Valor econômico, v. 16, n. 3953, 01/03/2016. Brasil, p. A3

Investigadas na Lava-Jato recebem 58% menos da União

Por: Fábio Pupo

Por Fábio Pupo | De Brasília

 

As empreiteiras dos grupos investigados pela Operação Lava-Jato registraram uma retração significativa nos recursos recebidos do Tesouro Nacional por obras executadas no ano passado. Ao todo, os pagamentossomaram R$ 1,41 bilhão em 2015, o que representa um valor 58,6% menor do que o recebido um ano antes.

A queda nos pagamentos é mais forte do que a registrada pelo setor de construção como um todo, que computou R$ 12,7 bilhões em recursos recebidos do Tesouro no ano - ou 30,6% menos que um ano antes. Olevantamento foi feito pelo Valor a partir dos dados recentemente atualizados no Portal da Transparência do governo federal.

O movimento tem a ver com a restrição orçamentária do governo, que fez cortes no ano passado para amenizar o rombo nas contas públicas. Com isso, despesas discricionárias - que podem sofrer redução sem aval do Congresso - foram as mais atingidas. Entre elas, está o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) - cujos repasses, de acordo com o Tesouro, caíram 25% em 2015, para R$ 49,6 bilhões (valores atualizados).

A queda fez a Construtora Norberto Odebrecht, por exemplo, sair da segunda posição no ranking de maiores recebedoras e figurar agora na 23ª posição (desconsiderando instituições financeiras). Os pagamentos da União à empresa caíram 76%, para R$ 269 milhões em 2016.

Na Odebrecht, o único contrato com a União no ano foi o do Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub). De acordo com o Ministério da Defesa, havia um montante aprovado de R$ 1,77 bilhão no ano para a ação - que acabou sendo contingenciada "em função da situação financeira vigente".

No caso do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), grande contratante das empreiteiras, o diretor-geral Valter Casimiro Silveira afirma ao Valor que o limite orçamentário de R$ 6,4 bilhões da autarquia em 2015 - um corte de aproximadamente 40% em relação ao ano anterior - forçou uma renegociação com as empreiteiras para reduzir o ritmo de obras. Por isso, os pagamentos às companhias - que são feitos conforme a execução avança - caíram.

"Fizemos reajuste nos contratos, reduzimos o ritmo de obras e estabelecemos limite máximo de medição [do avanço de obras] mensal para que não tivéssemos aumento na nossa carteira de dívida. Isso foi acertado [com as construtoras] para não haver problemas nem para ao Dnit e nem para as empresas", afirma. Segundo ele, algumas obras que ficariam prontas em 2016 tiveram conclusão postergada. No caso específico das empresas da Lava-Jato, a queda mais acentuada dos pagamentos não tem motivo claro para ele. "É possível ser uma coincidência. A Lava-Jato não afetou em nada no setor de transporte, e os contratos continuam em execução. Nós é que exigimos uma redução do ritmo, não foram as empresas. E não só daquelas da Lava-Jato, mas de todas".

Mesmo assim, ele arrisca algumas hipóteses para a retração maior dentre as investigadas. Foi percebido, por exemplo, que algumas delas deixaram de participar de licitações - como no caso do derrocamento do Pedral doLourenço - obra que visa impulsionar a logística hidroviária no Norte. No mercado, é sabido que, em dificuldade para obter crédito no mercado, as investigadas dão prioridade à liquidez - o que dificultaria a entrada em novasobras.

Além disso, o Dnit parou de dar início a construções de rodovias - liberando obras somente de manutenção, cujos contratos são dominados por empreiteiras menores. De acordo com o Portal da Transparência, figuramentre as maiores recebedoras por serviços de manutenção do Dnit em 2015 nomes como Construtora Centro Minas, Castellar e TOP Engenharia.

Gil Castelo Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, afirma que as construtoras da Lava-Jato foram mais afetadas na queda de pagamentos porque tendiam a vencer os contratos de maior valor - que agorasofrem cortes. "Se elas participam das grandes obras, e se nas grandes obras a decisão é de alongar o cronograma, elas acabam sofrendo mais", afirma.

Ele reforça a ideia do Dnit ao afirmar que as investigações não afetaram o desempenho das obras pelo país. Para ele, a redução do ritmo é explicada pelas dificuldades nas contas públicas. "O país está em recessão. Quem abandonou os canteiros foi o governo", resume.

A Valec, outra tradicional contratante de construtoras, também registrou queda de pagamentos. Foram R$ 2,26 bilhões pagos às empresas em 2015, uma retração de 26% contra 2014. "A queda no ritmo das obras e,consequentemente, na realização de pagamentos às empresas que executam a Ferrovia de Integração Oeste Leste (Fiol) e a Extensão Sul da Ferrovia Norte-Sul devem-se às restrições orçamentárias atuais", afirmou a Valec, em nota. Procuradas, as empreiteiras citadas preferiram não se manifestar. MPE, Jaraguá e Schahin não foram encontradas.