O globo, n. 30.167, 11/03/2016. País, p. 4

MP afirma que OAS e Bancoop se associaram em quadrilha

Autores de denúncia investigarão petistas ‘ agraciados com unidades’

Por: TIAGO DANTAS / SILVIA AMORIM

 

SÃO PAULO - Depois de denunciar o ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Ministério Público de São Paulo pretende investigar outros petistas que tenham apartamentos em empreendimentos da Bancoop — a Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo. Sem revelar nomes, o promotor José Carlos Blat disse que quer saber se outras pessoas ligadas à entidade e ao PT foram “agraciadas com unidades". Na denúncia apresentada anteontem, a promotoria acusa integrantes da Bancoop e da empreiteira OAS de terem se “associado em quadrilha”.

— Essa investigação não acabou. Temos outras frentes no Solaris ( prédio onde fica o tríplex atribuído a Lula no Guarujá) e em outros condomínios em São Paulo que pertencem a pessoas atreladas ao PT e que, em tese, podem ter sido agraciadas — disse o promotor.

Entre os petistas com apartamentos da Bancoop na capital paulista estão o presidente da CUT, Vagner Freitas, o ex- ministro da Previdência, Carlos Gabas, e Freud Godoy, o ex- assessor de Lula.

A Bancoop começou a ser investigada em São Paulo em 2007. A denúncia apresentada anteontem contra Lula e mais 15 pessoas é um desdobramento de uma primeira ação que está para ser julgada nas próximas semanas.

Segundo Blat, todos os interrogatórios foram feitos, e o Ministério Público já fez suas alegações finais. Neste processo, o ex- tesoureiro do PT João Vaccari Neto é acusado de estelionato, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro.

Toda a investigação sobre a cooperativa começou depois que cooperados que não conseguiram seus apartamentos denunciaram a entidade. Segundo a promotoria, cerca de 7 mil famílias foram lesadas pela Bancoop, que é acusada de usar o dinheiro que deveria ser aplicado na construção de apartamentos para financiar eleições do PT.

A Bancoop foi fundada em 1996, tendo o ministro das Relações Institucionais do governo Dilma Rousseff, Ricardo Berzoini, como diretor técnico, e Vaccari como diretor do conselho fiscal. Nos anos 2000, chegou a ter 8 mil associados.

 

ORIGEM DE TODA INVESTIGAÇÃO

Com dificuldades financeiras, em 2009, a cooperativa transferiu nove empreendimentos para a construtora OAS concluir as obras. Um deles foi o edifício do Guarujá.

— Bancoop e OAS estabeleceram estado de terror entre adquirentes, pois essas pessoas até hoje não receberam suas escrituras — afirmou Blat.

Em dezembro de 2014, o GLOBO revelou que o tríplex no Guarujá havia ficado pronto, e que moradores diziam pertencer à família de Lula. O ex- presidente nega a propriedade do apartamento e diz que sua mulher, Marisa Letícia, tinha uma cota da Bancoop no prédio, mas que, em 2015, decidiu não adquirir o imóvel.

O primeiro petista a ser denunciado no caso Bancoop foi o ex- tesoureiro do PT em 2010. Vaccari presidiu a entidade de 2004 a 2010 e é acusado pelo Ministério Público por estelionato, sob a acusação de ter desviado recursos da cooperativa e lesado milhares de cooperados que pagaram prestações de imóveis que nunca chegaram a receber. É esta a ação que deve ter sentença proferida nas próximas semanas.

Além do ex- tesoureiro, foram acusados outros quatro ex- funcionários da Bancoop em 2010. Vaccari também foi denunciado anteontem pelos crimes de estelionato, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica.

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PERFIL - CÁSSIO CONSERINO

Um antigo conhecido do PT

Com trajetória polêmica, promotor investigou Palocci e até já comprou drogas pela internet para desbaratar esquema

Por: MARIANA SANCHES

 

SÃO PAULO - Sorridente, óculos escuros espelhados e camisa da seleção brasileira de futebol. A foto jovial estampa a página em uma rede social do promotor público Cássio Roberto Conserino, que, aos 41 anos, acaba de pedir a prisão preventiva do ex- presidente Lula.

Os óculos espelhados são os mesmos com os quais chegou à coletiva de imprensa de ontem. Não é a primeira vez que Conserino é tido como detrator do PT. Em 2005, denunciou o ex- ministro da Fazenda de Lula, Antonio Palocci, por receber propina de uma empresa de coleta de lixo. A denúncia não foi aceita pela Justiça.

Formado pela Faculdade Católica de Direito de Santos, Conserino ingressou no MPSP e se engajou em investigações sobre políticos e crime organizado. Quando atuou em Santos, investigou policiais e advogados que teriam envolvimento com jogos de azar. Nesse caso, os acusados acabaram liberados, e Conserino foi processado e condenado a indenizar um dos presos por dano moral.

Anos depois, já titular do MP na capital, diversificou suas investigações. Em uma delas, para denunciar a ação de traficantes de drogas que agem na internet, encomendou e recebeu, por Sedex, no Fórum Criminal da Barra Funda, o maior complexo judiciário da América Latina, uma farta encomenda de entorpecentes.

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PERFIL - JOSÉ CARLOS BLAT

Da Favela Naval à Lava- Jato

Investigador atuou em casos de grande repercussão e se tornou referência na apuração do caso Bancoop

Por: CLEIDE CARVALHO

 

CURITIBA - Com pouco dinheiro, o promotor José Carlos Blat levou dez anos para se formar em Direito. Trabalhou como garçom e gerente de banco antes de ingressar, em 1993, no Ministério Público do estado de São Paulo. Em 1998, era promotor em Diadema, então um dos municípios paulistas mais violentos, quando estourou a denúncia da Favela Naval.

Ali, policiais extorquiam, humilhavam e espancavam moradores. O promotor entrou na investigação e pediu a prisão de todos os policiais. O caso mudou a vida de Blat, que passou a ser ameaçado.

Atuou no caso da Máfia dos Fiscais, que cobrava propina de ambulantes, e nas investigações contra o crime organizado no estado, que o colocou na lista dos ameaçados de morte pelos criminosos. Chegou a ser investigado pela relação com bicheiros e contrabandistas, mas os processos contra Blat foram arquivados.

A pedido de cooperados que foram lesados na Bancoop, começou a atuar no caso em 2007 e abriu o processo que agora está prestes a ser julgado. O estudante que se encantou com o papel do promotor durante um júri simulado, ainda na faculdade, costuma dizer que perseverança é a palavra de sua vida.

Quando as investigações da Lava- Jato começaram a se aproximar do Caso Bancoop, Blat voltou a acompanhar o assunto.