O globo, n. 30.175, 19/03/2016. País, p. 4

Mobilização antigoverno foi 13 vezes maior que a de ontem

Atos a favor de Dilma e Lula levaram 275 mil às ruas em todos os estados

Por: Bruno de Góes/ Sérgio Roxo

 

-RIO E SÃO PAULO- As manifestações de ontem, a favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff, foram menores do que os atos do último domingo. Segundo balanços das polícias militares nos estados, a mobilização antigovernista foi pouco mais de 13 vezes maior, levando 3,6 milhões de pessoas às ruas em todo o país, enquanto governistas levaram 275 mil. Nos dois casos, foram registrados protestos em todos os estados. As únicas capitais onde os atos de ontem foram maiores do que os de domingo foram Salvador ( BA), João Pessoa ( PB) e Rio Branco (AC).

Além da quantidade de público, outras diferenças puderam ser registradas nas duas ocasiões. Ontem, dia de semana, as manifestações foram convocadas por centrais sindicais e movimentos de esquerda ligados ao governo, com a contratação de ônibus fretados para militantes. Já nos atos do dia 13, que ocorreram em um fim de semana, a convocação foi feita pela internet por movimentos que desde o ano passado pedem a saída de Dilma, como o Movimento Brasil Livre e o Vem Pra Rua.

A Avenida Paulista, em São Paulo, era ocupada ontem pelos manifestantes ao longo de 11 quarteirões — público de 80 mil pessoas —, com discursos de militantes de PT e outros partidos de esquerda. Já no último domingo, eram 23 quarteirões ocupados pelas pessoas que queriam o impeachment de Dilma — público de 1,4 milhão.

Cinco dias depois, o verde e amarelo deu lugar ao vermelho na Paulista. As palavras de ordem contra Dilma e Lula gritadas pelos que vestiam a camisa da seleção foram substituídas pelo canto “Não vai ter golpe”. Camisas do PT, da CUT e do MST eram o uniforme de boa parte dos que protestavam.

Ontem, os manifestantes elegeram como vilão aquele que havia sido alçado à condição de herói no domingo: o juiz Sérgio Moro, atacado pelo público e principalmente nos discursos dos líderes petistas.

A diferença no tratamento aos políticos também chamou a atenção. Enquanto nomes como o governador Geraldo Alckmin (PSDB) e o presidente do PSDB, senador Aécio Neves ( MG), foram vaiados no domingo e optaram por não discursar, ontem o público louvou Lula e fez de seu discurso o ponto alto do ato.

Quem foi à Paulista ontem encontrou ainda trilha sonora radicalmente diferente. No domingo, o grande hit dos DJs foi a música “Que país é este?”, do Legião Urbana. Já os apoiadores do governo viram uma apresentação ao vivo do cantor Chico Cesar, que executou, entre outros, a música ícone da canção de protesto dos anos 1960: “Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré.

No Rio de Janeiro, não houve uma divulgação oficial do número de manifestantes pela Polícia Militar. Ontem, porém, o Centro de Operações Rio, da prefeitura, estimou o público na Praça XV, em 70 mil.

Em Recife, o senador Humberto Costa (PT) participou do ato pró-governo.

— O povo brasileiro não foge à luta. Se eles acham que vão derrubar Dilma, estão muito enganados — afirmou ele, no ato que reuniu 15 mil pessoas. No domingo, foram 120 mil manifestantes. (Bruno Góes e Sérgio Roxo, com G1).

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No Rio, políticos e artistas falam em ‘golpe’

Manifestantes atacaram impeachment e Lava-Jato

Por: Fernanda Krakovics/ Juliana Castro/ Marco Grillo

 

Políticos, artistas e movimentos sociais reagiram ontem, em manifestação na Praça XV, no Centro do Rio, ao processo de impeachment e à Operação Lava-Jato como uma tentativa de golpe. O tom foi de defesa da democracia e os principais alvos foram o juiz Sérgio Moro; o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ); e a mídia. Segundo os organizadores, mais de 70 mil pessoas compareceram ao protesto. Policiais militares que estavam no local estimaram o público em 50 mil.

— Esse juiz de Curitiba não é juiz, é chefe de facção. Ele ainda usa a toga para destruir a Constituição e os direitos individuais — disse o ex-ministro Roberto Amaral.

O senador Lindbergh Farias ( PT- RJ) afirmou que Sérgio Moro cometeu uma “irresponsabilidade” ao quebrar o sigilo das ligações telefônicas do expresidente Lula e ao autorizar sua condução coercitiva para prestar depoimento na Polícia Federal. De acordo com Lindbergh, as ações de Moro foram responsáveis por “convulsionar o país”.

— Achamos que há um embrião do estado de exceção dentro do estado democrático de direito — afirmou.

Ressaltando a necessidade de “união da esquerda”, uma delegação do PSOL compareceu no ato, mesmo sendo oposição ao governo Dilma. Entre os presentes estava o ex-petista Milton Temer, que se tornou um dos maiores críticos de seu antigo partido.

— Não precisa ter tanque nas ruas para ter golpe. Esse golpe pode vir pelo Judiciário, que não é menos corrupto do que o Legislativo e o Executivo, só que não é fiscalizado — disse o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ).

O “ato festival” contou com a presença de vários artistas e cantores que, além de discursarem, animaram a militância com shows. A cantora Teresa Cristina abriu sua apresentação com “O Bêbado e o Equilibrista”, que se tornou hino da campanha pela anistia no final dos anos 1970.

— Eu votei em uma presidente que tem que exercer o mandato até o final. Sem golpe — disse ela.

O ator Sérgio Loroza também defendeu o governo e afirmou que a crise política não é boa para ninguém:

— Me perguntam de que lado eu estou. E eu pergunto: quem está do meu lado como negão? O momento é confuso, o bagulho está doido e a guerra não é boa para ninguém, nem para quem ganha.

 

CARTAZ COM LULA PRESIDENTE

O cantor Pedro Luís, da Parede, disse que a oposição não se conforma de ter perdido as últimas eleições:

— Chora, chora, mas tenta nas urnas.

Os dois cantaram “Vou Festejar”, de Beth Carvalho, cuja letra diz “pode chorar, pode chorar”.

Entre os presentes também estavam as atrizes Letícia Sabatella, Bete Mendes, Cristina Pereira, Tássia Camargo; os cantores Otto, Geraldo Azevedo, Pedro Miranda; o ator Osmar Prado e o diretor de teatro Aderbal Freire Filho.

Os manifestantes gritaram que “não vai ter golpe”, “fora Cunha” e ovacionaram Lula, que estava representado, com faixa presidencial, em um enorme boneco de Olinda. Havia cartazes lançando Lula para presidente da República em 2018, o que foi defendido, em discurso, pelo ator Osmar Prado. O ato foi encerrado com “Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré, música símbolo da resistência à ditadura militar.

Ônibus levaram moradores de Maricá, administrada pelo presidente do PT do Rio, para a manifestação. Quatro motoristas disseram ao GLOBO que vieram daquela cidade. O prefeito de Maricá, Washington Quaquá (PT), divulgou um vídeo convocando moradores para a manifestação.

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