Correio braziliense, n. 19298, 27/03/2016. Política, p. 4

MPF mira Erenice de novo

CRISE NA REPÚBLICA » Procuradoria da República no Distrito Federal retoma apuração que causou queda de petista em 2010
Por: EDUARDO MILITÃO

EDUARDO MILITÃO

 

A ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra voltou a responder a um inquérito por corrupção e tráfico de influência sobre o período em que trabalhou na Presidência da República. O caso resultou em sua queda no cargo em 2010, mas a maioria das apurações foi arquivada em 2012 pela Procuradoria da República no Distrito Federal.

Agora, parte da investigação volta a ser feita pela Procuradoria da República no Distrito Federal (PRDF) após os Correios demitirem dois funcionários e a ex-ministra passar a ser alvo da Operação Zelotes. A apuração se refere unicamente a contratos de cerca de R$ 60 milhões, fechado entre os Correios e o serviço de rede postal aérea noturna prestado pela empresa Master Top Linhas Aéreas S/A (MTA). A suspeita é de que Erenice, por meio da empresa de consultoria de seu filho Israel, a Capital Assesoria, cobrava um pedágio de empresários interessados em vender serviços ao governo.

De acordo com o empresário Fábio Baracat, que representou a MTA, a ex-ministra Erenice Guerra lhe disse certa vez que “todos os compromissos assumidos” entre eles deveriam “ser cumpridos”. Seis dias depois de a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) conceder permissão de voo à empresa, ele pagou R$ 120 mil à Capital Assessoria, de acordo com reportagem de O Estado de S.Paulo.

O Correio não localizou representantes da MTA. A assessoria de Erenice não quis comentar a reabertura do inquérito. No entanto, destacou que a ex-chefe da Casa Civil “tem atendido todas as solicitações de informações” dos investigadores da Zelotes. “Continuará à disposição dessas mesmas autoridades para prestar todos os esclarecimentos necessários. As informações, inclusive depoimentos por ela prestados, já são de amplo conhecimento da imprensa.”

 

Sindicância

Uma sindicância dos Correios identificou que dois funcionários participaram de favorecimento para que a empresa vencesse licitações e obtivesse contratos para entrega de correspondências por via aérea. Os empregados foram demitidos no ano passado e a informação chegou ao Ministério Público Federal. Atualmente, os Correios mantém quatro contratos com três empresas que prestam serviço de rede postal noturna, negócios que somam R$ 477 milhões.

Outro motivo para a reabertura da apuração sobre tráfico de influência foi a relação de Erenice com réus da Zelotes. A operação investiga tanto a compra de Medidas Provisórias que estendem benefícios fiscais a montadoras quanto decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Em setembro, a Procuradoria pediu à 10a Vara Federal de Brasília que reabrisse o inquérito. A Justiça autorizou e o caso é conduzido pelo 7o Ofício da Divisão de Combate da PRDF.

Ao mesmo tempo, os investigadores da Zelotes conseguiram que a Justiça compartilhasse com eles o conteúdo de computadores usados por Erenice e familiares em 2010. O objetivo era obter trocas de mensagens de correio eletrônico que interessassem à nova apuração. Um laudo da PF daquele ano já mostrava que a então servidora da Casa Civil e seu irmão Antônio Carvalho “negociaram juntamente a José Ricardo Silva (ex-conselheiro do Carf) a nomeação de pessoas para ocuparem posições” no colegiado. Anos depois, José Ricardo, que era julgador no órgão, se uniu a Erenice na defesa da empresa de telecomunicação Huawei em um processo no próprio conselho.

 

Zelotes

De acordo com investigadores da Zelotes, a relação de Erenice com o ex-conselheiro, réu preso na Papuda, vem do irmão da ex-ministra, que estudou com ele na faculdade, e do relacionamento com Alexandre Paes Santos, mais conhecido como APS, outro lobista detido pela Polícia Federal. Segundo essas fontes, uma mensagem de correio eletrônico comprova que foi a própria ex-chefe da Casa Civil quem indicou José Ricardo para uma vaga no Carf.

Em 2012, a Procuradoria mantinha abertas dois tipos de investigações contra Erenice: um lote de várias acusações criminais por tráfico de influência e uma apuração sobre improbidade administrativa pelos mesmos fatos. Naquele ano, a Procuradoria da República no Distrito Federal arquivou todas as apurações criminais. Agora, reabre uma delas, referente apenas à MTA. A apuração sobre improbidade administrativa patina. Segundo apurou a reportagem, a tendência é o arquivamento do caso.