O globo, n. 30.187, 31/ 03/2016. País, p. 7

Presidente do Conselho de Ética acusa Cunha de tentar golpe

Parlamentar investigado desiste de manobra regimental na Casa
 
Por: ISABEL BRAGA e MANOEL VENTURA
 

- BRASÍLIA- Diante da reação dos partidos, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), recuou ontem de sua manobra e mudou o projeto de resolução que abriria brecha para alterar a composição do Conselho de Ética, onde tramita o processo de cassação contra ele. Novo projeto foi apresentado pela Mesa Diretora, retirando qualquer menção à interrupção de mandatos de deputados do conselho. A proposta inicial foi alvo de críticas: o presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo ( PR- BA), acusou Cunha de querer dar um golpe e tentar alterar a composição da comissão em benefício próprio.

O presidente do conselho disse que a manobra levaria à saída dele e de outros deputados que mudaram de legenda. Segundo Araújo, o maior problema é Cunha advogar em causa própria:

— Senhores, fiquei impressionado de como se fazem as coisas nesta Casa, de forma sorrateira, o que não é digno do homem que dirige esta Casa. Foi um golpe, de forma deselegante. Foi mostrada uma coisa aos líderes e levada a plenário de outra forma. Como é chamado nesta Casa, um jabuti passaria despercebido não fosse alguns deputados, que são zelosos. Foi pano de fundo do objetivo de liquidar o Conselho de Ética, porque pegava em cheio o presidente do Conselho, o primeiro vice e o segundo vice.

 

CUNHA NEGA GOLPE

Araújo saiu do PSD e foi para o PR no último mês, assim como Marcos Rogério ( RO), que deixou o PDT e se filiou ao DEM. Rogério é relator do processo por quebra de decoro parlamentar contra Cunha. Os críticos ao texto afirmam que o projeto abria margem para trocar deputados que mudaram de legenda e também para o recálculo das vagas no órgão, beneficiando Cunha, pois aumentaria uma vaga no bloco do PMDB e tiraria uma vaga do bloco do PT. Cunha está perdendo no Conselho por 11 votos a 10.

Cunha admitiu que modificou o projeto ontem em razão dos questionamentos, mas insistiu que a versão anterior não afetaria o Conselho de Ética.

— Pedi para retirar toda parte que fala de interrupção de mandatos, e fica bem claro. A resolução nunca mexeu com o Conselho de Ética e com nada pretérito. Nunca se mexeu com conselho, foi por má- fé que se divulgou isso — disse Cunha, que ironizou a acusação de Araújo de golpe: — O presidente do Conselho de Ética todo dia quer abrir a geladeira para acender a luz!

O projeto tem por objetivo fazer valer, na distribuição de vagas nas comissões da Casa, as bancadas dos partidos fixadas após o troca- troca dentro da janela aberta no dia 18 de fevereiro. Pelo menos 91 deputados trocaram de legenda. Entre os partidos que aumentaram suas bancadas estão PP, PR e DEM. O projeto inicial estendia o novo cálculo a todos os órgãos da Casa e explicitava que isso teria de ser obedecido também por deputados com mandatos, como é o caso do Conselho.

A nova versão diz que o recálculo produzirá efeitos sobre os órgãos da Câmara a serem compostos a partir da publicação da resolução.

Na sessão de ontem, Rogério apresentou seu plano de trabalho e relacionou as testemunhas de acusação dos autores do processo. Entre elas foram listados o doleiro Alberto Youssef e os lobistas Fernando Baiano e Júlio Camargo. E também o depoimento pessoal de Cunha. Rogério quer ouvir também um procurador do Banco Central indicado pela Receita Federal, além de Ricardo Pernambuco e Ricardo Pernambuco Júnior.

— Iniciamos a fase mais importante: o encontro com os fatos, com as provas. Iniciamos a investigação. O esclarecimento interessa à sociedade e ao Parlamento — disse Marcos Rogério.

 

CRÍTICA DE ALIADOS DO PEEMEDEBISTA

Cunha disse que poderá arcar com as despesas para trazer os advogados suíços que apresentou como testemunhas de defesa no processo contra ele:

— Minha defesa não terá problema de arcar para evitar qualquer tipo de desculpa, óbvio que eu pagaria.

