O globo, n. 30.175, 19/03/2016. País, p. 7

Gilmar devolve a Moro inquérito contra Lula

Em decisão que suspendeu posse de ex-presidente na Casa Civil, ministro do STF põe fim a guerra de liminares

Por: Carolina Brígido

 

-BRASÍLIA - O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), colocou um ponto final na guerra de liminares que se arrasta desde ontem e suspendeu à noite a posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Casa Civil. A decisão prevalece em relação às liminares da primeira instância e vale até que o plenário do STF julgue o caso de forma definitiva. Isso não deve acontecer tão cedo, já que não haverá sessões no tribunal na semana que vem. Gilmar também decidiu que as investigações contra Lula devem ficar nas mãos do juiz federal Sérgio Moro, que conduz a Lava-Jato na primeira instância de Curitiba. Assim, o magistrado volta a deliberar, por exemplo, sobre o pedido de prisão preventiva, impetrado contra Lula pelo Ministério Público de São Paulo.

Segundo Gilmar, a presidente Dilma Rousseff cometeu “desvio de finalidade” e “fraude à Constituição” ao nomear Lula para o cargo na Casa Civil. Para o ministro, o propósito foi claro no sentido de conferir foro especial ao ex-presidente e, com isso, atrasar as investigações contra ele. A Advocacia Geral da União informou que recorrerá da decisão. Moro, por sua vez, só deverá analisar a documentação do STF a partir de segunda-feira.

“Nenhum Chefe do Poder Executivo, em qualquer de suas esferas, é dono da condução dos destinos do país; na verdade, ostenta papel de simples mandatário da vontade popular, a qual deve ser seguida em consonância com os princípios constitucionais explícitos e implícitos, entre eles a probidade e a moralidade no trato do interesse público ‘lato sensu”’, anotou o ministro.

Gilmar ponderou que o princípio da moralidade deve nortear a administração pública, inclusive a nomeação de ministro de Estado, “de maneira a impedir que sejam conspurcados os predicados da honestidade, da probidade e da boa-fé”.

O ministro lembrou que há jurisprudência no STF para que não sejam aceitas renúncias de última hora de autoridades investigadas para escapar de julgamento no tribunal, fazendo com que o processo baixe para a primeira instância. Para ele, o contrário também é aplicável. Ou seja: não se pode nomear alguém de última hora para modificar o foro da investigação.

Gilmar também argumentou que o STF não se furtaria em processar e julgar Lula. No entanto, a mudança de foro atrasaria as investigações por questões burocráticas. “É muito claro o tumulto causado ao progresso das investigações pela mudança de foro. Não se nega que as investigações e as medidas judiciais poderiam ser retomadas perante o STF. Mas a retomada, no entanto, não seria sem atraso e desassossego.

Gilmar transcreveu diálogo em que Dilma recomenda a Lula o uso do termo de posse no cargo de ministro apenas “em caso de necessidade”. Para Gilmar, a intenção de evitar a prisão foi revelada pela conversa: “o objetivo da falsidade é claro: impedir o cumprimento de ordem de prisão de juiz de primeira instância”.

A decisão foi tomada no julgamento de ações de autoria do PPS e PSDB. Até ontem, 13 ações pedindo a suspensão da posse de Lula haviam chegado ao STF.

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Opinião

CUIDADOS
 
O JUIZ Itagiba Catta Preta, o primeiro magistrado a conceder liminar contra a posse de Lula — depois, cassada — justifica como “posição de cidadania” seus posts em rede social contra o ex-presidente, Dilma e PT.

O JUIZ, por certo, não é forçado a engavetar convicções pessoais. Mas precisa ter ampla noção de seu papel na sociedade, e se cercar de cuidados para estar à altura de todas as necessárias prerrogativas que a Constituição concede aos agentes do Judiciário.

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Teori afirma que juiz não deve ‘criar conflito’

-RIBEIRÃO PRETO (SP)- Relator da operação Lava- Jato no Supremo Tribunal Federal ( STF), o ministro Teori Zavascki disse ontem, em visita a Ribeirão Preto ( SP), que o Poder Judiciário deve agir com serenidade, prudência e discrição, e que o papel dos juízes “é o de resolver conflitos, não é o de criar conflitos”. Sem citar o nome do juiz Sérgio Moro, que está no centro de uma polêmica jurídica pela revelação das conversas telefônicas do ex- presidente Lula com a presidente Dilma Rousseff, afirmou em discurso que “os juízes não são protagonistas” e não cabe a eles resolverem crises políticas ou econômicas. As informações são do G1.

“Em uma hora como essa que estamos vivendo, uma hora de dificuldades para o país, uma hora em que as paixões se exacerbam, é justamente nessas horas, mais do que nunca, que o Poder Judiciário tem que exercer seu papel com prudência, com serenidade, com racionalidade, sem protagonismos, porque é isso que a sociedade espera de um juiz", disse.

Em discurso no auditório da Justiça Federal, Teori Zavascki reforçou que cabe aos juízes apenas o dever de fazer cumprir a lei.

“O juiz resolve crises do cumprimento da lei. O princípio da imparcialidade pressupõe uma série de outros pré-requisitos. Supõe, por exemplo, que seja discreto, que tenha prudência, que não se deixe se contaminar pelos holofotes e se manifeste no processo depois de ouvir as duas partes”.