O globo, n. 30.175, 19/03/2016. País, p. 8

Não se pode corromper a Constituição

Por: Paulo Teixeira

 

Reagir é proteger o povo de atos de regimes de exceção. Acompanhamos com espanto o episódio da interceptação telefônica ilegal de conversas da presidenta da República. No Estado de Direito, é inadmissível que a polícia ou outra autoridade invada a privacidade de alguém sem prévia e fundamentada decisão do juiz competente. Nos casos em que se apuram questões de caráter criminal que, em tese, podem envolver a presidenta da República, a única instituição competente é o Supremo Tribunal Federal.

Vale lembrar que à presidenta Dilma não se atribui qualquer delito. Tampouco é possível extrair da conversa, obtida de forma ilegal, qualquer indício de crime, salvo por mentes mal intencionadas ou tendenciosas. Ainda assim, Dilma foi alvo de escuta telefônica clandestina, quando já havia sido revogada a determinação judicial que autorizara o monitoramento do ex-presidente Lula.

Tal abuso causa espanto numa sociedade que se percebe exposta e desprotegida. Se até a presidente foi monitorada ilegalmente, quem não estará sendo?

Essa não foi a única ilegalidade perpetrada no âmbito de uma investigação que, iniciada para apurar práticas de corrupção, parece desviar- se na direção da política para minar a legitimidade assegurada à presidenta nas urnas. O código de processo penal brasileiro determina que, detectada uma prova ilícita, esta deve ser imediatamente descartada. O juiz à frente da Lava Jato fez o contrário: permitiu que os meios de comunicação tivessem acesso a gravações ilegais e autorizou a divulgação de conteúdo privado, sem relevância para a investigação. Tal conteúdo foi explorado indevidamente na mídia, incendiando o país com falsas e suspeitas interpretações.

A ilegalidade maculou a democracia e o estado de direito. Quero crer que a revelação deste flagrante atentado, bem como a pronta reação de juristas de todas as inclinações políticas contra a condução coercitiva do ex-presidente Lula, uma semana antes, lançou luz sobre o que está acontecendo.

 

Paulo Teixeira é deputado federal (PT/SP)

 

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Lava-Jato derrubou paradigmas

Por: Antônio Bochenek

 

A rotina de impunidade, principalmente de pessoas abastadas, prejudica imensamente o desenvolvimento das instituições e do país. A operação Lava Jato derrubou dois paradigmas nefastos que perduravam no Brasil. A Polícia Federal, a Receita Federal e o Ministério Público Federal levantaram provas de infrações penais como corrupção, lavagem de dinheiro e desvios que existiam há mais de uma década em empresas estatais.

A Justiça Federal tem sido célere na análise, com decisões fundamentadas, condenações e prisões, em sua imensa maioria, mantidas pelas instâncias superiores do Judiciário, tanto no TRF-4, como no STJ e no STF.

A simultaneidade dos dois colapsos é o que singulariza a Lava Jato. No Brasil, por séculos, os malfeitos cometidos pelos detentores do poder sequer chegavam à investigação. A partir da Constituição Federal de 1988, da redemocratização, das novas tecnologias que aproximam o mundo real do virtual, e, principalmente, do fortalecimento das instituições democráticas, os delitos passaram a ser apurados. Num primeiro momento, não resultou na devida punição dos envolvidos, sobretudo se estivessem investidos em altos cargos da administração pública ou da iniciativa privada.

Esse quadro muda com a Operação Lava Jato em consequência da evolução do direito penal e processual penal e da própria sociedade brasileira. Primeiro, porque vigora no Brasil uma nova legislação — a Lei 12.850, de 2013 — que disciplina a colaboração premiada e permite a apuração de esquemas fraudulentos que, de outra forma, permaneceriam ocultos.

Em segundo lugar, há uma nova geração de servidores públicos qualificados e experientes, focada nos valores democráticos e republicanos, que não mais se resigna com os vícios dos sistemas e os resquícios do passado, sobretudo se servirem à impunidade.