Aliados de Cunha criticaram a convocação de testemunhas e a solicitação de documentação que, dizem, não têm a ver com as denúncias. Cunha é acusado de ter mentido à CPI da Petrobras, quando negou ter contas no exterior. Quando a continuidade do processo foi aprovada no colegiado, foi tirada do relatório a suspeita de Cunha ter recebido propina do esquema na Petrobras. (* Estagiário, sob supervisão de Paulo Celso Pereira)

    Órgãos relacionados:

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    Opinião

     
    SEM LIMITE
     

    SEMPRE HÁBIL em usar regimentos em proveito próprio, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), na presidência da Câmara, continua a usar todo o poder do cargo para barrar o processo de sua cassação que tenta tramitar no Conselho de Ética da Casa.

     

    AGORA, DEPOIS de mais um troca-troca entre partidos, quer transpor aliados para este conselho. Investigado na Lava- Jato, réu no Supremo, onde está também um pedido do Ministério Público para seu afastamento do cargo, Cunha demonstra não ter mesmo limites.

    Órgãos relacionados:

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    PF identifica autores de ameaças a Teori

    Inquérito foi aberto para apurar se houve injúria ao ministro do Supremo

     

    -PORTO ALEGRE- A Polícia Federal identificou suspeitos de usar a internet para ameaçar e cometer injúria contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki. Alguns dos crimes foram cometidos no Rio Grande do Sul, onde o magistrado reside e onde ele representou pela investigação. A corporação não informou detalhes da investigação.

    Segundo a PF, o inquérito para investigar se Teori foi vítima de ameaça e injúria foi instaurado na última quinta-feira (24). Por meio de nota, a corporação informou que comentários ofensivos e intimidadores foram publicados em redes sociais e também enviados por e-mail.

    As ameaças tiveram início após o ministro determinar, na terça-feira (22), que o juiz federal Sérgio Moro envie para o STF as investigações da Operação Lava Jato que envolvem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

    Em Porto Alegre, um grupo de manifestantes deixou uma faixa em frente ao prédio onde vive o ministro em Porto Alegre. "Deixa o Moro trabalhar", dizia a faixa criticando a decisão de Zavascki e, ao mesmo tempo, apoiando o trabalho do juiz Sérgio Moro, da Justiça Federal do Paraná, onde são conduzidas as investigações da Operação Lava Jato. A mensagem foi retirada do local durante a manhã de ontem. (Do site G1).

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    Matarazzo racha PSDB ao se filiar ao PSD

    Serra deve atuar contra candidato tucano em SP, que é apoiado por Alckmin
     
    Por: SILVIA AMORIM
     
    - SÃO PAULO- Doze dias depois de sair do PSDB, Andrea Matarazzo assinou ontem sua ficha de filiação ao PSD em São Paulo. No último dia 18, Matarazzo abandonou a prévia do partido que escolheu o empresário João Doria para disputar a eleição municipal. Doria é apoiado pelo governador Geraldo Alckmin. Matarazzo tinha a seu lado lideranças tucanas como o senador José Serra e o ex- presidente Fernando Henrique. O embate entre Alckmin e Serra promete ser um pano de fundo da eleição paulista.

    Durante a filiação, Matarazzo disse esperar que o ministro das Cidades, Gilberto Kassab, presidente do partido, deixe o governo da presidente Dilma Rousseff. O PSD é um dos que ameaçam se afastar da petista diante da possibilidade de impeachment. Mas, por enquanto, Kassab descarta um desembarque, embora o partido tenha liberado a bancada para votar como quiser.

    O ex- tucano disse ontem ter esperança de que os aliados dele no PSDB colaborem com a sua campanha:

    — Acho que todos são livres para fazer o que quiserem. Tudo o que aprendi em política foi com eles.

    A filiação de Matarazzo põe mais lenha nas suspeitas de que o PSD pode ser o próximo aliado a abandonar o governo. Integrante do PSDB por 25 anos, ele não deixou dúvida ontem de que recebeu carta branca de Kassab para continuar sendo oposição ao PT — e assim o fará na eleição municipal deste ano em São Paulo. Matarazzo é o pré- candidato da sigla a prefeito.

