Valor econômico, v. 16, n. 3958, 08/03/2016. Política, p. A11

Até quando o Brasil suportará a crise?

Yoshiaki Nakano

Na semana passada tivemos notícias estarrecedoras tanto da economia como da política. A economia brasileira parece caminhar para uma depressão, dada a profundidade e a duração do processo recessivo e sem perspectivas de reversão. Politicamente, estamos num impasse que paralisa também a economia. O atual governo está completamente perdido, incapaz de dar uma direção crível a sua política econômica e de lançar qualquer iniciativa aceitável para a sociedade, ou de convencer o Congresso Nacional. Na verdade, o governo perdeu de forma irremediável o controle do processo político e provocou uma crise aguda no nosso sistema presidencialista de coalizão.

A reação do mercado financeiro foi imediata, a Bolsa de Valores teve uma vigorosa recuperação, particularmente as ações de empresas nacionais, como a Petrobras e a moeda nacional sofreu uma forte apreciação. O que o mercado financeiro fez foi converter as informações - do vazamento do conteúdo da delação premiada do senador Delcídio do Amaral, ex-líder do governo Dilma, e a condução coercitiva do ex-presidente Lula para depor na Polícia Federal - em preços.

O que estas manifestações de mercado, de fato, indicam é o enfraquecimento, provavelmente irrecuperável, do ex-presidente Lula e da presidente Dilma Rousseff, abrindo caminho para mudanças na governança do país, daí a celebração pelo mercado. Definitivamente, o modelo de governança trazido pelo PT está sendo rejeitado, nas ruas pela grande maioria da população, e agora por aqueles que tomam decisões de investimento. Todos querem o controle da corrupção e mudanças na ordem política do país.

Atendo-se à questão central, podemos dizer que a atual crise econômica é resultado da condução da política macroeconômica equivocada, desde o início da década de 90, e no período recente, novos equívocos com o intervencionismo estatal discricionário. Os dados das Contas Nacionais divulgados pelo IBGE na semana passada revelam resultados estarrecedores. O PIB em 2015 contraiu -3,8%. No último trimestre de 2015, o PIB encontrava-se -5,9% abaixo do mesmo trimestre do ano anterior. O consumo das famílias havia caído -6,8%, no mesmo período, e os investimentos produtivos incríveis -18,5%. A recessão que se iniciou no segundo quadrimestre de 2014 completou 7 trimestres, e, como não há indicações de recuperação neste primeiro trimestre deste ano, vamos completar dois anos de recessão. Para este ano ninguém espera performance melhor do que a de 2015. Assim, com certeza, vamos completar três anos de recessão e a queda acumulada do PIB poderá chegar ao 10%.

Reação do mercado mostra o enfraquecimento irrecuperável de Lula e da presidente Dilma

Do lado estrutural, o Brasil cometeu um erro estratégico ao optar no início da década de 90 por uma inserção internacional com a liberalização da conta de capitais, aprofundada depois do Plano Real, e não pela inserção comercial, a exemplo dos países asiáticos. Baseou-se na doutrina do Consenso de Washington de que, com a liberalização do fluxo de capitais, o mercado seencarregaria de converter este fluxo em investimentos produtivos, o que promoveria o crescimento econômico.

Para isto acontecer basta manter a taxa de juros doméstica acima da internacional e dar segurança aos titulares deste capital, promovendo reformas econômicas e uma boa política macroeconômica voltada para a estabilidade - o crescimento econômico viria consequentemente. Esta política foi mantida, principalmente depois do Plano Real e resultou numa performance desastrosa para o Brasil, cujo crescimento ficou sistematicamente muito abaixo da média internacional.

Assim, desde o início da década de 90, o Brasil tem sido campeão mundial em taxa de juros elevada. Por exemplo, de 1997 a 2004, a despesa com juros do setor público foi de 6,1% do PIB, enquanto na média dos países desenvolvidos atingiu apenas 1,98% do PIB e na média dos emergentes, excluindo o Brasil, 2,4%. A consequência foi uma drenagem contínua de renda para o setor financeiro e uma taxa de investimento que ficou na média abaixo dos 20% do PIB, comparado a uma média de cerca de 30% dosdemais países emergentes.

Com taxas de juros sistematicamente acima da internacional, a taxa de câmbio ganhou uma tendência permanente de sobreapreciação, para não dizer que se tornou uma meta intermediária, não explícita do Banco Central, para tentar conter a inflação. A consequência desta sobreapreciação do real foi a dramática desindustrialização e a perda de dinamismo da economiabrasileira.

Durante o governo Lula esta política macroeconômica foi mantida. Mas, beneficiada com o forte aumento dos preços de commodities e crescimento excepcional da China, a economia brasileira pode crescer, em média, 4% ao ano, entre 2004 e 2010. A partir de 2011, o governo Dilma não modifica na essência a política macroeconômica, portanto mantém dois preçosmacroeconômicos básicos e tenta dinamizar a economia através da expansão do gasto fiscal e forte intervencionismo discricionário e vertical.

 

O crescente déficit fiscal, tentativas de amenizá-los com derrama fiscal e de camuflá-los com "contabilidade criativa", geraram uma grave crise de confiança e forte declínio nos investimentos produtivos.