 

Antônio Bochenek é presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil

 

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Divulgação dos grampos foi irresponsável

Por: Aldo Fornazieri

 

Que o Judiciário é um poder ineficiente, eivado de privilégios em suas altas cúpulas e tendencioso contra os mais pobres, isto se sabia há muito tempo. Que o Judiciário se alçasse a árbitro da atividade política e implantasse um estado judicial de exceção é algo que vem sendo produzido nos últimos anos de forma célere e coordenada. O apogeu desse processo foi alcançado pelo juiz Sergio Moro e pelos procuradores do Ministério Público Federal que agem na operação Lava Jato. Todos somos favoráveis ao combate à corrupção endêmica que se prolonga no Brasil há décadas. Mas isto não pode ser feito fora da lei e acima da Constituição.

Nesta semana, o juiz Moro e os procuradores da República rasgaram Constituição e espezinharam a lei ao divulgar ilegalmente as gravações do ex-presidente Lula, incluindo a presidente Dilma. Este é um ato inaceitável pela consciência democrática do país e se constituiu num golpe político- jurídico contra poderes legalmente constituídos com o aval da soberania popular. Nas próximas semanas, o Procurador Geral, Rodrigo Janot, terá que dizer se faz parte desta conspiração ou se observa a Constituição. A ação política, partidarizada e parcial de Moro e dos procuradores desconstrói o Estado Democrático de Direito. O próprio STF terá que dizer se faz vistas grossas à violência jurídica do juiz Moro e dos procuradores ou se quer dar um basta no estado de exceção judicial.

A ação de Moro, de divulgar os grampos, além de social e politicamente irresponsável, pois visa criar um clima de convulsão social e de respaldar a violência de grupos cada vez mais fora de controle, é o desdobramento de um processo de ilegalidades sacramentado em mais de 100 conduções coercitivas, de tortura psicológica de presos e de prisões arbitrárias, transformado a exceção em regra e produzindo graves riscos institucionais. É preciso conter este quisto perigoso que se coloca acima da lei e se apresenta como justiceiro universal da nação.

 

Aldo Fornazieri é professor da Escola de Sociologia e Política (SP)

 

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Moro não poderia ocultar as gravações

Por: Miro Teixeira

 

Moro iniciou a maior reforma política das últimas décadas. Criou-se a grande armadilha. Escalaram o Lula como bode expiatório da Lava Jato. Contra as ruas pró- Moro, planejaram as ruas pró-Lula, em mais uma tentativa de desqualificar a Justiça. É um truque.

Os recursos às decisões de Moro feneceram nas instâncias superiores. A gravação da presidente Dilma, de viva voz, a oferecer a Lula um papel para que ele utilizasse em caso de necessidade, ainda não instrui qualquer processo. Até Lula pareceu surpreender-se com tal iniciativa.

Em poucas palavras, a presidente da República, heroína da democracia e até então resguardada pela sua história de integridade pessoal, colocou-se acima da Constituição e a ofendeu mais do que qualquer presidente civil da história do Brasil.

Incidente inédito, não surge de vozes enlouquecidas de golpistas. É da voz suave da Presidente que se revela a violação de princípios como da moralidade e da impessoalidade. Ofendeu a República. Perdeu a qualidade para presidir o País. O impeachment avança.

Sobre seu uso processual falarão advogados, Ministério Público e Juízes, nos ritos permitidos pela democracia garantista dos direitos dos réus e também das vítimas: o povo.

Mas a reação social e institucional foi sintetizada pelo Ministro Celso de Mello, em resposta aos agravos de Lula. Palavras que serviram para ensejar apressado pedido de desculpas. Se nula a gravação, dela não se ocuparia a Suprema Corte do País. “Esse insulto ao Poder Judiciário traduz, no presente contexto da profunda crise moral que envolve os altos escalões da República, reação torpe e indigna, típica de mentes autocráticas e arrogantes que não conseguem esconder, até mesmo em razão do primarismo de seu gesto leviano e irresponsável, o temor pela prevalência do império da lei e o receio pela atuação, firme, justa, impessoal e isenta de juízes livres e independentes ”. (Transcrito de O GLOBO).