    — Eu sou muito direto. Todos me conhecem bem. Eu estive em todas as manifestações que pude. Minha posição continua exatamente a mesma. Acho que não há governo, e o impeachment é uma realidade. Eu tenho a expectativa de que o Gilberto Kassab acabe saindo do ministério — disse Matarazzo.

    A entrada do ex- tucano e vereador ao PSD foi acertada pessoalmente por Kassab, amigo de Matarazzo desde quando era prefeito da cidade. Para evitar que cresçam as especulações sobre o futuro do PSD no governo, o ministro não participou do ato de filiação e ficou em Brasília ao lado de Dilma num evento público.

    Entretanto, nos bastidores, o PSD tem dado passos concretos de afastamento do PT e do governo. Com o aval de Kassab, a bancada foi liberada na votação do impeachment. Na prática, isso permite que mais da metade dos deputados vote a favor da saída de Dilma.

    A filiação de Matarazzo é outro movimento nesse sentido. Até algumas semanas atrás, o PSD programava uma candidatura neutra para a eleição em São Paulo. Com a entrada do ex- tucano, o partido passa a ter uma candidatura clara de oposição ao PT na maior cidade do país.

    Sobre rumores de que ele possa ser vice da pré- candidata do PMDB à prefeitura de SP Marta Suplicy, Matarazzo zombou:

    — É mais fácil uma vaca voar.

    Senadores relacionados:

    • José Serra
    • Marta Suplicy

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    Esquema investigado na Zelotes teve pagamento a parlamentares

    MPF diz à Justiça que e- mail de lobista indicou envolvimento de políticos
     

    - BRASÍLIA- O esquema criminoso que influenciou a tramitação de medidas provisórias a favor de indústrias do setor automobilístico, denunciado na Operação Zelotes, incluiu pagamentos a parlamentares em legislatura passada, afirma o Ministério Público Federal. A informação consta das alegações finais do MPF, entregues na segunda- feira à Justiça Federal, em Brasília.

    Os procuradores Frederico Paiva e Hebert Mesquita afirmam que um e- mail de José Ricardo da Silva, lobista e ex- conselheiro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais ( Carf ), é “prova que dissipa qualquer dúvida em relação à ilicitude da atuação dos membros da organização criminosa”. A mensagem trata de suposto pagamento a parlamentares.

    No e- mail, de 29 de dezembro de 2009, o ex- conselheiro do Carf afirma não ter conseguido falar com parlamentares e que fará “toda a prestação de contas com os devidos acertos”. Os procuradores não se aprofundaram ao falar do envolvimento de parlamentares: “A organização criminosa estabeleceu débitos com parlamentares federais, conforme está na mensagem eletrônica. Embora os parlamentares não tenham sido identificados, fato é que ficaram credores de José Ricardo e seu grupo, por motivos nada republicanos”.

    A argumentação dos procuradores diz respeito ao processo da Zelotes que já resultou em denúncia à Justiça. Em novembro passado, o MPF denunciou 16 pessoas por envolvimento em negociação para aprovação de três medidas provisórias, em 2009, 2010 e 2013. Outros inquéritos estão em curso, inclusive com investigação sobre o ex- presidente Lula. Nas alegações finais, os procuradores relatam a proximidade de um dos denunciados, o lobista Mauro Marcondes, com Lula. Eles falam em “acesso privilegiado de Mauro Marcondes à Presidência da República”. O lobista é amigo de Lula, segundo o MPF.

    O secretário- executivo do Ministério da Fazenda, Dyogo Henrique de Oliveira, é mencionado nas alegações finais. Dyogo confirmou encontros com Marcondes, mas negou ter tratado de algo ilícito com o lobista. Para o MPF, chamou a atenção no depoimento de Dyogo o fato de ele não saber quantas vezes se encontrou com Marcondes, “nem explicar por que não existe registro ou ata destas reuniões”.

    Já a ex- ministra da Casa Civil Erenice Guerra ajudou José Ricardo da Silva a ser conselheiro do Carf quando era secretáriaexecutiva da pasta, diz o MPF.