Valor econômico, v. 16, n. 3958, 08/03/2016. Finanças, p. C1

Nova fase da Lava-Jato não muda ação do BC

Alex Ribeiro

O Banco Central segue com as suas políticas já anunciadas nas áreas monetária, cambial e de estabilidade financeira, apesar da possível mudança no cenário econômico precificada pelos mercados com os mais recentes desdobramentos Operação Lava-Jato.

Na sexta-feira, o BC negou a rolagem integral de swaps cambiais, algo que não ocorria desde setembro de 2015, levando participantes do mercado financeiro a questionar se a autoridade monetária estaria procurando estabelecer um piso para a cotação do dólar e se isso poderia mudar o rumo da política monetária.

Valor apurou que a rolagem de apenas 83,3% dos 9.300 contratos de swap cambial se deveu, na verdade, a questões meramente técnicas. Num ambiente de queda do dólar, provocada pela crença de que a nova fase da Lava-Jato poderá levar a um fim prematuro do governo Dilma Rousseff, a demanda do mercado por proteção cambial se tornou menos robusta, refletindo-se na exigência de prêmios maiores a serem pagos pelo BC para rolar os swaps.

O BC, como sempre faz nessas ocasiões, fez um corte nas propostas num percentual que, dadas as condições de mercado, considera justo. Prova de que não houve mudança na política de swaps cambiais é que ontem de manhã, em outro leilão, foram vendidos todos 9.600 contratos ofertados pelo BC.

Na sexta-feira, participantes do mercado chegaram a afirmar que, ao fazer a rolagem parcial, o BC estaria sinalizando um piso para a cotação do dólar em R$ 3,60. Alguns disseram que, ao não deixar o dólar cair, na verdade o BC estaria sinalizando que os juros não vão recuar tão cedo.

O que o BC vem comunicando, porém, é que o determinante da oferta de swap cambial não é um piso ou teto para o dólar, e sim a demanda do mercado financeiro, das empresas do setor produtivo e dos investidores estrangeiros por proteção cambial. O BC vem reafirmando que o regime cambial é de livre flutuação e que, portanto, quem vai determinar o valor adequado para a moeda é o mercado.

O BC também tem dito que não confunde instrumentos de política econômica - os swaps têm objetivo definido de dar proteção cambial a quem precisa e de garantir o bom funcionamento do mercado cambial. A política de controle da inflação é feita por meio da taxa básica de juros.

A taxa de câmbio pode até vir a ajudar a controlar a inflação, mas no regime de metas de inflação ela é considerada uma variável exógena, ou seja, que não é determinada diretamente pelo Banco Central. O câmbio, nos modelos do BC, também atua como um mecanismo de transmissão dos juros.

Dito isso, a possível queda do dólar é um dos fatores de risco que, na visão da maioria "dovish" do BC, poderá ajudar a levar a inflação para a meta de 4,5% em 2017 sem novas altas na taxa básica de juros. Mas por outros motivos, ligados ao cenário internacional.

Para essa ala do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, o cenário internacional mais incerto e a possibilidade de manutenção do ambiente de ampla liquidez pelos bancos centrais de países desenvolvidos poderá levar a uma grande apreciação da taxa de câmbio, que hoje não está nas contas do mercado.

O cenário discutido no Copom na quarta passada não contemplava a possibilidade de uma valorização cambial causada pela dinâmica política. Até porque o vazamento da delação do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), com possível implicação da presidente Dilma, ocorreu na quinta, e a condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na sexta.

Não está claro como esses desdobramentos vão afetar a atividade econômica. A primeira reação do mercado foi de alta, antecipando um desempenho melhor da economia nos próximos anos com a possível saída da presidente Dilma antes do fim de seu mandato.

As projeções de inflação apresentadas na reunião do Copom de janeiro já contemplavam uma queda mais forte do Produto Interno Bruto no último trimestre de 2015, assim como uma recessão mais forte em 2016, de 3%. Na reunião da semana passada, as projeções foram atualizadas, incorporando a desancoragem das expectativas, e se mostraram menos favoráveis.

Esse foi um dos motivos para o BC evitar indicar qualquer possibilidade de corte de juros no horizonte. Membros do Copom sinalizaram, nas semanas anteriores à reunião, que uma eventual queda dos juros dependeria do recuo da inflação corrente, da quebra da inércia inflacionária e de maior ancoramento de expectativas.

Os novos desdobramentos da Lava-Jato renovaram as preocupações de participantes do mercado sobre como uma eventual falência de empresas envolvidas no escândalo poderia afetar o sistema financeiro. Essa é uma preocupação do BC já há algum tempo, que vem monitorando as posições dos bancos e possíveis impactos. Um estudo publicado na mais recente edição do Relatório de Estabilidade Financeira, de outubro passado, mostra que o impacto seria grande, mas o sistema financeiro teria condições de absorvê-lo.

 

Segundo o relatório, no caso da quebra das empresas mais vulneráveis, com desdobramentos em fornecedores e funcionários, "nenhuma instituição financeira ficaria insolvente, e o impacto geraria necessidade de capital de R$ 130 milhões para o reenquadramento de instituições financeiras". Se todas as empresas quebrarem, também não haveria nenhuma insolvência, e anecessidade de capital para reenquadramento nos requerimentos legais seria de R$ 3,4 bilhões. Nos dois casos, porém, a rentabilidade das instituições financeiras seria muito afetada.