá, primeiro-vice-presidente do PMDB. Este respondeu que há dois anos a aliança PT-PMDB vem sendo "desconstruída".

O grupo mais governista do PMDB entende que Lula pode dar uma "sobrevida" ao governo Dilma, mas entende que já deu muitas chances ao governo, sem contrapartida. Apoiou, por exemplo, Joaquim Levy no Ministério da Fazenda, mas não deu certo. O ministro Nelson Barbosa também não reverteu as expectativas da economia. A avaliação é que não dá certo porque não existe governo. "A volta do Lula é importante para ver se dá uma linha ao governo", diz um integrante do PMDB disposto a ajudar Dilma a ficar até o fim do mandato.

Os governistas, no entanto, estão pessimistas, porque não só a situação econômica que Lula vai encontrar não é a mesma que teve em seu governo, mas também pela certeza de novos estragos provocados pelas delaçõespremiadas da Operação Lava-Jato. No horizonte próximo são avistadas as delações do presidente da Andrade Gutierrez, Otávio Marques Azevedo, do ex-presidente do PP Pedro Corrêa e de Monica Moura, a mulher do jornalista João Santana, publicitário das campanhas da presidente Dilma Rousseff.

Se pudessem, os governistas, sobretudo os do Senado, preservariam o mandato de Dilma, embora tenha queixas profundas da presidente. Alega-se que ela sempre decidiu contra o Senado: enquanto o vice Michel Temer indicou ministros e comandou a coordenação política, a cota de ministros do Senado foi preenchida por Kátia Abreu (Agricultura), uma noviça no pemedebismo, e por Eduardo Braga (Minas e Energia), respeitado mas sem maiores vínculos com a bancada de senadores.

A hipótese da solução parlamentarista ou semiparlamentarista foi justamente uma tentativa de brecar o movimento do impeachment, que ganhou força agora com as manifestações de domingo e as novas delações da Lava-Jato. Os governistas avaliam que Michel é hábil o suficiente para costurar um pacto pela governabilidade. Teme-se também que Lula seja um peso a mais para levar para o fundo um barco já furado.(Colaboraram Raphael Di Cunto e Thiago Resende)