O globo, n. 30.167, 11/03/2016. País, p. 6

Movimentos sociais ficam em estado de 'alerta'

Militantes acusam MP de ‘ incitar ódio’, mas orientam grupos a não ir à rua domingo para evitar provocação

Por: Luiza Souto/ Sergio Roxo/ Renato Onofre/ Fernanda Krakovics/ Eduardo Bresciani/Cristiane Jungblut , Isabel Braga / Leticia Fernandes

 

SÃO PAULO, RIO E BRASÍLIA- Representantes de movimentos sociais alinhados ao PT decretaram estado de “alerta” e prometem ir hoje ao prédio do Tribunal de Justiça de São Paulo para pressionar a juíza Maria Priscila Ernandes Veiga a não aceitar o pedido de prisão preventiva do ex- presidente. Centrais sindicais e movimentos sociais acusam o MP de “incitar o ódio” e de provocar a militância às vésperas das manifestações pelo impeachment de Dilma, marcadas para domingo.

— A irresponsabilidade desse promotor de São Paulo é digna de livro de ficção. Ele está incitando o ódio. Se tivermos um problema grave no domingo, vai ser responsabilidade dele — afirmou o presidente da Central Única dos Trabalhadores ( CUT) no Rio, Marcelo Rodrigues.

Para João Paulo Rodrigues, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra ( MST), o pedido de prisão preventiva de Lula é uma “provocação”:

— Esse pedido faz parte de uma orquestração, de uma provocação à militância petista. A orientação de não ir para a rua no domingo se mantém. Não vamos cair em provocação.

Em São Paulo, a Frente Brasil Popular, que reúne mais de 60 movimentos sociais, partidos como PCdoB e PT, e centrais de trabalhadores como a CUT, chegou a convocar a militância para um protesto em caráter de “urgência” na noite de ontem, mas o ato acabou esvaziado por causa da chuva. Cerca de 350 membros da Frente já estavam na sede da Apeoesp, sindicato dos professores do ensino oficial de São Paulo, discutindo manifestações a favor do governo.

— Vamos ficar em alerta nos diretórios e nos movimentos sociais para nos mobilizarmos se houver decisão da Justiça. Vamos garantir a nossa resistência — disse Douglas Izzo, presidente da CUT- SP, para quem há uma intervenção política para desconstruir a imagem de Lula.

Representantes da Frente Popular pediram que os militantes não se envolvam em conflitos. As manifestações de apoio à presidente Dilma, que aconteceriam no próximo domingo em, ao menos, sete capitais, foram adiadas para o dia 20.

Em São Bernardo do Campo, em frente à casa do ex- presidente, apenas o ex- metalúrgico Astério Gomes, de 55 anos, se manifestava contra o pedido de prisão de Lula.

 

LULA NÃO CRÊ EM ACEITAÇÃO DO PEDIDO

O pedido de prisão preventiva feito pelo Ministério Público de São Paulo não teria abalado o ex- presidente Lula, que o considerou frágil, segundo petistas, e não acredita que ele será aceito pela Justiça. A preocupação do ex- presidente, ainda de acordo com integrantes do PT, é que uma iniciativa como essa parta de Curitiba. Em sua passagem por Brasília, anteontem, Lula afirmou, em conversas reservadas, considerar questão de tempo um pedido de prisão contra ele por parte da Operação Lava- Jato.

Segundo petistas que estiveram com o ex- presidente, Lula está preocupado com a possibilidade de Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro, que comandavam a Odebrecht e a OAS, fecharem acordos de delação premiada. Ainda de acordo com integrantes do PT, Lula não teme a homologação da delação premiada do senador Delcídio Amaral ( PT- SP). Para o ex- presidente, seu impacto será político, mas sem consequência jurídica.

Lula participava de uma reunião com o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, e outros petistas, em um hotel de São Paulo, quando foi divulgada a notícia do pedido de sua prisão. Entre os presentes, a avaliação foi que a atitude dos promotores seria uma reação à possibilidade de que o expresidente aceitasse um ministério no governo. Os aliados mais próximos ainda defendem que Lula assuma um posto no Planalto, não apenas para ter os benefícios do foro privilegiado, mas para cuidar da articulação política e impedir o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

— A situação é muito difícil. Eles podem morrer abraçados ( caso Lula vire ministro). Mas ela morre nos braços dele se ele não virar. A Dilma precisa da ajuda do Lula neste momento — disse um petista que frequenta o Instituto Lula.

