Valor econômico, v. 16, n. 3958, 08/03/2016. Política, p. A6

Supremo sinaliza que irá revogar nomeação de procurador para Justiça

Andrea Jubé

Carolina Oms

Maíra Magro

A presidente Dilma Rousseff foi alertada ontem de que o Supremo Tribunal Federal (STF) pode revogar a nomeação de Wellington César Lima e Silva para o Ministério da Justiça. Um grupo de ministros da Corte reuniu-se no domingo para discutir o tema e concluiu que é inconstitucional a posse de um integrante do Ministério Público em um cargo do Executivo federal. O governo foi avisado dessa reunião e aconselhado a procurar outro nome para o cargo. Mas a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ªRegião, que revogou liminar suspendendo a posse do ministro, levou alento ao Palácio do Planalto. A determinação de Dilma é aguardar o julgamento da matéria pelo plenário do Supremo amanhã.

Dilma pediu ao advogado-geral da União, ministro José Eduardo Cardozo, que defenda, pessoalmente, junto aos ministros do STF os argumentos do governo para que seja convalidada a posse de Wellington César. Cardozo circulou ontem em gabinetes do Supremo.

O governo tem expectativa, ainda, de que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresente parecer favorável à posse de Wellington. Mas já contabiliza, pelo menos, dois votos contrários à sua nomeação para a pasta da Justiça: do relator da ação movida pelo PPS, Gilmar Mendes, e de Antonio Dias Toffoli.

Ontem, logo cedo, o ministro da Justiça divulgou que havia pedido exoneração do cargo comissionado que ainda exercia no Ministério Público da Bahia. Ele tomou posse no Ministério da Justiça, na quinta-feira, ainda exercendo a função de procurador-geral de Justiça Adjunto para Assuntos Jurídicos.

Na sexta-feira, uma liminar da juíza federal Solange Salgado suspendeu os efeitos da posse de Wellington. Mas ontem, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região revogou a liminar da juíza de primeira instância. Em sua decisão, o desembargador federal Cândido Ribeiro ressaltou que o caso será julgado amanhã no STF.

De acordo o desembargador, a liminar pode "acarretar grave lesão à ordem pública" e "envolve interferência em ato de governo, com subjacente impacto nas condições de governabilidade da Chefe do Poder Executivo".

A Advocacia-Geral da União recorreu ontem da decisão que suspendeu a nomeação do ministro da Justiça, até que ele seja exonerado do cargo de promotor de Justiça. A AGU argumentou que a decisão prejudica a ordem pública, deixando "sem comando, do dia para a noite, um ministério que tem como responsabilidade direta a segurança pública, as garantias constitucionais e a administração penitenciária, entre outros assuntos de extrema relevância".

Contudo, para integrantes do Supremo ouvidos pelo Valor, não basta Wellington se afastar do cargo comissionado de procurador de Justiça Adjunto. A avaliação de um grupo de ministros da Corte, selada no domingo, é de que é inconstitucional um membro do Ministério Público exercer um cargo federal sem renunciar completamente à carreira, ou se aposentar.

"Não dá para ter um pé em cada canoa", avalia um integrante do Supremo. Ministros do Supremo comentam que a jurisprudência da Corte é clara ao evitar esse tipo de situação. A Constituição Federal prevê, no artigo 128, que é vedado aos integrantes do Ministério Público "exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério".

Um dos precedentes citados remonta a 2007 e foi relatado pela ministra Cármen Lúcia. No caso, um promotor de Justiça do Mato Grosso do Sul impetrou mandado de segurança para assumir uma diretoria de Planejamento no Instituto Chico Mendes, criado a partir de uma divisão administrativa do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Naquele caso, o promotor pediu a suspensão da Resolução 5/2006 do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que disciplina o exercício de atividades político-partidárias e cargos públicos por membros do Ministério Público. Segundo o promotor, a resolução afrontava o direito líquido e certo, pois o CNMP não teria competência para vedar, por meio de resolução, o exercício de atividade pública por parte de promotores e procuradores. Acrescentou que se afastar do cargo de promotor para exercer cargo público é totalmente legal, desde que a função seja compatível com a finalidade institucional do MP e que o membro esteja licenciado do cargo.

Mas o promotor não obteve sucesso naquele caso. A ministra Cármen Lúcia rejeitou a liminar, apresentou voto nesse sentido. A ação foi julgada em 2010, e a ministra foi seguida pela unanimidade de seus pares. Fontes do Supremo disseram ao Valor que embora seja de 2010, a tendência é que esse entendimento ainda prevaleça na Corte.

O Palácio do Planalto defende a legalidade e constitucionalidade da nomeação de Wellington César para o comando da Justiça. O argumento fundamental é de que uma resolução posterior do Conselho Nacional do Ministério Público autorizou a nomeação de integrantes da instituição para outros cargos públicos, que não o magistério. Trata-se da resolução 72 de 2011.

 

Integrantes do STF apontam que o Ministério Público tem que seguir as mesmas garantias, mas também as mesmas restrições impostas aos juízes. São citados até mesmo casos envolvendo os próprios integrantes do Supremo. O ex-ministro do STF Nelson Jobim aposentou-se da Corte Suprema em 2006 para assumir o Ministério da Defesa em 2007, no segundo mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.