Valor econômico, v. 16, n. 3957, 05/03/2016. Política, p. A6

Lava-Jato impulsiona candidatura de Lula e aumenta pressão sobre Dilma

Por: Raymundo Costa

Por Raymundo Costa | De Brasília

 

O lançamento da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à sucessão, em 2018, é a principalrepercussão da 24ª fase da Operação Lava-Jato no PT, segundo a cúpula partidária. A ação da Polícia Federaltambém contribuiu para o partido voltar a mobilizar a militância partidária, solidária ao ex-presidente, mas ainda é cedo para dizer que Lula e a presidente Dilma Rousseff celebraram um duradouro acordo de paz.

Para que isso ocorra, Lula e seus aliados dizem que a presidente precisa tomar algumas providências: ser mais ativa e firme como chefe do Poder Executivo e consequentemente da Polícia Federal; ser mais solidária comLula e - principalmente - mudar a política econômica do governo. Uma guinada. Dilma precisaria abrir mão da reforma da Previdência, até porque está claro que não será aprovada pelo atual Congresso.

O encontro do ex com a atual presidente da República, no sábado, foi cordial, mas os dois não avançaram nos assuntos de governo, o que ocorreria hoje em uma nova conversa, cancelada ontem à noite, de acordo com a assessoria de Lula.

Com a ação da última sexta-feira, a Operação Lava-Jato ultrapassou seu ponto de não retorno e o Ministério Público Federal deixou claro que seu objetivo é provar que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva era o chefe do esquema de corrupção da Petrobras. As implicações são claras tanto para o futuro da investigação, a partir de agora, quanto para o governo da presidente Dilma Rousseff, que pode ser a primeira vítima dosdesdobramentos da investigação, para Lula e para o PT, em 2018.

Para os procuradores da força-tarefa encarregada da Lava-Jato é evidente a relação entre os valores recebidos pelo Instituto Lula e pelo ex-presidente e o que eles chamaram de "núcleo duro" do cartel de que se beneficiava da corrupção da Lava-Jato. As cinco principais empresas envolvidas no esquema doaram R$ 20 milhões ao Instituto Lula e pagaram R$ 10 milhões por palestras do ex-presidente.

Os investigadores suspeitam que as doações e pagamentos, na realidade, são uma cobertura ao favorecimento das empresas nos governos do PT. A questão é provar. O Ministério Público tem um plano de voo definido, mas a credibilidade dos procuradores agora depende da força dos indícios que levaram um ex-presidente, o primeiro na história do país, a ser levado por agentes da PF para depor. Lula reagiu com o discurso da vítima e conseguiu a solidariedade da militância organizada.

O impacto político da condução coercitiva de Lula pode ser medido pelas manifestações que ocorreram tão logo ele foi levado para uma dependência do aeroporto de Congonhas. Eram militantes de movimentos organizados,que já estavam de sobreaviso. Mas não foi só em Congonhas, em frente à casa do ex-presidente, em São Bernardo, ou no Sindicato dos Bancários de São Paulo - o PT registrou eventos (bandeiraços, buzinaços, reuniões de diretórios) em pelo menos 1.200 cidades de todo país.

O que pode tirar Lula do jogo sucessório de 2018 é sua eventual condenação por crimes apurados na Operação Lava-Jato. Se vier a ser condenado por um órgão colegiado, Lula pode ser barrado de concorrer pela Lei da Ficha Limpa.

A decisão da primeira instância, no âmbito da Lava-Jato, será do juiz Sérgio Moro, se Lula for efetivamente denunciado pelo Ministério Público Federal. Até hoje nenhuma das centenas de decisões expedidas por Moro, referentes à Lava-Jato, foi reformada pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, sediado em Porto Alegre (RS). A instância seguinte é o Superior Tribunal de Justiça.

A condenação ou não de Lula depende agora da capacidade da força-tarefa de produzir as provas necessárias para comprovar sua teoria. Já o estrago político está feito, ameaça a expectativa de poder do PT, ao atingir Lula, mas sobretudo o governo da presidente Dilma Rousseff. Com o mandato em risco, a presidente da República se distanciou do PT, mas nunca recebeu em troca a garantia de que os partidos aliados vão até o fim em defesa de seu governo. Pelo contrário, a proposta do impeachment, que estava em banho-maria, ganhou uma nova dimensão.

A ação da Polícia Federal, na sexta-feira, apenas agravou a situação do governo federal, que já era crítica na quinta-feira, véspera da operação. Foi a proposta de delação premiada do ex-líder do governo no Senado, Delcídio Amaral, que colocou a presidente no centro da Lava-Jato e teria abalado a confiança de seus aliados mais importantes no Congresso, como o senador Renan Calheiros.

Renan ergueu uma barreira de proteção a Dilma no Senado, e na volta do recesso parlamentar procurava votar uma agenda de emergência para melhorar o ambiente econômico até a sucessão de 2018. O vazamento dadelação de Delcídio e a operação da PF colocaram em dúvida esse cronograma. A oposição, que já havia se comprometido a não obstruir a pauta, está repensando sua decisão.

Na sexta-feira, Renan se limitou a divulgar uma nota que diz pouco sobre seus planos futuros. "A nação passa por um período delicado de sua história. O momento impõe a todos, especialmente aos homens públicos, serenidade, equilíbrio, bom senso, responsabilidade e, sobretudo, respeito à legalidade", escreveu Renan. "As instituições devem guardar os limites de suas atribuições legais e qualquer politização ou radicalização - independente da origem - será um desserviço ao país".

A expectativa do Congresso é com a manifestação programada para o próximo domingo, 13. Na véspera, o PMDB fará sua convenção nacional, que deve mostrar o humor do maior partido aliado em relação ao governo e ao impeachment. Mas a rua - a favor ou contra - deve ser o mais importante na definição do Congresso.