As lideranças petistas desqualificaram o pedido dos promotores paulistas, classificado de “tresloucado” pelo presidente nacional da legenda, Rui Falcão, que também estava no encontro entre Lula e Barbosa.

— O pedido de prisão preventiva vai na linha do que já vinha sendo feito por esse promotor e seus dois parceiros, que, sem provas, denunciaram o presidente Lula. Estou confiando que a juíza da 4 ª Vara não vai atender a esse pedido tresloucado, sem qualquer fundamento e qualquer base. O presidente está muito tranquilo e nós também — disse Falcão.

O ministro da Fazenda também atacou o pedido do promotor.

— Acho esse pedido sem fundamento. Esse cenário de polarização política atrapalha, mas nós temos que continuar com esse processo de diálogo e construção — afirmou Nelson Barbosa.

Em Brasília, segundo interlocutores do Planalto, há um certo clima de alívio, tamanha a fragilidade das acusações contra Lula.

— É uma denúncia absolutamente inconsistente, e o pedido de prisão beira o ridículo — contou um assessor governista.

O líder do PT no Senado, Paulo Rocha ( PA), afirmou que o promotor Cássio Conserino, autor do pedido, quer “tocar fogo no país”. Rocha disse que o pedido é uma provocação ao PT.

— Não vamos cair numa provocação barata de um procurador que quer tocar fogo no país — disse Rocha.

 

VIANA COBRA MANIFESTAÇÃO DO MPF

Já o vice- líder do governo na Câmara, Paulo Pimenta ( PT- RS), alertou para um “grave risco de quebra institucional”. Ele afirmou que Conserino “envergonha o Ministério Público”.

O senador Lindbergh Farias ( PT- RJ) também fez ataques ao procurador:

— Esse promotor é um irresponsável. Ele já tinha feito aquela palhaçada de antes de escutar o presidente anunciar na revista Veja que ia denunciar. Ele tá querendo aparecer.

Em discurso no Senado, o vice- presidente da Casa, Jorge Viana ( PT- AC), acusou os promotores de fazerem uma “caçada a Lula e à sua família”. Viana cobrou manifestação do Ministério Público Federal sobre as ações de promotores estaduais.( Luiza Souto, Sergio Roxo, Renato Onofre, Fernanda Krakovics, Eduardo Bresciani, Cristiane Jungblut , Isabel Braga e Leticia Fernandes)

 

“Esse promotor está incitando o ódio. Se tivermos um problema grave no domingo, vai ser responsabilidade dele”
Marcelo Rodrigues
Presidente da CUT no Rio

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Defesa considera denúncia frágil e critica 'espetáculo'

Por: Tiago Dantas

 

- SÃO PAULO- O advogado do ex- presidente Lula, Cristiano Zanin Martins, afirmou ao GLOBO no fim da tarde de ontem que a coletiva concedida pelos promotores que denunciaram e pediram a prisão preventiva do petista apenas “confirmou a absoluta fragilidade dos argumentos apresentados pelo Ministério Público de São Paulo”. Ele qualificou como “espetáculo” a entrevista dada no meio da tarde de ontem pelos integrantes do Ministério Público ( MP).

— Mostra que eles não têm nenhum fato. Eles têm uma hipótese e fizeram a denúncia com base nisso. Tentam atribuir propriedade com base em pessoas que foram ouvidas e acham que o apartamento é dele. Os promotores substituíram o título de propriedade do cartório por afirmações de pessoas — afirmou Martins, que completou: — Se a denúncia tem essa fragilidade, que dirá o pedido de prisão. Se existir, só vai ser prova cabal que esse trabalho foi feito de forma parcial. Quando tivermos acesso a tudo isso, vou poder comentar concretamente. — disse o advogado, que ainda não teve acesso à íntegra da denúncia em que há o pedido de prisão do petista e que acompanhou a coletiva do MP pela televisão.

A defesa questionou o momento em que os promotores decidiram denunciar o expresidente, às vésperas do protesto antigoverno, que acontecerá no próximo domingo (” é um calendário no mínimo suspeito”) e reafirmou que Lula não possuía o tríplex e somente declarara ter uma reserva de apartamento no edifício Solaris, no Guarujá.