 

Miro Teixeira é deputado federal (Rede/RJ)

 

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Um dia de muitas manchetes

Diante de tantas notícias, pela primeira vez, em mais de 90 anos, O GLOBO publica duas primeiras páginas. Leitores aprovaram a estratégia

Por: Renan França

 

Para dar o destaque que as notícias mereciam, a versão impressa e digital do GLOBO, ontem, chegou aos tablets, bancas de jornais e aos assinantes com duas primeiras páginas. Em mais de 90 anos de história, foi a primeira vez que O GLOBO lançou mão da estratégia. E, se depender dos leitores, a medida poderá se repetir quando for necessário. O professor de Matemática Antônio Cézar do Carmo, de 53 anos, foi um dos que aprovaram a ideia. Para ele, o jornal acertou em dar destaque sobre a abertura de processo de impeachment da presidente Dilma na Câmara em uma página, e, na outra, trazer a suspensão da posse do expresidente Lula na Casa Civil como tema principal.

— Eu gostei e acho que fica mais fácil valorizar os assuntos com duas capas. Se resumisse em uma só, haveria o risco de um assunto importante não ter destaque na primeira página. As últimas semanas têm sido um retrato disso. Talvez, a estratégia já poderia ter sido usada antes porque ocorrem escândalos atrás de escândalos no mesmo dia — afirma Antônio. — A quinta-feira foi simbólica pois o dia inteiro surgiram notícias importantes sobre a política brasileira e só duas capas dariam a dimensão da situação do país.

O professor de Educação Física Osmar Machado, de 50 anos, foi outro leitor que gostou da ideia. Segundo ele, é até difícil escolher qual foi a capa mais impactante.

— Eu fiz essa brincadeira e não consegui me decidir. O fato é que as duas trazem assuntos que estão na boca do povo. Todo mundo queria ter mais informações sobre a abertura do impeachment e ler sobre a consequência do Lula não assumir o Ministério da Casa Civil — diz Osmar. — Como não dá para aumentar a largura e a altura do papel, o jornal acertou em fazer duas capas.

Na Zona Sul, algumas bancas de jornais penduraram as duas capas especiais uma ao lado da outra. Na Rua Cesário Alvim, no Humaitá, por exemplo, o jornaleiro Alexandre Crespo, de 56 anos, conta que muitos clientes gostaram da abordagem. Ele diz também que até compradores que costumam apenas olhar as manchetes se interessaram em comprar o jornal.

— Para uma sexta- feira, o movimento foi muito bom. Muita gente se surpreendeu com as duas capas e elogiou abordagem do jornal. A novidade veio bem a calhar para o período que estamos vivendo. A produção de notícias é tão grande que precisa-se criar novos modelos — disse Alexandre. — Os clientes gostaram. Para ter uma ideia, muita gente que costuma apenas ler as manchetes hoje se interessou em levar o jornal para casa.

O burburinho nas bancas também se refletiu na Internet. Na quinta-feira, a página do GLOBO no Facebook ganhou mais de 50 mil novos fãs — ontem outros 17 mil curtiram a página. Já os números de acesso atingiram marcas recordes. Na quinta, foram registradas 4,8 milhões de visitas ao site do GLOBO e 8,8 milhões de “pageviews” (número de páginas visitadas).

Um dos destaques do dia foi a matéria sobre a suspensão da posse do ex- presidente Lula com 670 mil acessos no site. No Facebook, a reportagem “Estou assustado é com a República de Curitiba” liderou as interações com os usuários: foram 105 mil curtidas, 400 mil compartilhamentos, e 11 mil comentários.

Órgãos relacionados:

  • Câmara dos Deputados