— Como Marisa não tomou nenhuma providência, o apartamento foi vendido. ( O apartamento 141, que motivou a denúncia por falsidade ideológica). Quem vendeu foi a própria empresa ( OAS). Podem ouvir 500 pessoas, isso não torna a pessoa dona do imóvel. A família nunca usou o local, o presidente esteve lá uma vez e dona marisa, duas vezes. Isso jamais poderia dar margem às conclusões a que eles chegaram.

Em nota, o Instituto Lula afirmou ontem que “o promotor paulista ( Cássio Conserino) que antecipou sua decisão de denunciar Luiz Inácio Lula da Silva antes mesmo de ouvir o ex- presidente dá mais uma prova de sua parcialidade ao pedir a prisão preventiva de Lula ” e que a medida adotada pelo promotor é “mais uma triste tentativa” de usar o cargo para “fins políticos”.

Também em nota divulgada ontem à noite, os advogados Roberto Teixeira e Cristiano Zanin Martins afirmou que “o pedido de prisão preventiva é a prova cabal de que a violação ao princípio do promotor natural — reconhecida no caso pelo Conselho Nacional do Ministério Público — produz resultados nefastos para os envolvidos e para toda sociedade”. A defesa de Lula tentou destituir os promotores Cássio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique Araújo do caso questionando a legitimidade dos três para tocar a investigação. Há duas semanas, os advogados do ex- presidente ingressaram com uma petição no Supremo Tribunal Federal para que os magistrados decidam sobre quem poderá investigar o petista. No documento, a defesa afirma existir um conflito de atribuições entre o MP paulista e a força- tarefa da Lava- Jato, que também apura a propriedade do tríplex do Guarujá e do sítio em Atibaia frequentado pelo ex- presidente Lula. Há uma semana, o petista foi levado em condução coercitiva para depor sobre os imóveis no âmbito da Lava- Jato.

 

Defesa questiona o momento em que os promotores decidiram apresentar a denúncia

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Moro pede calma em protestos

Juiz responsável pela Lava- Jato defende que manifestantes atuem com serenidade e condena o radicalismo

Por: Cleide Carvalho

 

Ojuiz Sérgio Moro pediu, ontem, calma e serenidade a todos os participantes de manifestações, a favor e contra o governo. Em evento na Federação das Indústrias do Paraná ( Fiep), o magistrado responsável pela Operação Lava- Jato condenou a violência e o radicalismo nos atos.

— Numa democracia não existe nós e eles. Existe nós. A democracia somos nós, ainda que tenhamos opiniões divergentes — pontuou Moro, afirmando que se sente na obrigação de se manifestar contra a violência por ser “uma voz ouvida neste momento”.

Moro afirmou ainda que Brasil precisa fortalecer suas instituições e criticou os parlamentares por não terem aprovado, nos últimos dois anos, leis anticorrupção. Ele disse esperar que o “Congresso corte na própria carne", em referência a deputados e senadores acusados de corrupção na Operação Lava- Jato.

— Esse quadro me espanta, e qual foram as iniciativas legislativas nos últimos dois anos? Estamos vendo iniciativas para tolher ( as investigações). Esperamos que o Congresso tire esses parlamentares ( acusados de corrupção) e não vemos isso acontecer — disse Moro.

O juiz afirmou que tem o papel de decidir com base nas provas e que há movimentações “que querem prevenir este resultado".

— Temos ataques às investigações todos os dias. Vejo todos os dias que sou ligado a um partido politico, que minha esposa trabalha para um partido político. Nunca ninguém foi ligado a partido algum. Fico surpreso e, evidentemente, as pessoas que dizem isso têm seus interesses — afirmou.

Um vídeo que circula nas redes sociais usa a imagem de Moro para convocar as pessoas a participarem dos atos pró- impeachment, que acontecerão domingo. No vídeo, com pouco mais de um minuto de duração, o narrador elogia o juiz e pergunta: “Quantas vezes você viu corruptos terem tanto medo de alguém? Este homem e seu grupo estão mudando o Brasil. E agora, quando ele mais precisa de você vai deixá- lo sozinho ou vai para a rua?” ( Enviada especial)

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  • Congresso Nacional